09 julho, 2007

 

Presidência da UE


Terceiro mandato


http://www.eu2007.pt/UE/vPT/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_Europeia
http://europa.eu/index_pt.htm

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Prioridade para agenda interna

SUSETE FRANCISCO

Presidência portuguesa da União arranca hoje
A presidência portuguesa da União Europeia arranca hoje, para um semestre que não deixará de ficar profundamente ligado ao tratado de reforma da UE. Será a face mais visível e mediática do mandato nacional à frente dos 27 - e um ponto incontornável no balanço dos próximos seis meses. A prioridade absoluta para José Sócrates? Não. Essa, garante o gabinete do primeiro-ministro, continuará no plano interno.

E pela mão do líder do Executivo. Apesar da carregada agenda impos- ta pela condução das questões comunitárias, não está prevista qual- quer delegação de competências particular ao nível do Governo - "fica tudo na mesma". "A presidência é um elemento importante de afirmação, mas a frente interna é prioridade absoluta", sustenta a mesma fonte.

Uma preocupação que acompanhou a própria preparação do mandato português à frente da UE. Um cuidado a que não será alheia a última presidência, então com António Guterres à frente do Executivo - que acabou por penalizar internamente o Governo, com a então primeiro-ministro a ser acusado de descurar a situação interna do País. Um cenário bem conhecido do actual elenco governativo: cinco dos actuais ministros integravam a equipa de Guterres, número a que se junta o próprio Sócrates.

No que à agenda europeia diz respeito, e além do tratado europeu, a presidência portuguesa tem um dos momentos altos já a 4 de Julho, com a cimeira UE/Brasil, que colocará as relações entre a União e o gigante sul-americano ao nível da relação privilegiada que os 27 já mantém com a China, os EUA, a Índia e a Rússia. O trio de prioridades em termos de agenda externa europeia fecha-se em Dezembro, com a mais melindrosa cimeira entre a União Europeia e África. Pelo meio, a aposta passa também pelo reforço do diálogo euro-mediterrãnico - entenda-se uma tentativa para um maior empenho da Europa no processo de paz no Médio Oriente.

Questões que começam amanhã a ser abordadas, com José Sócrates a reunir-se com o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, enquanto os ministros portugueses (que passam a presidir aos conselhos sectoriais da UE) definem com os comissários europeus das respectivas áreas as iniciativas legislativas para os próximos seis meses. Será o primeiro dia de trabalho efectivo da presidência portuguesa, que hoje assinala simbolicamente a data.

DN, 1-7-2007
 
Angela Merkel superou presidência de alto risco...

PATRÍCIA VIEGAS, Berlim

Problemas internos fazem esquecer atenção à Rússia e ao Médio Oriente

A presidência alemã da União Europeia, considerada de alto risco, termina o seu semestre com a sensação de dever cumprido quanto ao impasse constitucional. E também com a noção de que os problemas internos absorveram grande parte da agenda e relegaram para segundo plano as relações externas da UE. Mas, qualquer que seja o ângulo escolhido, há sempre um aspecto, reconhecido por várias fontes, que salta à vista: a liderança de Angela Merkel.

"Muito do sucesso depende do estilo negocial e a chanceler alemã define objectivos e vai directa a eles sem grande propaganda", diz Daniela Kietz, investigadora do Instituto Alemão para Assuntos Internacionais e de Segurança e uma das participantes de um seminário para jornalistas que, nos últimos dias, decorreu em Berlim.

"Merkel tinha várias razões para assumir a liderança da negociação sobre a Constituição", afirma Hubert Wetzel, jornalista do Financial Times alemão, lembrando que nos grandes países europeus a chanceler era a única que gozava de uma situação estável. França e Reino Unido tinham governantes que estavam de saída, sendo necessário esperar pelas presidenciais francesas de Maio para avançar.

Foi o que Merkel fez, mas não sem uma estratégia, pois incluiu na Declaração de Berlim, que a 25 de Março comemorou o 50.° aniversário dos tratados de Roma, uma data-chave: 2009. Este seria o ano em que a UE teria de ter um novo tratado pronto a entrar em vigor. Assim que houve novo Presidente em França, as coisas ganharam nova velocidade. Até à cimeira dos dias 21 e 22 de Junho, onde, mais do que a intransigência da Polónia, a presidência alemã deparou-se com as exigências do Reino Unido, França, Bélgica e Holanda. Após a maratona negocial, os polacos, sob o peso da ameaça que conheciam há meses [de a UE abrir uma Conferência Intergovernamental sem o seu aval], obtiveram cedências dos restantes Estados membros sobre o sistema de votação da UE. Portugal respirou de alívio e trouxe para casa um mandato claro para redigir novo trata-do, tão claro, diz Daniela Kietz, que o mandato é ele próprio o tratado.

Noutras áreas, como justiça e assuntos internos ou ambiente, também houve progressos. Aprovou-se uma política de energia e ambiente, em Março, no Conselho Europeu. "Estendeu-se o mandato da Europol, para cobrir mais crimes, acesso às suas bases de dados, que passaram a estar disponíveis a todas as forças de segurança", explica Thomas Binder, número dois da task force do Ministério do Interior alemão durante a presidência. Binder refere alguns dos dossiês que Portugal vai herdar: sancões às empresas que empreguem ilegais e a partilha de imigrantes entre os 27.

A presidência de Merkel não conseguiu, no entanto, iniciar as negociacões de nova parceria estratégica com a Rússia devido ao veto polaco. Também a estratégia para a Ásia central ficou perdida no debate constitucional. E o impulso ao processo de paz do Médio Oriente, não surgiu. O Quarteto para a Paz (ONU, EUA, Rússia e UE) passou a ter um novo enviado, Tony Blair. As relacões externas da UE foram, assim, o parente mais pobre da presidência alemã. O DN viajou a convite da Embaixada da Alemanha

DN, 1-7-2007
 
AGENDA DE LISBOA

Adriano Moreira
professor universitário

A discussão imediatamente suscitada pelo anúncio do mandato confiado à presidência portuguesa, no que respeita ao eventual tratado sobre a governança europeia, discussão centrada sobre a opção entre a aprovação parlamentar e o referendo, revela mais uma vez que a política furtiva exige um ponto final.

Esta referida metodologia política tem-se traduzido na fraca participação dos parlamentos nacionais e dos eleitorados na evolução do processo europeu, de modo que as populações, frequentemente, conhecem apenas os seus efeitos, sem informação sobre os motivos, os objectivos e a responsabilidade pela decisão.

Por isso tem fundamento admitir que as recusas da chamada Constituição, em relação à qual os assumidos constituintes declararam expressamente no texto merecer o agradecimento dos povos europeus, foram baseadas mais nos efeitos internos das políticas europeias, sentidos como negativos, do que no conhecimento do articulado.

A exigência prévia da participação directa do eleitorado parece neste caso também baseada na distância e falta de confiança no sistema que a experiência inspirou, criando-se um vasto sentimento de que o poder reside essencialmente numa eurocracia, já por alguém definida como uma burocracia superlativa, a condicionar os diferentes órgãos do sistema.

O primeiro e importante êxito que a presidência portuguesa poderá desejar será o de que a Declaração de Lisboa seja recordada como um ponto final da política furtiva, desencadeando uma diplomacia pública informativa e mobilizadora, que torne evidente que a discussão sobre o método da aprovação não deve anteceder o conhecimento do teor final da proposta: se atribuída aos parlamentos será porque a confiança é consistente entre os eleitorados e a representação; se for escolhido o referendo será porque a população está informada, empenhada e responsabilizada.

Para este resultado, essencial para que o processo europeu se desenvolva consistente, porque apoiado na única pedra fundamental que é a adesão dos povos europeus, o Tratado Simplificado não poderá aparecer com a simplificação limitada ao apagamento das referências que anunciaram um Estado federal, à mudança da designação dos titulares de funções que conservem. É, pelo contrário, de esperar que muito transparentemente seja posta a questão do poder, e do sentido da distribuição do poder, entre Estados que, pelo método proposto, aparecem inevitavelmente agrupados em grandes, médios e pequenos: para não repetir o pecado original da ONU, o sentido da distribuição do poder não poderá ter em vista uma reserva de privilégios repartidos, mas sim um dever de exercício a favor do interesse comum, ponderadas as capacidades e responsabilidades que cada Estado membro terá de assumir na implementação das decisões.

Esta pedagogia, com expressão nos textos, espera-se que faça melhor caminho do que na ONU.

Por outro lado, as circunstâncias da globalização tornaram evidente que a Europa é um espaço dependente de energias, de matérias- -primas, de mão-de-obra, uma carência de recursos, e na data até de mercados, que os governos da Conferência de Berlim de 1885 proclamaram como justificando a saga colonial.

Não há conflito posterior à queda do Muro de Berlim em 1989 que não evidencie que a Europa é estrategicamente uma potência virtual, no caso mais grave respondendo ao infeliz unilateralismo republicano dos EUA com por vezes arrogância mal amparada.

Um objectivo de excepcional ambição política da Presidência portuguesa será avançar, com passos promissores porque seguros, para a definição consistente das fronteiras amigas da Europa, pressuposto da cooperação pacífica em todos os domínios do desenvolvimento sustentado da sociedade internacional de confiança.

Por isso são de apoiar as arriscadas iniciativas das cimeiras: a começar pela África, desenvolvendo neste caso um tecido de vida internacional habitual, reconciliando os capitais de queixas, substituindo as passadas hegemonias pela solidariedade contratualizada; continuando com o Brasil, sem o qual não se organizará a governança do Oceano Moreno que é o Atlântico Sul; apoiando nesta iniciativa a recuperação de danos causados pelo unilateralismo ao relacionamento, no Atlântico Norte, entre os aliados na NATO; chamando a Rússia aos procedimentos de um Estado igual aos outros; e finalmente contribuindo para evitar que se agudizem os conflitos, e agravem as questões das fronteiras geográficas interiores, dos multiculturalismos implantados na sociedade europeia, e articulados com a insegurança global que ameaça os ocidentais. É de facto uma agenda arriscada, mas é por isso que vale a pena ter sido assumida.

Finalmente, para que futuros alargamentos não provoquem as incertezas actuais, doutrinar o compromisso de fazer anteceder os alargamentos de estudos conclusivos de governabilidade, e também estudos conclusivos de que se avança para fronteiras amigas. Em suma, não persistir no método de correr e pensar, por esta ordem. E finalmente, não consentir que o "mar salgado" que nos pertence mude de estatuto simplificadamente.

DN, 1-7-2007
 
O GRILO FALANTE

António Perez Metelo
redactor principal

Numa escondida estrada rural na raia minhota lá está a placa: reconstrução do troço tal e tal realizado com verbas do programa europeu Interreg; um filho telefona de Edimburgo a dizer como é fácil iniciar o ano de estudos no quadro do Programa Erasmus; vários cidadãos já obtiveram ganhos de causa junto do Tribunal de Estrasburgo, obrigando o Estado português a indemnizá-los por práticas negligentes e ineficiência da sua administração da justiça; quando surge o alarme quanto a nova epidemia ou determinado medicamento posto em causa, logo se dá entre nós uma revisão e decisão rápida em defesa da saúde pública; o número 3 tornou-se um fétiche ligado ao défice público, sem que muitos cidadãos entendam o alcance dos travões aplicados às políticas orçamentais dos treze membros do euro; contra o parecer de parceiros grandes e poderosos, uma empresa nacional de software desenvolve de forma expedita um programa, o SISone4all, que permite aos novos países do Leste europeu acelerar a sua entrada no Espaço Schengen, com livre circulação dos seus habitantes sem quebra de segurança para todos .

Pensar nos vinte e um anos e meio de presença portuguesa na União Europeia desperta as mais desencontradas imagens. E algumas certezas: o progresso, apoiado por fundos europeus, que mudaram a configuração física do país, as suas acessibilidades, a noção de proximidade entre parcelas do território nacional; a padronização, com normas em todos os campos, geralmente mais avançadas que as existentes antes, obrigando a uma constante subida dos índices qualitativos do nível de vida; a abertura à internacionalização, às parcerias europeias, aos padrões de consumo e de crédito, aos preços relativos (sobretudo, os titulados em euros), à diversidade cultural de um continente agrupado numa união sui generis de 500 milhões de cidadãos; a exigência de nos tornarmos mais capazes, mais produtivos, mais inventivos e empreendedores, porque a entrada para o euro nos fechou a porta à ilusão de recorrer a desvalorizações cambiais pseudocompetitivas.

Depois de quinze anos sempre a crescer, atingimos um tecto difícil de romper. É a incapacidade muito nossa de adequar o nível de vida à capacidade de criar riqueza e empregá-la com justiça e eficiência numa repartição sustentável e promotora de crescimento prolongado. Há seis anos que nos debatemos na procura desse equilíbrio que nos atire de novo para a aproximação progressiva e continuada aos países mais avançados, com os quais nos estamos sempre a comparar. A União Europeia tornou- -se o nosso grilo falante: já não é possível arranjar desculpas de mau pagador.

DN, 1-7-2007
 
História das duas presidências e três cimeiras realizadas em Lisboa

LUÍS NAVES

O choque dinamarquês da ratificação de Maastricht e um episódio com a França
Portugal presidiu por duas vezes ao Conselho Europeu, em 1992 e 2000, realizando três cimeiras. A primeira cimeira viu nascer o CCB e foi vivida em ambiente de consternação, pois a Dinamarca rejeitara dias antes o Tratado de Maastricht. Na segunda, em Março de 2000, ocorreu um dos episódios mais caricatos da história das presidências rotativas, mas também nasceu a Agenda de Lisboa. A terceira cimeira, no final do primeiro semestre de 2000, abriu caminho ao tratado de Nice.

A primeira presidência não tem grande história porque o semestre português deveria ser pacífico, após a conclusão, no final do ano anterior, do Tratado de Maastricht, cuja negociação tinha sido difícil. A agenda ficara esvaziada de assuntos, mas não faltou dramatismo, por causa da Dinamarca. O balde de água fria na ratificação ocorreu dias antes da cimeira de Lisboa e os líderes vieram em ambiente de crise.

No primeiro semestre de 2000, quando Guterres organizou a segunda presidência portuguesa, a Europa estava a avançar para a moeda única e Portugal fora escolhido no ano anterior para integrar o grupo que avançava para a zona euro. Mas ocorreu uma crise insólita: os conservadores austríacos tinham vencido as legislativas, mas em vez de formarem um governo minoritário coligaram-se com a extrema-direita. E a França tentou isolar a Áustria.

Na altura, estava em preparação o Tratado de Nice que abriria caminho ao alargamento, mas a economia europeia parecia pouco ambiciosa, comparada com a americana. Daí a ideia de se criar uma matriz de objectivos. Assim nasceu a Estratégia de Lisboa, aceite na cimeira de Março, onde ocorreu um incidente inesperado: franceses e belgas recusaram-se a aparecer na foto de família ao lado dos austríacos, mas a diplomacia contornou a dificuldade. Como estava na cimeira o presidente mexicano, Ernesto Zedillo, para concluir um acordo entre UE e México, foi feita uma foto de "grupo". No entanto, Zedillo atrasou-se, pelo que há também uma imagem só com os europeus. A irritação de Paris foi épica.

Depois, a cimeira de Santa Maria da Feira, de Junho, serviu para cumprir calendário. Os austríacos estavam isolados, mas houve foto de família, porque a França já só pensava no Tratado de Nice e precisava de não criar dificuldades inúteis.

DN, 1-7-2007
 
"A agenda internacional é um inferno!"

PAULA SÁ

O ministro confessa que a logística a 27 é muito complicada de gerir
Acabava de se despedir do representante da Autoridade Nacional Palestiniana. Um pedido de boas-graças da União Europeia na ajuda à resolução possível do conflito israelo-palestiniano selou o almoço. Passo rápido. Vários lances. Dezenas de degraus. Corredores de muitos metros. Por fim, o gabinete no Palácio das Necessidades e o sofá para descanso do guerreiro. Luís Amado, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, confessa ali mesmo: "A agenda internacional é um inferno!" É ali também que, muitas vezes, fecha os olhos "uns dez minutos", num sono leve, entre audiências, reuniões, audições, saídas para colóquios e cimeiras internacionais.

A imagem romântica do ministro dos Negócios Estrangeiros que, entre almoços e algumas conversas, vai gerindo as relações do mundo, cai por terra num clássico do jornalismo "um dia com" Amado. Ser ministro na era da globalização é trabalho suado e muito viajado. "Andar de avião para avião", diz a assessora de Imprensa, Paula Mascarenhas, porque viagem, viagem propriamente dita, e um pouquinho de lazer à mistura nada feito. "Os seus colegas bem se queixam quando viajam com o ministro que nem tempo têm para escrever."

Amado ainda tenta contrariar. "É um ministro que nos fustiga com os horários!" Gera-se um trocadilho entre ministro e assessora a envolver duas escalas em Alexandria, norte do Egipto, sem que a agenda tenha permitido um salto à sua mítica biblioteca. "Quando fomos à Líbia, ainda fomos visitar uns templos...", diz o titular dos Negócios Estrangeiros. "Um templo", emenda Paula Mascarenhas. Afinal, Amado reconhece, "lá vai o tempo em que decidíamos ir a um país qualquer porque não conhecíamos".

Uma união a 27, a globalização, as situações de crise a nível mundial, é muita exigência física para um ministro. "Estamos condicionados pelo automatismo dos eventos. Já não determinamos a nossa agenda", refere Luís Amado.

Os dois ou três últimos meses de preparação da presidência portuguesa da União Europeia intensificaram o ritmo de trabalho. Reuniões atrás de reuniões. Pequenos-almoços, almoços, jantares de trabalho. "Estou numa fase em que tenho que falar com toda a gente que tem necessidade de desenvolver com a União Europeia uma relação durante os próximos seis meses." Traduzindo as palavras do ministro que também é de Estado, quase todo o globo...

Não sendo possível dar a volta ao mundo, vamos ao "dia com" Amado. Uma amostra muito parcial de uma agenda sempre supercarregada, de um governante que, apesar do ar cansado, mantém sempre uma calma olímpica.

DN, 1-7-2007
 
VIVER NA EUROPA EM SEGURANÇA

declaração conjunta:
Wolfgang Schäuble, Ministro do Interior da Alemanha
Rui Pereira, Ministro da administração interna de Potugal
Draugutin Mate, Ministro do Interior da Eslovénia

A presidência alemã chegou ontem ao seu termo, concluindo-se assim a primeira fase do trio de presidências constituído pela Alemanha, Portugal e Eslovénia. Assumir a presidência do Conselho da União Europeia é, simultaneamente, um privilégio e um desafio. Por este motivo, a experiência de cooperação entre três presidências, tendo como objectivo a execução de um programa comum numa base de continuidade, revela-se muito vantajosa.

Fortalecer a Europa como um espaço de liberdade, segurança e justiça constitui uma das prioridades do nosso programa comum. Na sequência do sucesso da concretização do Mercado Único, as políticas dos assuntos internos e da segurança representam a área em que a União deverá mostrar maior dinamismo nos próximos anos. Actualmente, a Europa enfrenta diversos problemas cuja resolução depende de uma actuação conjunta. Como podemos prevenir o terrorismo internacional e proteger-nos desta ameaça global? Como podemos combater a criminalidade organizada transnacional? E como podemos garantir que as pessoas não colocam as suas vidas em risco ao tentar entrar na União Europeia?

A resposta a estas questões só poderá ser alcançada através da cooperação e da partilha de informação. A necessidade de enfrentar novos desafios de natureza transnacional e em permanente mutação impõe a existência de forças e serviços de segurança cuja actuação não se limite às fronteiras nacionais.

O objectivo primordial da presidência alemã foi, por conseguinte, o reforço efectivo da cooperação policial e da partilha de informação. Num futuro próximo, os 27 Estados-membros terão acesso aos dados de ADN e de impressões digitais conservados pelos seus parceiros europeus. Até à data, a partilha destes dados era uma realidade limitada aos sete Estados--membros signatários do Tratado de Prüm. A transposição deste tratado para a legislação europeia é um importante avanço. Nas semanas que se seguiram à sua entrada em vigor, a troca de dados entre a Áustria, Espanha, Luxemburgo e Alemanha permitiu o registo de aproximadamente 3700 ocorrências relacionadas com investigações em curso e a detenção de diversos autores de crimes graves.

Alcançámos, de igual modo, um acordo quanto à constituição de uma base de dados central sobre pedidos de vistos submetidos no espaço Schengen. Sempre que for formulado um novo pedido, será agora mais fácil verificar se a pessoa em questão já tinha solicitado um visto para outro Estado-membro. Com o intuito de melhorar o combate ao terrorismo e à imigração ilegal, reforçámos também os serviços centrais de segurança europeus - nomeadamente o Serviço Europeu de Polícia (Europol) e a Agência de Gestão de Fronteiras (Frontex) - através da ampliação das suas competências.

Outra questão importante para a presidência alemã foi o lançamento de uma iniciativa sobre o futuro da política europeia de assuntos internos. O Programa de Haia de 2004 estabelece os objectivos de tal política até 2010. No entanto, este é o momento em que devemos pensar sobre o que irá acontecer em seguida. Quais serão os desafios dos anos vindouros? Quais serão os nossos objectivos? Para responder a estas e outras questões, criámos um pequeno grupo informal que integra as futuras sete presidências e a comissão. Este grupo apresentará as suas recomendações no Outono de 2008.

Na recta final da presidência alemã pôde ainda alcançar-se um compromisso com a administração americana relativamente ao pedido de recolha de determinados dados sobre passageiros aéreos com vista a impedir terroristas de entrarem nos Estados Unidos. As novas disposições irão substituir o acordo provisório existente, cuja aplicação termina no próximo dia 31 de Julho. Estas disposições garantirão a segurança jurídica de todos os viajantes europeus, regulando claramente os dados que serão conservados e a forma como serão protegidos.

Hoje, Portugal assume, uma vez mais, a presidência do Conselho da União Europeia. Nos próximos seis meses, o nosso principal objectivo será a execução do projecto SISone4ALL, que visa a completa aplicação do acervo de Schengen e a consequente supressão de controlos nas fronteiras internas da União Europeia. De acordo com o actual calendário, este objectivo poderá ser concretizado até ao final do corrente ano. A realização deste projecto permitirá a milhões de cidadãos dos Estados-membros que nele participam deslocar-se livremente dentro da União Europeia, contribuindo assim para o fortalecimento do espaço de liberdade, segurança e justiça.

A concretização da Abordagem Global das Migrações, centrada em África e no Mediterrâneo, assim como nas regiões de leste e de sudeste da Europa, continuará a ser uma prioridade de topo da presidência portuguesa. Esta abordagem global e equilibrada inclui a promoção de canais legais de imigração, co-desenvolvimento e luta contra a imigração ilegal e tráfico de seres humanos. Neste contexto, Portugal organizará uma "Conferência de Alto Nível sobre Imigração Legal" nos dias 13 e 14 de Setembro, bem como uma "Reunião Ministerial Euromed sobre Migrações", em que participarão os Estados-membros e parceiros do Mediterrâneo, que se realizará no Algarve nos dias 18 e 19 de Novembro.

Por outro lado, um sistema integrado de gestão de fronteiras é um instrumento essencial para melhor gerir os fluxos migratórios. Durante a presidência alemã, acordou-se na criação de Equipas de Intervenção Rápida (RABITS), compostas por agentes de polícia das fronteiras dos Estados-membros, com o objectivo de prestar uma assistência célere em situações de grande impacto. A presidência portuguesa irá concentrar--se na constituição destas equipas, bem como no desenvolvimento da Rede Europeia de Patrulhas Costeiras e na criação do Sistema Europeu de Vigilância das Fronteiras Marítimas do Sul.

A luta contra o terrorismo continua a ser uma prioridade máxima da agenda europeia. Portugal continuará a aplicação da Estratégia Europeia de Combate ao Terrorismo, desenvolvendo as suas quatro vertentes - prevenir, proteger, perseguir e responder. Será, igualmente, dada especial atenção à melhoria da segurança dos explosivos. Como contributo para a adopção do Plano de Acção Europeu da Melhoria da Segurança dos Explosivos, realizar-se-á em Portugal, nos dias 16 e 17 de Julho, uma conferência dedicada a este tema. Tornar a União mais segura é também o objectivo que preside ao trabalho que será empreendido no campo da biopreparação.

A partir de Janeiro de 2008, a presidência eslovena prosseguirá os trabalhos sobre estas questões, sobretudo no que se refere ao projecto de alargamento do espaço Schengen. Segundo o programa comum, o controlo das fronteiras nos aeroportos dos novos Estados Schengen será abolido no final de Março do mesmo ano, concretizando-se assim o objectivo do trio de presidências nesta área. Paralelamente, a Eslovénia irá acompanhar o desenvolvimento da segunda geração do Sistema de Informação Schengen (SIS II), cuja conclusão está prevista para o final de 2008.

DN, 1-7-2007
 
O prestígio na Europa e o poder em Portugal

José Sócrates terá de enfrentar, a partir de hoje e nos próximos seis meses da presidência portuguesa da União Europeia (UE), o maior dos desafios da sua vida política.

Ao mesmo tempo que lhe cabe dirigir a UE, e tentar resolver o problema da redacção e aprovação do tratado, o primeiro-ministro sabe que não pode facilitar no acompanhamento da realidade nacional, onde ele e o seu Governo acabam de registar os níveis mais baixos de popularidade desde que tomaram posse.

O prestígio pode estar na Europa, mas o poder continua ligado a Portugal - e nisso é de crer que José Sócrates tenha estudado bem a lição que ficou de António Guterres, até porque também a viveu por dentro.

É importante, apesar de tudo, que na opinião pública não se desvalorize o valor desta rotatividade na liderança da Europa, que de seis em seis meses é assumida por um novo Estado membro. Neste aspecto, a luta política deve ter como limite o interesse e a imagem do País.

Do ponto de vista europeu, esta não é uma presidência de rotina - como, aliás, parece ser destino das presidências portuguesas, tendo em conta o que aconteceu nas duas anteriores (ver texto na pág.15).

A questão do tratado é duplamente importante.

Primeiro, porque definirá uma nova etapa para a Europa a 27, cada vez mais política e social - com todas as solidariedades e interdependências entre países que isso implica.

Segundo, porque buscará a solução para sair do labirinto em que a própria União Europeia se meteu ao ter decidido caminhar mais depressa do que uma parte dos seus cidadãos parecia querer - o que levou ao "não" na Holanda e França, os países onde o processo parou durante a primeira tentativa.

É de crer que José Sócrates usará de todo o seu pragmatismo na tentativa de resolução rápida desta questão, redigindo o novo texto e marcando uma Conferência Intergovernamental que o aprove, em Outubro.

O novo tratado poderá ter como "apelido" Lisboa e Sócrates não desdenha deixar essa marca. Mas, pelo meio, terá de ir contornando na opinião pública nacional a questão do referendo - em que tem a oposição, e até uma pequena parte do seu partido, contra si, mas dispõe de um grande aliado em Belém.

Enquanto isto, Sócrates sabe que não pode perder o País naquilo que interessa: recuperação económica, reestruturação do Estado, leis do trabalho, cuidados de saúde, qualidade da escola, ou seja, tudo o que faz a vida dos portugueses. É aí, na realidade interna, que jogará o regresso, ou não, ao "estado de graça" prolongado que há dois anos celebrou a entrada em cena na política nacional de alguém com convicções e com mando.

A iniciativa "Governo Presente", em Chaves, pretendeu sublinhar a promessa de que não afrouxará as responsabilidades internas. E, profissional na arte da comunicação, ele já fez questão de dizer que não haverá um "número dois" no Governo a representá-lo em alguns momentos de ausência por afazeres europeus.

Seja como for, os próximos tempos serão delicados de gerir por parte do Governo e do seu líder.

DN, 1-7-2007
 
UM EURO 2007

Nuno Brederode Santos
jurista
brederode@clix.pt

Furtiva, mas insinuante, é a tese, que vem fazendo o seu caminho, segundo a qual, obtido o "mandato claro", o sucesso da presidência portuguesa da EU estaria assegurado.

A ideia é, de facto, tentadora. Nas áreas da oposição (que já declararam, e bem, que não deixarão de o ser durante o nosso semestre de protagonismo europeu), como nas áreas do poder (que já declarou, e bem, que não esmorecerá na governação), ela tinha os seus encantos de circunstância. As primeiras sacudiam a pressão "consensualista" e "patriótica" que as poderia manietar até Dezembro. E esvaziavam desde já o capital político que para o Governo sempre advém de uma presidência conseguida. O Governo, esse condicionava totalmente o seu desempenho ao êxito dos alemães, esconjurando as responsabilidades portuguesas ante um hipotético malogro alemão em Junho.

Mas agora que tudo isto passou, a tese é, pelo menos, incómoda. Com a singela excepção daqueles que estão mal na Europa (onde a sua influência política é marginal), todos os mais terão de corrigir o tiro. Rapidamente, porque os desmentidos irão suceder-se, ao bom ritmo que as digestões a 27 proporcionam. Porque aos desafios recentes de uma Europa a 15, que ainda podia facilmente engolir, vai sucedendo gradualmente a filigrana de interesses, suspeições e contradições dos 27. Esta evoca irremediavelmente a digestão dos bovinos, que, segundo as aulas da minha juventude, era uma linha de desmontagem interminável, formada por bandulho, barrete, folhoso e coalheira. Fazia-me sempre pensar que, à chegada do clímax escatológico, já o boi devia estar desesperado.

O primeiro aviso chegou já, ainda antes de Portugal se sentar: o Governo polaco quer "clarificar" que o mecanismo de possível atraso na tomada das decisões é de dois anos. Parece que ninguém reteve tal ideia das negociações. E o primeiro-ministro português já lhe chamou "mal-entendido" (que é a tal palavra que usam para divergir duas pessoas que reciprocamente se entendem muito bem). Mas este aviso ilustra bem as contingências do mandato: entre outros perigos, ele está à mercê do imprevisível, como é o errático comportamento dos monozigóticos de Varsóvia (que querem arvorar em critério político os desmandos de uma guerra cuja superação foi o primeiro fundamento da aventura europeia).

Goste-se dele ou não, o óbvio é que qualquer alteração ao delicado e minucioso equilíbrio, há poucos dias conseguido, teria um efeito centrífugo devastador. Uma hipotética nova vantagem polaca, no sistema de votação acordado, teria de ser (legitimamente) reivindicada pela Espanha e quase fatalmente essas duas alterações obrigariam à renegociação dos próprios critérios gerais, ou seja, do voto de todos. E encorajaria o Reino Unido a repor toda a extensão das suas objecções. Fazendo com que tudo voltasse à estaca zero, para renegociação de todas as quase inconciliáveis pretensões nacionais dos 27. (Ou pior: 26, porque um pequeno país na presidência talvez ganhe capacidade para impor valores que lhe convenham, mas perde capacidade para defender interesses concretos próprios).

Acresce a isto um factor que nos espreita: é que Jaroslavs, Lechs e demais não ignoram que negociar com um país à nossa escala não é o mesmo que negociar com a Alemanha. A nossa força é a do mandatário, quase a do mero portador de (más) notícias a todos os descontentes. No que diz a Alemanha, antevê-se uma decisão. No que diz Portugal, antevê-se uma proposta.

O que aí vem é complicado. Porque não são só as toneladas de papel e os trabalhos a desoras, mais os equívocos de tradução do costume. Para isso bastaria a tarimba adquirida pelos apátridas de Bruxelas. Nem requer só a (preciosa) habilidade dos diplomatas. O que aí vem joga-se sobretudo na pujança de alma dos políticos. Coisa que só podem ter com um forte respaldo interno. E este, só o terão se apostarem na transparência democrática e se acreditarem que vale a pena trabalhar com todas as instituições e oposições interessadas. Se tanto for preciso, finjam que é um Euro 2007.

DN, 1-7-2007
 
OS PARADIGMAS DA PRESIDÊNCIA

Adriano Moreira
professor universitário

A rotatividade das presidências europeias não produz necessariamente sinais que antecipem com relativa segurança o modelo final da governação, mas vão permitindo identificar as diversidades das motivações dos países, e a complexidade do processo de convergência e síntese.

Talvez um dos elementos mais clarificadores de cada diferente perspectiva esteja na relação, que vão anunciando, entre os interesses e futuro da Europa como entidade para além dos Estados membros e os interesses e futuro próprios destes, que as presidências rotativas vão identificando como fortalecidos pelo apoio da União em progresso.

As diferentes atitudes em relação aos votos estaduais que recusam aprovar tratados como o Constitucional ou a sua versão de Lisboa, a importância das cooperações reforçadas que ora é enfatizada ora atenuada, a válvula do opting out, parecem ter relação clara com o obscuro diálogo entre as preferências, ou pelo modelo comunitário, ou pelo modelo federal, eventualmente com a deriva da hierarquia consagrada e aceite dos Estados membros.

A presidência portuguesa, cuja qualidade não tem de ser avaliada pelas legítimas e previstas dificuldades no sentido de as conclusões e propostas serem aprovadas pelos eleitorados nacionais, mostrou-se vinculada à sua leitura do interesse específico da União, em que se apoiará a dinamização do interesse específico mas solidário dos países.

No caso da presidência francesa, uma leitura atenta das mensagens presidenciais dirigidas aos seus parlamentares, ao eleitorado, e ao mundo, é aconselhável para tentar compreender o seu conceito da relação da França com a União.

Tendo presente a tradição gaullista de preservar com rigor a imagem da histórica grandeza da França, mesmo quando o poder efectivo estava longe de voltar a corresponder a um unilateralismo de sustentação, é visível que esse legado continua vivo no programa e acção dos sucessivos governos, sem diferenciação das formações políticas dominantes, e por isso também nas propostas de Sarkozy.

É por isso que o conceito, por ele nunca abandonado, de que "a emergência de um Estado forte, um dos principais actores da cena internacional, pode contribuir de modo decisivo para a construção de uma ordem mundial mais eficaz, mais justa, mais harmoniosa que os povos reclamam", é sempre relacionado com uma visão de liderança francesa, com um conceito estratégico francês específico, com a urgência e necessidade de uma resposta francesa às urgências da comunidade mundial.

Quando o povo francês recusou o Tratado Constitucional, a reacção dos Estados teve uma contenção bem diferente da que está crescendo de visibilidade em relação ao veto irlandês contra o Tratado de Lisboa, e a ironia do Presidente francês em relação às susceptibilidades do comissário europeu, que não apreciou os seus anúncios políticos, sugere que não esperava menos.

Sendo muito geral o sentimento de que a Europa, tal como o Ocidente em geral, está carente de lideranças fortes, seria errado entender que essa liderança implicaria novamente uma opção pelo modelo comunitário, porque qualquer modelo beneficia dessa circunstância desde que o actor respeite a legalidade e conceito da organização.

Mas a circunstância é sempre condicionadora dos projectos, e a incerteza actual sobre a evolução internacional da União faz supor que a percepção da liderança francesa, tal como está enunciada pelo discurso do seu Governo nacional, apoia sobretudo a evolução para um directório estruturante do modelo final.

A experiência passada e trágica europeia está marcada de desastres sempre que o directório, em qualquer das suas modalidades, assomou para responder às exigências globais.

Que não são menos graves do que os desastres devidos aos unilateralismos que usam invocar, expressa ou implicitamente, o fim da história.

É por isso que a recuperação de uma presença europeia coesa, fortalecida, e superadora da debilidade actual, parece ser mais bem servida pela visão comunitária do que pelas urgências directivas que tradicionalmente fizeram dilapidar o tempo.

DN, 29-7-2008
 
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