23 agosto, 2007

 

Ganância


Um exemplo à americana...

"Milionária à custa do Pentágono

MANUEL RICARDO FERREIRA, Nova Iorque

Não há provérbio mais falso do que "em tempo de guerra não se limpam armas", mas é sabido que nessas alturas poucas contas são feitas. Foi por saber disso que uma empresária americana conseguiu ter, nos últimos anos, uma vida de milionária, até que a ganância e um contabilista mais atento lhe acabou com o sonho.

Charlene Corley, 47 anos, é dona da C&D Distributors, uma empresa da Carolina do Sul que fornece material para as forças armadas. Há sete anos, começou a perceber que se os militares estavam atentos ao preço dos artigos, pouco ligavam aos custos de manuseamento e envio - e começou a carregar nas contas.

Até que em Setembro de 2006 um funcionário do Pentágono reparou que as despesas de envio de duas anilhas de 19 cêntimos cada eram de 969 mil dólares. Rejeitou a encomenda e foi verificar o que se passava com aquele fornecedor. Depressa descobriu que pelo transporte de outra encomenda de duas anilhas tinham sido pagos 998.798 dólares. Para enviar três parafusos (que custam 1,31 dólares cada) para a base dos marines em Habbaniyah, no Iraque, foram pagos 455.009 dólares; pelo envio de uma anilha de 89 cêntimos para a base da força aérea em Cabo Canaveral, na Florida, 293.451 dólares. Em seis anos, por 68 mil dólares de material tinham sido pagos à C&D Distributors 20,5 milhões de dólares em transporte e manuseamento.

Cynthia Stroot, investigadora do Pentágono, explica que por sistema são pagas automaticamente todas as encomendas classificadas como "prioridade" e destinadas a áreas de combate (Iraque ou Afeganistão). Desde que o esquema de Corley foi descoberto, o Pentágono já desmantelou outros, mas nenhum da dimensão da C&D Distributors.

E o que fazia Charlene ao dinheiro? Grandes casas, automóveis de luxo, jóias e férias. Tudo isso vai ser leiloado a favor do Pentágono e Charlene pode ficar até 20 anos na cadeia."

DN, 20-8-2007

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Mais de 17 mil armas brancas apreendidas pela Brigada Fiscal

PAULA SANCHEZ

O Destacamento Fiscal de Serviços Especiais da GNR descobriu num armazém de Camarate (concelho de Loures), 17 145 armas brancas que se destinavam a ser comercializadas, de forma ilegal, em lojas de artigos chineses.

Durante a operação policial foi identificado um homem, de 47 anos, de nacionalidade chinesa, dono da mercadoria e de uma loja de produtos chineses, localizada em Lisboa.

O homem, que será constituído arguido, não tem licença para a comercialização destes artigos, mesmo que alguns sejam considerados peças de colecção. Navalhas de ponta e mola, facas, navalhas-borboleta, sabres, punhais e cimitarras, de tamanhos diversos, muitas centenas dos quais com lâmina proibida, contam-se entre os artigos confiscados, avaliados em quase 118 mil euros. Presume-se que os artigos se destinavam à venda ao público na loja do comerciante em Lisboa, onde podiam ser adquiridos "a pedido", uma vez que, por serem proibidos, "não estavam expostos", adiantou fonte policial.

A Brigada Fiscal está a desenvolver mais investigações para apurar se o comerciante seria revendedor deste tipo de produtos, já que no início do ano foram apreendidas em lojas de venda ao público, no Funchal e no Algarve, armas semelhantes que se supõe serem do mesmo lote.

Também a entrada em Portugal da mercadoria está a preocupar as autoridades. A tenente Ana Lopes, comandante do destacamento de Serviços Especiais, explicou ao DN que agora será feito o historial da mercadoria. Por enquanto, sabe-se apenas que as armas foram importadas da China e chegaram a Portugal por via marítima, escondidas em contentores, onde seguiam com outros produtos de venda legal.

DN, 25-9-2007
 
Bout está em todas as guerras

MANUEL RICARDO FERREIRA, Nova Iorque

Considerado o maior traficante de armas
"Desculpa Nicolas Cage, o filme é mau", comentou Viktor Bout sobre Lord of War, a história cinematográfica da sua vida. Definitivamente, a imagem de Mercador da Morte não agrada a este russo ou tajique, nascido a 13 de Janeiro de 1967 em Dushanbe (segundo um dos seus passaportes), filho de um mecânico de automóveis e uma guarda-livros. Preferia ser visto como "alguém que forne- ce transportes", uma espécie de chauffeur de táxi dos ares, que leva o seu passageiro e bagagem ao destino sem fazer perguntas. Nem dar respostas. E também por isso tão-pouco se sabe de um homem que esteve ligado a TODAS as guerras dos últimos 15 anos.

Cursou a escola 47 de Dushanbe (capital do Tajaquistão) até 1984, fez um bacharelato em Sociologia na especialidade Comunicações Interculturais e entrou para o Instituto de Línguas Estrangeiras e centro de recrutamento para os agentes do GRU, a espionagem militar soviética, de onde em 1991 saiu para a tropa.

Ou talvez não sejam essas as datas. Relatórios das espionagens britânica e sul-africana dão-no como agente do KGB (ele odeia que digam que pertenceu à antiga polícia política) em Roma entre 1985 e 1989; funcionários da ONU dizem que no final da década de 80 servia de intérprete aos russos da força de manutenção de paz em Angola, e Alexander Sidorenko, ex-pára--quedista, executivo da aviação e um dos primeiros sócios de Bout, coloca--o nessa altura como "adido comercial em Luanda". O que parece mais verosímil face ao que se passou a seguir.

Na União Soviética, havia centenas de Antonovs e Ilyushins a apodrecer e milhares de pilotos sem trabalho. Bout surge repentinamente proprietário de um ou três aviões, diz-se que "facilitados" pelo GRU. Quando a guerra civil se reacende em Angola, em 1993, os aviões da Air Cess de Bout estão prontos a transportar o necessário para as tropas governamentais. Só a via aérea era praticável para os fornecimentos. Uma das características de Bout é tornar-se amigo de toda a gente, não se lhe conhecem inimigos. Em breve estava a transportar armamento para a UNITA de Savimbi, actividade bastante lucrativa, paga em diamantes. A nordeste de Angola come çavam as guerras civis no então Zaire e Ruanda. Bout fez amizade com Mobutu (foi num avião dele que o ditador fugiu para o exílio), mas também com Joseph Kabila e Jean-Pierre Bemba. E a todos serviu. Nessa altura tinha montado escritório no aeroporto de Ostend, na Bélgica. Os seus aviões chegavam lá vazios, reabasteciam-se, rumavam a Burgas, na Bulgária, onde carregavam o armamento e munições destinado às guerras.

A desconfiança das autoridades belgas sobre as suas actividades fez com que mudasse a base de operações de Ostaend para Sharjah, um dos Emirados Árabes Unidos. Aqui é procurado por representantes afegãos do governo de Burhanuddin Rabbani, então aliado de Ahmad Shad Massoud, comandante da Aliança do Norte, que procuravam suster o avanço talibã. Bout fornece-lhes o armamento que precisam, pago em pasta de ópio ou esmeraldas.

Até que uma contrariedade lhe dá mais uma oportunidade. Em 25 de Agosto de 1995, um Jumbo Il-76 de Bout com 30 toneladas de munições para o governo afegão é forçado por um MiG-21 dos talibãs a aterrar em Kandahar. O avião é apreendido e a tripulação presa. Viktor Bout desloca-se várias vezes a Kandahar para tentar resolver a situação, e o certo é que um dia todos os guardas ficam distraídos e a tripulação consegue fugir com o avião... Estavam estabelecidas as relações com os talibãs, e, quando estes entram em Cabul e se tornam governo, Bout vai-lhes ser prestável: cede os aviões para a reconstituição da companhia aérea afegã Ariana e consegue um acordo de fornecimento pelos serviços secretos ucranianos de material bélico, tudo transportado nos seus aviões para o Afeganistão.

Bout continuava activo em África, fornecendo os seus serviços a todos os contendores, principalmente na região dos Grandes Lagos, mas também mais a norte. Tinha começado a guerra civil na Libéria e Bout tornou-se amigo de Charles Taylor, que ascenderia à presidência em 1997. Compra uma casa em Monrovia e trata de satisfazer todos os desejos de Taylor, como conseguir em duas semanas dois helicópteros de ataque equipados, municiados e tripulados... Está ao lado de Taylor durante todo o seu reinado criminoso e é com as forças dele que monta uma operação contra a Serra Leoa para se apoderar das minas abandonadas de rútilo. Faz ainda voos para abastecer as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).

As operações em África exigem uma base local. Instala-a em 1993 no aeroporto de Pieterburgo, África do Sul. Compra por três milhões de dólares uma mansão no bairro Sandhurst, em Joanesburgo, que fortifica e onde instala a mulher, as filhas e a sogra.

Os negócios na África do Sul correm-lhe bem: depois de entregarem as armas em Angola e nos Grandes Lagos, os aviões passam por Pierterburgo onde carregam gladíolos, comprados na África do Sul a dois dólares cada e vendidos a cem no Dubai, ou frangos congelados, que de um dólar passam a dez por toda a África. Mas um belo dia um grupo armado entra- -lhe em casa: dão uma coronhada na cabeça da sogra e roubam-lhe seis milhões de dólares. Bout faz as malas, sai da África do Sul e vai para Moscovo.

Dão-se os atentados de 11 de Setembro e Bout põe a sua frota ao serviço. Sabe-se que "trabalhou" com as tropas especiais americanas, mas não como. A ligação é mais clara na guerra do Iraque: os aviões de Bout aterram e descolam quase todos os dias, não apenas do aeroporto de Bagdad, mas de todas as pistas e bases onde há militares americanos. Em 2006, na guerra do Líbano, são os aviões de Bout que asseguram o transporte de material da Rússia para a Síria e Irão para armar o Hezbolah.

Enquanto houver guerras no mundo, haverá procura de serviços de traficantes de armas e "transportadores" que as alimentem, que ponham o equipamento de morte no terreno. E, por enquanto, Viktor Bout é sem dúvida o melhor entre eles. Afinal, até mesmo a produção do filme Lord of War teve de recorrer a ele para alugar os aviões que nele aparecem...

DN, 13-10-2007
 
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