05 setembro, 2007

 

Madre Teresa de Calcutá


10 anos depois




http://pt.wikipedia.org/wiki/Madre_Teresa_de_Calcut%C3%A1
http://www.ewtn.com/motherteresa/

http://www.rr.pt/PopUpMedia.Aspx?&FileTypeId=1&FileId=355535&contentid=218115

http://www.correiodamanha.pt/noticia.asp?id=256644&idselect=91&idCanal=91&p=200

Comments:
MADRE TERESA TARDA EM SER SANTA

PATRÍCIA VIEGAS

A canonização da madre Teresa está atrasada devido à falta de um segundo milagre que prove que é santa, disse a sua sucessora, a irmã Nirmala, numa entrevista que deu recentemente à Indo-Asian News Service em Calcutá.

"No coração das pessoas a madre é sempre uma santa. Mas a santidade oficial está à distância de um milagre. Até agora não há notícia de nenhum. Mas não estamos preocupadas. Deus irá decidir quando ele acontecerá".

Até agora, apenas um milagre, a cura de Monica Besra, uma mulher oriunda do estado indiano do Bengala Ocidental que sofria de um tumor no abdómen, foi atribuído à madre Teresa de Calcutá.

Beatificada em tempo considerado recorde (Outubro de 2003), precisamente por este milagre, a madre Teresa tarda em ser santa, quando passam dez anos sobre o seu desaparecimento físico.

Agnes Gonxha Bojaxhiu, nome verdadeiro da freira de origem albanesa, morreu a 5 de Setembro de 1997. Tinha 87 anos de idade e há muito que sofria de uma saúde debilitada.

A sua morte foi sentida tanto por comunidades religiosas como seculares. O antigo secretário-geral da ONU, o peruano Javier Pérez de Cuéllar, declarou nessa ocasião: "Ela é as Nações Unidas. Ela é a paz no mundo".

Natural de Skopje, hoje capital da Ex-República Jugoslava da Macedónia, Agnes saiu de casa aos 18 anos para se juntar às irmãs do Loreto. Aprendeu inglês e fez os votos de noviça já na Índia, em 1931, altura em que escolheu mudar o seu nome para Teresa. Tornou-se freira seis anos mais tarde quando ensinava numa escola em Calcutá.

Impressionada com a pobreza que a rodeava nessa cidade, diz ter sentido um chamamento de Cristo e, em 1950, obteve autorização do Vaticano para fundar as Missionárias da Caridade.

O seu trabalho piedoso com os pobres espalhou-se por todo o mundo e levou milhares de irmãs e voluntários a aderirem à congregação. O que lhe valeu o Prémio Nobel da Paz - que recebeu em Oslo em Dezembro de 1979.

Na altura, no discurso que fez, afirmou: "Não é suficiente dizer 'Eu amo Deus', mas não o meu vizinho. [Ao morrer na cruz] Deus tornou-se o faminto, o nu e o sem abrigo. A fome de Jesus é aquilo que temos de encontrar e aliviar. Cristo está nos nossos corações, Cristo é o pobre que encontramos, o sorriso que damos e que recebemos".

Contudo, três meses antes, numa carta enviada ao padre Michael Van Der Peet, confessou: "Jesus tem um amor muito especial por si. [Mas] para mim - o silêncio e o vazio é tão grande - que olho e não vejo - Escuto e não ouço. A língua mexe-se [na oração] mas não fala...Quero que reze por mim".

O conteúdo desta e outras cartas formam o livro, lançado hoje nos EUA, da autoria do padre Brian Kolodiejchuk. A obra revela que a madre Teresa duvidou da existência de Deus durante 50 anos (e mesmo assim continuou ao seu serviço). Muitos desconheciam-no. Até agora.

DN, 4-9-2007
 
Missão continua a crescer

Uma década depois da morte de Madre Teresa de
Calcutá, o trabalho da congregação continua. Em Portugal, as
Missionárias da Caridade dedicam há 25 anos todo o seu tempo
a ajudar os mais pobres, prosseguindo, assim, o propósito
da sua fundadora.
Abriram primeiro uma casa em Setúbal, onde, de acordo com
a irmã Maria do Carmo, “quase naturalmente começaram a
aparecer famílias carenciadas e crianças deficientes”.
Depois, abriram em Lisboa e, mais tarde, em Faro, onde
recolheram homens e mulheres da terceira idade, “sem possibilidade
de pagar uma renda e sem família que cuide
deles”.
A irmã Maria do Carmo, provincial da Congregação, diz que
além destes apoios faz visitas a casa de famílias carenciadas,
ajudando a pagar rendas, distribuindo alimentos e roupas.
Para concretizar este auxílio, as missionárias contam unicamente
com os donativos de gente generosa, assim como o
apoio de muitos voluntários, dispostos a ajudar naquilo que
for preciso.
Dez anos depois da morte de Madre Teresa de Calcutá, o
trabalho da congregação “Missionárias da Caridade” não foi
posto em causa, como sublinha o Padre Peter Stilweel, assistente
religioso da Renascença.
“A congregação continua a crescer. Já são 757 casas por todo
o mundo e 166 foram abertas já depois da Madre Teresa morrer.
Portanto, mostra que não há neste momento uma crise,
mas sim um sinal interessante de que o Espírito continua a
gerar no mundo esta vocação de gente que se quer dedicar
por inteiro aos pobres”, afirma.
Para assinalar esta data realiza-se hoje uma missa na paróquia
de Chelas, pelas 18h30, com a presença do Cardeal
Patriarca de Lisboa.
A grande missionária do século XX
Madre Teresa de Calcutá, de seu nome verdadeiro Agnes
Gonxha Bojaxhiu, nasceu em Skopje, na República da Macedónia,
a 27 de Agosto de 1910, foi missionária católica albanesa,
mais tarde naturalizada indiana e beatificada pela Igreja
Católica.
Considerada a missionária do século XX, concretizou o projecto
de apoiar os mais desfavorecidos na Índia. Partiu em
direcção à cidade de Darjeeling, em 1931, onde fez o noviciado
no colégio das Irmãs de Loreto.
No mesmo ano tomou o nome de "Teresa" em honra à irmã
francesa Teresa de Lisieux, padroeira das missionárias, canonizada
em 1927 e conhecida como Santa Teresinha.
De Darjeeling passou para Calcutá, onde exerceu, durante os
anos 30 e 40, a docência em Geografia num colégio da congregação
de Nossa Senhora do Loreto.
Impressionada com os problemas sociais da Índia, fez a profissão
perpétua em 1937, abandonou a docência e tirou um
curso de enfermagem, que veio a ser fundamental no seu
trajecto.
Em 1948, e após muita insistência, o Papa Pio XII permitiu
que abandonasse as suas funções enquanto irmã, para iniciar
uma nova congregação de caridade, cujo objectivo era ensinar
as crianças pobres a ler.
Assim nasceu a congregação das Missionárias da Caridade,
adoptando como princípio o abandono de todos os bens
materiais. Cada irmã teria apenas um prato, um jogo de roupa
interior, um par de sandálias, um pedaço de sabão, uma
almofada, um colchão, um par de lençóis e um balde.
O reconhecimento do mundo pelo seu trabalho chegou com a
atribuição do Nobel da Paz, no dia 17 de Outubro de 1979.
Morreu em 1997,com 87 anos e em 2003 foi beatificada pelo
Papa João Paulo II.
Contudo, o seu trabalho missionário continua a crescer, com
cerca de 3 mil freiras e 400 irmãos, em 87 países, dando
apoio aos mais necessitados em cerca de 160 cidades.
Na antena da Renascença, recordámos hoje declarações de
Madre Teresa, numa entrevista concedida em 1997 ao jornalista
Pedro Mesquita e que pode ouvir www.rr.pt.

RRP1, 5-9-2007
 
AS DÚVIDAS DE CRENTES E NÃO CRENTES

Anselmo Borges
padre e professor de Filosofia

As dúvidas de Madre Teresa de Calcutá quanto à existência de Deus parece que afligiram mais os não crentes do que os crentes.

Na obra recém-publicada Mother Teresa: Come Be My Light - Madre Teresa: vem e sê a minha luz -, com correspondência da religiosa célebre, aparece uma Madre Teresa em profunda crise espiritual, que chega a duvidar da existência de Deus. "O silêncio e o vazio são tão grandes que olho mas não vejo, escuto mas não oiço, a língua move-se durante a oração mas não fala", escreveu numa das cartas.

Aquele Cristo que ela, na entrega do Prémio Nobel da Paz, declarou que "está nos nossos corações, nos pobres que encontramos, no sorriso que oferecemos e no que recebemos", deixou-a no vazio espiritual durante parte de uma vida torturada pela sua ausência.

Houve então quem chegasse a pôr em questão a sinceridade de Madre Teresa e a verdade da sua vida. Teria ela colocado uma máscara? E se a sua existência não tivesse passado de hipocrisia?

Também alguns crentes, incluindo clérigos, sentiram um abalo profundo, vindo a terreiro com declarações no sentido de que não tinha tido dúvidas. Tratar-se-ia apenas de uma prova de Deus e daquela ausência de consolação que a fé concede.

Mas não escreveu São Tomás de Aquino, doutor da Igreja, que a fé convive com a dúvida? Sem esta convivência, ainda seria fé?

Não falaram os místicos maiores - Teresa de Ávila, João da Cruz - da "noite escura"? Também Santa Teresa de Lisieux, outra doutora da Igreja, foi assaltada pela tentação da dúvida, parecendo-lhe, nas vésperas de morrer, que lhe diziam: "Crês que um dia sairás das trevas que te rodeiam. Avança! Avança! Alegra-te com a morte, que te dará não o que esperas, mas uma noite mais profunda ainda, a noite do nada."

O cardeal Julián Herranz veio lembrar que estas crises são normais: "A vida dos santos está cheia de confissões parecidas, pessoas que provaram o deserto da noite da fé." E lembrou Jesus, que do alto da cruz rezou: "Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?"

Bento XVI, que, no antigo campo de concentração nazi de Auschwitz, tinha perguntado onde estava Deus enquanto acontecia todo aquele inominável horror do Holocausto e porque é que se manteve em silêncio, relembrou, a propósito de Madre Teresa, que "todos os crentes sabem sobre o silêncio de Deus."

Como dizia o filósofo Unamuno, nem mesmo o crente mais crente deixa de ser atravessado pela dúvida nem o descrente mais descrente por um "talvez". Também o teólogo Joseph Ratzinger escreveu: "O crente e o não crente participam, cada um à sua maneira, na dúvida e na fé. Nem um nem outro podem subtrair-se completamente à dúvida e à fé. Talvez precisamente a dúvida, que impede um e outro de se fecharem totalmente em si mesmos, pudesse tornar-se o lugar da comunicação. Ela evita que ambos girem exclusivamente à volta de si próprios; abre o crente ao que duvida e o que duvida ao que crê; para o primeiro, ela é a sua participação no destino do não crente, para o outro, a forma como a fé, apesar de tudo, permanece nele um desafio."

Deus não é evidente e a fé não tem a certeza da lógica ou das ciências empírico-matemáticas. Como diz o próprio étimo - fides -, a fé é confiança, isto é, entrega confiada a alguém - no caso da fé religiosa, a Deus. Tem razões e a segurança própria da confiança. É casada com a esperança e o amor, em co-implicação: a fé alimenta a esperança e o amor, a esperança anima uma e outro, o amor e a esperança confirmam e aprofundam a fé.

Acreditar em Deus implica acreditar no Homem, sendo, por vezes, mais fácil acreditar em Deus do que acreditar no Homem. Como podia Madre Teresa, no meio da miséria bruta e degradante - a "lixeira" da Humanidade - ficar imune à dúvida?

Como ela dizia, para lá da pobreza material, a pobreza maior é a de não ser amado, querido e viver em solidão. Então, a prova e o milagre da fé de Madre Teresa foi o amor vivo, numa dedicação incondicional e sem desânimo, aos mais pobres dos pobres. A fé é um combate que se ganha no amor.

DN, 29-9-2007
 
O segredo de Madre Teresa de Calcutá

Por Francisco Sarsfield Cabral

Madre Teresa de Calcutá foi uma personalidade mundialmente
conhecida pelo seu trabalho com os mais pobres dos pobres nas ruas e nos bairros miseráveis da Índia. Fundou uma congregação – as Missionárias da Caridade – para levar por diante essa obra em numerosos países, incluindo Portugal.
Em 1979 Madre Teresa recebeu o Prémio Nobel da Paz. Tendo morrido em 1997, foi beatificada em 2003, correndo agora o processo de canonização. O postulador da beatificação e da canonização de Madre Teresa, P. Brian
Kolodiejchuck (canadiano e padre missionário da caridade), é autor de um livro que acaba de ser traduzido e publicado em Português.
Ora este livro revela algo de surpreendente: a desolação
espiritual em que viveu a Madre Teresa após ter conseguido
iniciar a sua obra das Missionárias da Caridade. Antes, em
1946, a freira Teresa tinha ouvido um claro chamamento de Cristo para se dedicar aos mais pobres. Mas, paradoxalmente, uma vez posta em marcha essa fantástica iniciativa,
Madre Teresa passou a viver numa grande escuridão interior, apenas conhecida dos seus directores espirituais.
Esta aparente contradição levou a inúmeros comentários.
Teria a Madre Teresa perdido a fé? O livro agora editado em Portugal mostra que não. Pelo contrário. Madre Teresa sempre se manteve fidelíssima ao chamamento de Cristo e ao serviço dos pobres – nos quais via, precisamente, a face de Deus. O facto de não “sentir” Deus significa que a Beata Teresa viveu uma longa “noite escura”, como S. João da Cruz e outros místicos. Um sofrimento que Madre Teresa associou a Cristo na Cruz, quando gritou: “Pai, Pai, porque me abandonaste?” e ao abandono dos pobres que ela ajudava.
A extraordinária biografia espiritual de Madre Teresa de Calcutá ajuda-nos a tomar consciência do que é realmente a fé.

RRP1, 10-3-2008
 
As dúvidas de fé em livro

“Vem, Sê a Minha Luz” é o título da obra com os escritos privados de Madre Teresa de Calcutá. A versão portuguesa é lançada esta tarde em Lisboa. O livro compila os
diários e a correspondência que Madre Teresa endereçou aos seus confessores e superiores. Escritos nos quais revela as dúvidas de fé que a atormentaram durante décadas.
Esta crise interior foi vivida por Madre Teresa até ao fim da vida e tornada pública pelo Padre Brian Kolodiejchuk, postulador da causa de canonização de Madre Teresa e director do Centro Madre Teresa. O director de informação da Renascença, Francisco Sarsfield Cabral, falou com o Padre Brian,
que explica porque decidiu publicar estas cartas apesar da
Madre Teresa ter pedido para que estas fossem destruídas.

Rádio Renascença - Madre Teresa pediu para serem destruídas as cartas que escreveu aos seus directores espirituais sobre a sua difícil vida interior. As cartas não foram destruídas e agora são publicadas num livro. Porquê?
Pe. Brian - Porque acho que originalmente os Jesuítas entenderam que as cartas não descreviam apenas as suas próprias
experiências, mas perceberam que aquilo que ela estava a
atravessar era também uma ajuda para entender melhor qual era o seu lugar a servir os mais pobres entres os pobres.
RR - Este livro, mostrando a escuridão espiritual que a Madre Teresa sofreu, poderá ajudar aqueles que sentem dúvidas de fé e a ausência de Deus?
Pe. B. - Penso que as cartas mostram que a Madre Teresa viveu e teve que passar pela mesma luta espiritual que passam todos os que estão numa jornada de fé e desejam ter uma relação mais intima com Deus. Apesar de, no caso da Madre Teresa, especialmente na escuridão que ela viveu durante os anos como missionária da caridade, foi na realidade um modo dela viver uma vida mística. Muitas pessoas são
ainda inspiradas pela luta da Madre Teresa pela fidelidade e
pela fé e amor que ela mostrou nessa experiência, mesmo que não estejam ainda no mesmo nível que ela.
RR - A Madre Teresa sentiu um apelo de Cristo para se dedicar aos mais pobres. Paradoxalmente, quando a sua obra se concretizou, deixou de sentir a proximidade de
Cristo…
Pe. B. - Quando a Madre Teresa era uma freira do Loreto já estava a atravessar a escuridão, como ela lhe chamava. Ela escreveu ao director espiritual - "Cada vez mais a escuridão é a minha companhia " - E essa era a escuridão que estava a prepará-la para a verdadeira e intensa união que ela experimentou em 1946 e especialmente na primeira metade de
1947. E , então, mais uma vez veio a escuridão. Mas dessa segunda vez a escuridão foi o modo como ela própria estava a viver a união. Há vários santos que têm este tipo de experiência em que não é tanto a noite escura que prepara para a
união, mas é, como poderemos dizer, uma escuridão apostólica.
RR - Não seria uma autêntica crise de fé a escuridão que a Madre
Teresa sentia? Ela chegou a dizer “se Deus existe”…
Pe. B. - O leitor têm que entender as cartas no contexto das outras cartas.
É esse o problema, especialmente quando saiu o artigo da revista Times. O artigo tentava apresentar
num espaço curto parte da jornada completa. O problema é quando se tira algo do contexto. Por isso, mesmo quando a Madre Teresa dizia " Eu não tenho fé, não tenho amor, o céu não tem nenhum significado " , fazia parte de uma carta escrita a Deus. Por isso ao mesmo tempo que expressava isto
era quando ela ainda rezava e falava directamente com Deus. É preciso perceber como é que isso surge no contexto da sua vida espiritual.
RR - A Madre Teresa queixava-se de não ser amada por Deus. Como entender?
Pe. B. - Essa foi a grande dificuldade da experiência. Penso
que se lermos as cartas que foram escritas quando ela era uma freira do Loreto toda a gente dirá que temos um registo impressionante do que é para uma pessoa atravessar a noite escura em preparação para a união. Mas a parte mais extraordinária é que essas carta foram escritas depois como uma forma dela viver essa união, porque ao mesmo tempo que atravessa estas experiências diz também noutros locais "quando me recomponho sei que tenho essa união contínua e que estou unida na mente e na vontade com Deus"
RR - Até que ponto a escuridão e a aridez espirituais sofridas pela Madre Teresa são parecidas com a “noite escura” do místico espanhol S. João da Cruz?
Pe. B. - As cartas expressam aquilo que S. João da Cruz chamou
"a noite escura". E eu penso que, como há uma nota de rodapé, citando o teólogo dominicano Reginald Garrigou-Lagrange, que diz que as vidas de alguns santos tiveram este tipo de experiência a que ele chama reportório e a que podemos também chamar uma escuridão apostólica. Como parte
da união da Madre Teresa ela estava tão próxima e unida que
Jesus podia partilhar com ela o seu sofrimento mais intenso que foi no jardim das oliveiras e depois na cruz.
RR - Embora sentisse uma grande aridez espiritual, a Madre Teresa sempre viu a face de Cristo nos mais pobres.
Não é isto profundamente cristão?
Pe. B. - Na realidade é também profundamente místico. Porque
permite ver e acreditar que naquela pessoa existe a presença
de Jesus. É também uma visão de fé. E de facto, na carta de João Paulo II às mulheres ele também fala de maternidade espiritual. E aí o Papa João Paulo II explica
como as religiosas, as freiras, como esposas de Cristo encontram-
No em cada pessoa, citando Marcos 25.
RR - Uma lição deste livro não será mostrar que amor não é a mesma coisa do que o sentimento do amor?
Pe. B. - Esse é um exemplo muito bom. Especialmente no mundo ocidental há uma confusão que amor é sentimento.
Sem reduzirmos o amor a sentimento isso é um erro. Certamente que os sentimentos têm uma parte no amor, mas quando não existe amor ou há apenas altos e baixos nas emoções isso mostra que o amor está na vontade. E foi esse o compromisso e fidelidade que ela mostrou heroicamente.
RR - Até que ponto a fé implica sempre a dúvida?
Pe. B. - Penso que para muitas pessoas. Mas temos que distinguir
que a experiência de escuridão da Madre Teresa não foi uma dúvida intelectual. Por isso dizemos dúvida como uma interrogação intelectual "Será que Deus existe mesmo?".
Não penso que na experiência da Madre Teresa existisse essa
dúvida intelectual. Era uma dificuldade de fé, o que é um
pouco diferente. Mas, ainda assim, podemos dizer de uma maneira geral que a dúvida faz parte da jornada. Nós somos treinados ou formados na infância na catequese. Depois
desenvolvemos uma fé madura e muitas vezes deparamo-nos com certas dúvidas ou interrogações onde a minha imagem de Deus ou que penso Dele está a mudar e na verdade Deus não é exactamente o que eu pensava que era. E isso é um
pouco diferente.

RRP1, 10-3-2008
 
"Madre Teresa tinha o desejo de ser santa"

JOÃO CÉU E SILVA

A tradução das cartas polémicas permite compreender crises de fé
A canonização de madre Teresa de Calcutá aguarda por um milagre reconhecido para o processo poder prosseguir mas, enquanto não acontece, o padre Brian Kolodiejchuck percorre o mundo a divulgar o livro que coordenou e no qual a futura "santa" comenta as "crises" de fé.

O padre discorda desta interpretação e acusa a revista Time de ter feito uma leitura de Vem, Sê a Minha Luz - Os Escritos Privados da "Santa de Calcutá" que não é correcta e, de passagem por Portugal para promover o volume que reúne parte das cartas escritas pela madre, nega que a freira tenha alguma vez duvidado da existência de Deus. O que aconteceu foi que "teve uma revelação e depois perdeu o contacto". O postulador da "santa" considera que madre Teresa nunca duvidou da existência de Jesus, porque "para isso é necessário duvidar a nível intelectual de Deus e tal não aconteceu. A dado momento sentiu-se desorientada, refere-o numa carta, mas logo a seguir pedia desculpa a Jesus e confessava que não gostava dos seus sentimentos".

Questionado sobre se madre Teresa acreditava em vida que era santa, o padre Kolodiejchuck refere que "ela tinha o desejo de o ser e quando lhe perguntavam como se sentia respondia que não era nada de extraordinário porque a santidade está ao alcance de todos". Acrescenta que madre Teresa "dizia frequentemente que desejava essa graça de Jesus, ser santa, mas também afirmava que queria dar santos à Igreja". Confessa que pensa que a freira "acreditava que iria ser canonizada. As suas cartas mostram os aspectos profundos dessa santidade, e mesmo na Igreja se, ao princípio, achavam que era apenas uma pessoa boa, depois mudaram de opinião".

Quanto às cartas que compõem este livro não perfazerem a totalidade das que escreveu, o padre Brian diz que dariam para mais um livro igual mas que "estão aqui todas as que temos sobre o período da escuridão", ou seja, a parte da sua vida em que "Jesus não lhe enviou qualquer sinal sobre o seu trabalho, facto que lhe provocou imensa dor, pois tinha tido de Cristo a revelação da vocação." Quando chegou à Índia, "escreveu cartas comovedoras, que eram uma ajuda psicológica, tal como aconteceu a Teresa D'Ávila, porque também não revelava a sua experiência, nem falava na vida interior privada e do passado familiar. O foco que pretendia era no seu trabalho".

A particularidade de a madre Teresa se referir sempre a Jesus em vez de a Deus é explicada por ser "cristocêntrica. Jesus é o foco principal e, apesar de não existir explicitação da Santíssima Trindade, ela não a ignora. Está apaixonada por Jesus, a quem se ofereceu desde criança, diz que Jesus é o seu primeiro amor e estará concentrada n'Ele". Esta é, diz, situação muito frequente entre as freiras, "decidir ser esposa de Jesus crucificado".

DN, 15-3-2008
 
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