06 outubro, 2007

 

6 de Outubro


Dia mundial dos cuidados paliativos




http://www.youtube.com/watch?v=MT089QPv2Bc
http://www.youtube.com/watch?v=wTKBQS1d4hU


http://www.amara.pt/

http://www.apcp.com.pt/

http://www.alexandracaracol.com/ficheiros/cuidadospaliativosetanatologia.pdf

http://eutanasia.no.sapo.pt/cuidadospaliativos.htm

Comments:
Apoio na chegada da morte quadruplica

RITA CARVALHO

Os cuidados paliativos dispararam num ano. De uma realidade de pouco mais de 20 camas de internamento, uma equipa intra-hospitalar e duas domiciliárias, passaremos, em 2007, para 85 camas (quatro vezes mais), 18 núcleos nos hospitais e 11 em casa. Mas ajudar os doentes a morrer melhor, aliviando-lhes a dor com terapêuticas e palavras de alento, implica outro paradigma de cuidados de saúde. Que acarreta mudanças lentas.

"É um novo paradigma que está a ser lançado. A abordagem das equipas nos hospitais é nova. Não queremos criar locais de morte mas uma rede multifuncional com equipas que dão apoio nos hospitais, em regime de ambulatório, e em casa", afirmou ao DN Inês Guerreiro, coordenadora da unidade de missão para os cuidados continuados integrados. No fim desta linha estão os doentes terminais, aqueles que, com doenças incuráveis, precisam de ser apoiados física e psicologicamente na caminhada dolorosa e de degradação até à morte.

A rede tem um ano e a oferta não chega para a procura, colocando as pessoas em esperas cuja resposta, às vezes, não chega em tempo útil. A nova tipologia das equipas intra-hospitalares permite abordar os doentes em situação de descontrolo da sua doença e, posteriormente, fazer o seu acompanhamento por telefone ou em regime de ambulatório. Quando o doente tem alta de internamento, a equipa contacta ainda o centro de saúde para que o caso seja monitorizado, passando-lhe formação específica.

Nos hospitais, a equipa de paliativos avalia problemas físicos, bem-estar psicológico e necessidades de apoio social e emocional, explica Filipa Tavares, médica da equipa do Santa Maria. A intervenção destinada a controlar sintomas - dores ou vómitos - é à base de opióides, como a morfina, e traça-se em conjunto com o médico assistente. "Ajustamos a terapêutica à dor específica de cada doente", diz a enfermeira Emília Fradique.

Mas não basta prescrever e voltar 15 dias depois, "é preciso avaliar e a reajustar a terapêutica", acrescenta a enfermeira Amélia Matos. A assistência social consiste na coordenação das ajudas disponíveis, e o apoio psicológico na preparação do doente e da família para o futuro. E o doente deve saber que vai morrer? "Só se quiser", afirma a médica. Para apurar o nível de informação que têm - pois muitos não têm noção da gravidade da doença -, vão-se dando "tiros de aviso".

Uma doente especial

A página do livro em que se registam palavras de despedida aos doentes que já partiram permanece vazia. Nenhuma das técnicas ganhou ainda coragem para lá expressar o carinho por Maria, a doente a quem, durante cinco meses, tentaram aliviar o sofrimento com uma terapêutica mais ajustada e gestos de alento. Para esta equipa, era uma doente especial.

Maria não se chamava Maria. Mas o nome fictício permite contar a história de uma senhora com pouco mais de 50 anos, doença oncológica diagnosticada em avanço rápido, acompanhada desde Março. "Quando morre um doente é sempre uma grande perda para a equipa", confessa Filipa Tavares. Mas o dever da missão cumprida e a certeza de que algumas atitudes contribuíram para que a partida fosse mais tranquila servem de consolo.

Nas conferências familiares promovidas pela equipa sentaram-se à mesa entes queridos em tensão e traçaram-se estratégias consensuais. "Ela era a conciliadora da família e sofria por pensar que estava a perder esse papel e que ia deixar a família com relações complicadas", explica a médica. Depois de reconciliada com as partes em conflito, de serenar marido e filhas, viu a doença degradá-la mas apercebeu-se de que já podia morrer descansada, recordam.

No meio da dor, Maria conservava a esperança. Não na cura, mas na possibilidade de aproveitar bem o tempo que lhe restava. Amélia resume-a assim: "Era alguém que queria ter vida durante a vida que ainda tinha." Pelo contrário, os que se abandonam à doença decaem com maior rapidez. Apesar de não ser científico, a equipa avança a teoria: "As pessoas conseguem ter algum controlo sobre o momento em que morrem..."

DN, 6-10-2007
 
Cem mil por ano precisam de cuidados paliativos

RITA CARVALHO

A Associação Portuguesa dos Cuidados Paliativos saúda com satisfação a intenção do Governo de apostar na prestação destes cuidados especializados aos doentes em fim de vida. Mas reage com cautela aos objectivos fixados para a criação de unidades e equipas específicas, temendo que tal possa pôr em causa a qualidade e o rigor de um serviço do qual necessitam 100 mil pessoas por ano.

"Há condicionantes que podem falsear este entusiasmo. E deixamos este alerta, pois não se pode comprometer a qualidade do serviço prestado aos doentes numa área tão exigente", afirmou ontem ao DN, no dia Mundial dos Cuidados Paliativos, Isabel Galriça Neto, presidente da associação e uma das principais impulsionadoras destes cuidados no País.

É preciso criar condições para os profissionais desempenharem bem a sua missão. O que passa pela criação de postos de emprego estáveis, bem remunerados, com uma formação e um horário adequados. Não basta dizer que se abre uma equipa intra-hospitalar e depois constatar que esta tem apenas um médico, que ainda faz bancos, e está disponível poucas horas durante uma semana. E que quando vai de férias, não é sequer substituído, afirma a médica.

A associação alerta ainda para a formação especializada avançada que devem possuir estes profissionais, lembrando que esta área da medicina - apesar de em Portugal não ser reconhecida como especialidade - tem de ser encarada com os mesmos critérios de qualidade de outra qualquer. "São cuidados técnicos altamente diferenciados que requerem um enorme investimento", afirma Isabel Neto, desmistificando a ideia de que estes são cuidados para ajudar as pessoas a morrer.

O objectivo é, pelo contrário, ajudar as pessoas a viverem bem até ao fim, explica a médica, contrariando a classificação das unidades de internamento como uma espécie de antecâmaras de morte.

O acesso aos fármacos (opiáceos como a morfina) e o seu manuseamento são outras condicionantes do apoio aos doentes com situações crónicas evolutivas que preocupam a associação. "Se já é difícil ter acesso a estes fármacos como vamos trabalhar?", questiona a especialista, lembrando que a sua aquisição não é generalizada a todas as unidades.

Combater as reticências existentes fora e dentro da comunidade médica em relação a estes cuidados é um objectivo no qual a associação quer continuar a apostar. "Ainda há a noção de que os médicos têm apenas a obrigação de curar os doentes e que, quando não o fazem, estão a falhar", considera Isabel Neto. Mas os "mitos" não se ficam por aqui: "Ainda se pensa que os paliativos são destinados aos moribundos e que são cuidados menores." É esta mentalidade, diz, que é preciso inverter.

DN, 7-10-2007
 
50% dos idosos admitem prática da eutanásia

Estudo foi feito por um grupo da Faculdade de Medicina do Porto

Uma grande percentagem das pessoas idosas institucionalizadas, mesmo não sofrendo de doenças crónicas ou terminais, pensa frequentemente na morte e cerca de 50% ad- mite a legalização da eutanásia. A conclusão é de um estudo realizado pelo Serviço de Biomédica e Ética Médica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

Os dados apontam ainda para uma percentagem muito significativa de pessoas dispostas a aceitar o suicídio assistido. Uma atitude que pode decorrer de sentimentos de solidão e abandono dos idosos que se encontram em instituições.

O objectivo do estudo, que foi coordenado por Rui Nunes, director do serviço de Bioética da Faculdade de Medicina do Porto e presidente da Associação Portuguesa de Bioética, foi identificar a opinião dos portugueses com mais de 65 anos e sem doença terminal, sobre a eutanásia.

Foram inquiridos 815 idosos institucionalizados em lares e residências de terceira idade no País, incluindo da Madeira e dos Açores e, segundo o responsável da investigação, a ideia era fazer uma análise sociológica e avaliação ética sobre a questão da eutanásia, bem como uma reflexão sobre as estratégias mais adequadas para prevenir a sua ocorrência.

O facto de os inquiridos terem mais de 65 anos explica-se por ser "a faixa etária que está mais predisposta a pensar na morte", explicou Rui Nunes. Os dados preliminares mostram a existência de uma percentagem muito significativa de pessoas dispostas a aceitar o suicídio assistido. "Falta perceber se isso reflecte uma vontade firme ou se é o resultado da solidão e do abandono que os leva a pensar na morte", sublinhou.

No caso de a segunda hipótese se confirmar, Rui Nunes defende a necessidade de se "repensar a sociedade para que estes pedidos ocorram no menor número possível". Uma estratégia "que deverá incluir redes de cuidados paliativos e de cuidados continuados eficazes, mas que está ainda muito longe de ser implementada em Portugal", lamentou.

Estes dados serão debatidos no Congresso Nacional de Bioética, que se realiza na próxima sexta-feira, na Aula Magna da Faculdade de Medicina do Porto. LUSA

DN, 14-10-2007
 
Médicos defendem 'eutanásia' consentida

ALFREDO MENDES

Pela primeira vez em Portugal foi ontem apresentada e amplamente debatida a suspensão e abstenção de tratamento em doentes terminais. A partir de um documento apresentado pelo Serviço de Bioética e Ética Médica da Faculdade de Medicina do Porto, os especialistas falaram da "hospitalização da morte", longe da família e dos avanços científicos e tecnológicos. O próximo passo será enviar a proposta aos partidos na Assembleia da República.

Rui Nunes, da Faculdade de Medicina do Porto, apresentou numa conferência no Porto as linhas de orientação sobre suspensão e abstenção de tratamento em doentes terminais, que "deve ser efectuada envolvendo activamente o paciente no processo de decisão". Nomeadamente, acrescenta o texto em discussão pública (www.apbioetica.org), "através da obtenção de consentimento informado, livre e esclarecido".

Com a ressalva de que nenhum tratamento deve ser imposto coercivamente, houve consenso de que os clínicos não deverão ministrar tratamentos desproporcionados, ou seja, "um tratamento fútil", aquele que nunca alcançará o seu objectivo, tornando-se uma má prática médica e profundamente onerosa.

Trata-se, reconheceram os especialistas presentes no encontro, de uma matéria complexa, "até porque o doente aceita o valor da vida e o médico a qualidade de vida".

No caso dos pacientes menores ou inconscientes, consideraram vital dar voz aos jovens (a partir dos dez ou 12 anos, por exemplo), sendo crucial, quanto aos adultos, auscultar a família, ou, na sua ausência, os amigos.

"Quando a vida não faz sentido", os participantes mencionaram a ordem para não reanimar. De contrário, defenderam, prolongar-se-ia o processo de morrer. Impõe-se, porém, uma decisão fundamentada e uma definição padronizada, como aconteceu com o conceito de morte cerebral. Neste caso, a suspensão aplicar-se-ia quando o doente se encontrasse numa situação irreversivelmente terminal e a morte estivesse iminente. Também aqui subsiste um vazio legal.

Teresa Brandão, do Amadora- -Sintra, Paulo Maia, do Hospital de Santo António, no Porto, e Vítor Veloso, presidente da Liga Portuguesa contra o Cancro, preconizaram uma ampla informação entre paciente e família, o primado do doente, contemplando a dignidade à autonomia. Pretende-se "a morte humana", com base num largo consenso.

DN, 12-1-2008
 
O TESTAMENTO VITAL. QUE LEGISLAÇÃO?

Rui Nunes
professor catedrático da
Faculdade de Medicina do Porto

A fase final da vida suscita desde sempre inúmeras dúvidas de natureza existencial, sobretudo quando existe a possibilidade de intervir medicamente para aliviar a dor e o sofrimento.

Por outro lado, a evolução da medicina originou a possibilidade de prolongar a existência humana para além daquilo que é razoável, pelo que importa estabelecer critérios claros para uma boa prática médica. O estabelecimento destes critérios deve ser o mais consensual possível para impedir disparidades socialmente inaceitáveis na suspensão ou abstenção de tratamento em doentes terminais.

Note-se que existe uma distinção conceptual importante entre eutanásia e suspensão de meios fúteis ou desproporcionados de tratamento. Se a primeira se refere à morte de alguém, a seu pedido, com a intervenção directa de um médico, a abstenção de meios desproporcionados de tratamento - sendo o caso mais frequente a não reanimação cardiopulmonar em doentes terminais - é hoje considerada como boa prática clínica pelas mais prestigiadas organizações médicas.

Isto é, ainda que a eutanásia seja inaceitável para largos segmentos da população, evitar a obstinação terapêutica - também designada por distanásia - é considerado como um imperativo fundamental da prática médica.

Neste contexto, e para evitar a utilização abusiva de tratamentos fúteis, defende-se hoje que a vontade do doente previamente manifestada deve ser respeitada. Nomeadamente, a recusa de meios de tratamento que degradam objectivamente a sua qualidade de vida.

Assim, a legalização do testamento vital deve ser considerada como um importante marco civilizacional. Em Portugal, tal como aconteceu em Espanha há cinco anos, a legalização do testamento vital seria um importante vector de afirmação dos direitos individuais, reforçando o sentimento de independência face a intervenções médicas não desejadas.

DN, 19-1-2008
 
Estudo vai avaliar opinião dos doentes terminais sobre eutanásia

RUTE ARAÚJO

É o terceiro estudo sobre eutanásia realizado pelo Serviço de Bioética e Ética Médica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e vai avançar nas próximas semanas. Depois de ser avaliada a opinião de médicos oncologistas e de idosos internados em lares, será agora feito um inquérito para perceber a opinião dos doentes terminais sobre a morte voluntária e o suicídio assistido. O presidente do serviço, Rui Nunes, admite que a amostra terá que ser escolhida com "particular cautela", porque eticamente é difícil de executar.

Num momento em que o Luxemburgo acaba de aprovar a legalização da eutanásia e suicídio assistido. Rui Nunes acredita que esta discussão não tardará a ocorrer também no País. "É um enfeito dominó. Quando a Holanda aprovou a legislação havia muito medo das consequências. Mas, com cada vez mais países a juntarem-se, acredito que esta discussão surgirá muito mais cedo do que as pessoas possam pensar." E acrescenta que, "provavelmente na próxima década, é inevitável que a discussão em Portugal evolua para a questão do sim ou não à legalização".

Opinião diferente tem Paula Martinho da Silva. A presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) diz que a questão está sempre presente do ponto de vista da discussão, até porque se relaciona com temas já abordados como os aspectos éticos dos cuidados de saúde relacionados com o fim da vida ou o estado vegetativo persistente (ambos alvo de pareceres do CNECV). No primeiro parecer, de 1995, o conselho entendeu que a eutanásia activa "é uma decisão médica inaceitável porque o médico, por compaixão real ou suposta, arroga-se o direito de dispor da vida de uma pessoa humana; e não tem esse direito na perspectiva ética em que se fundamenta esta análise".

Paula Martinho da Silva duvida que a eutanásia "seja alvo de discussão legislativa nos próximos tempos, até porque não é prioritária", afirma. A CNECV também não tem previsto nenhum documento especificamente sobre o tema nem houve pedidos de parecer. Por isso, não será alvo de discussão dentro do organismo nos próximos tempos.

Como opinião pessoal, considera a aposta deve passar por outras medidas. "Era preferível implementar os cuidados paliativos em todo o País" e, do ponto de vista legislativo, abordar a a possibilidade de um doente poder recusar tratamentos, ou intervenções excessivas quando estas já não têm como objectivo final a cura nem a melhoria da qualidade de vida. Até porque, considera a advogada, estas situações colocam-se mais vezes do que a da eutanásia ou do suicídio assistido.

O tema do fim da vida foi também aflorado durante a campanha para as eleições do bastonário da Ordem dos Médicos. A posição do actual bastonário Pedro Nunes é contra a eutanásia, porque o médico entende que esta contraria o princípio ético principal dos médicos que é a defesa da vida. O bastonário defende que a discussão dentro da classe deve ser sempre no sentido de identificar e estabelecer o momento em que a vida se inicia e que termina.

DN, 22-2-2008
 
A mulher que decidiu morrer à margem da lei

JOSÉ MIGUEL SARDO, Paris

Dias antes de morrer, Chantal Sébire apelara à revisão da lei francesa para permitir excepções à proibição da eutanásia. Agora, vozes no Governo e na oposição pedem uma comissão para analisar os casos graves.

É a segunda vez em quatro anos que a França debate a eutanásia. Em 2003, Vincent Humbert abalara o país. Tetraplégico, surdo, mudo e quase cego após um acidente, o bombeiro de 22 anos e a mãe, Marie, escreviam em 2000 ao presidente Chirac para autorizar os médicos a desligarem a sonda que o mantinha vivo.

Face à recusa, Marie violou a lei em finais de 2003. No terceiro aniversário do acidente, injectou uma dose de barbitúricos no tubo de soro. A dose não seria fatal e coube aos médicos, dias mais tarde, retirar a sonda gástrica a Vincent. A justiça absolveu a mãe e o médico em 2006, após mobilização sem precedentes a favor da "excepção à interdição de eutanásia", que incluiria o actual chefe da diplomacia, Bernard Kouchner.

No calor do debate, o Parlamento aprovaria a actual lei, intitulada Leonetti, prevendo o direito a "deixar morrer", por sedação forte acompanhada do corte da alimentação e hidratação do doente em fase terminal, mas sem legalizar a "eutanásia activa", com intervenção directa do médico. O novo texto deixou situações de fora, como a de Chantal Sébire. Desfigurada por um tumor raro e alérgica à morfina, a ex-professora pedira o direito ao "suicídio assistido" em casa, por ingestão do analgésico Penthotal, autorizada na Holanda, Bélgica e Suíça.

O agravamento da saúde de Chantal não lhe permitiu estar presente na segunda-feira quando a justiça rejeitou o pedido de "eutanásia activa". O médico Emmanuel Debost, que se disponibilizou a acompanhar a morte de Chantal, fora recebido na quarta-feira no Eliseu, horas antes da morte da doente.

Agora, os autores da lei Leonetti pedem uma revisão. No Le Figaro, Gaëtan Gorce, deputado socialista e ex-presidente da comissão parlamentar sobre a eutanásia, afirmou ser necessário "sair da hipocrisia", defendendo criação de uma alta autoridade para os casos mais graves. Em entrevista a uma rádio, Nadine Morano, secretária de Estado da Família, reconheceu que a actual lei "só responde a 99% dos casos". No entanto, a ministra da Saúde, Roselyne Bachelot, recusa a legalização da eutanásia, afirmando que é preciso antes de mais melhorar "os cuidados paliativos a doentes terminais". Como milhares de pacientes com doença terminal, em França, Chantal pertencia à associação para o direito a morrer com dignidade (ADMD), que conta com 43 mil membros. Uma das fundadoras, Mireille Jospin, mãe do ex-primeiro-ministro Lionel Jospin e antiga enfermeira, morreu em 2002, aos 92 anos, recorrendo ao "suicídio assistido". O presidente da ADMD apelou às autoridades, "para que se inspirem na legislação dos países vizinhos". Por ano, são dezenas os franceses que se deslocam à Suíça ou à Bélgica para uma viagem, sem regresso, para morrer na legalidade.

DN, 21-3-2008
 
Quem se lembra do funeral de Luiz Pacheco

sabe do espaço que a Igreja Católica ainda ocupa no momento da morte. Mesmo ele, que toda a vida foi um iconoclasta, blasfemo à luz dos cânones católicos, que viveu sem Deus, teve um funeral católico. E mesmo o mais empedernido ateu sente essa solenidade que só um funeral católico parece dar. Outros países, onde a diversidade religiosa é maior, como os Estados Unidos, já resolveram a questão, dando um tom "civil" ao momento da morte, com capelas mortuárias que são de agências funerárias e não da igreja.

Na Páscoa, que é a marca da morte e da ressurreição nas igrejas cristãs, os seus representantes falam sobre o assunto. Como aconteceu ontem, com o patriarca a aconselhar que se aceite a morte como natural, não tendo medo dela.

Vem isto a propósito do debate que, lentamente, se começa a levantar sobre o direito de morrer. Talvez a forte influência da igreja neste campo tenha atrasado a discussão sobre a eutanásia. Ontem, o próprio bastonário da Ordem dos Médicos veio de novo rejeitá-la, à luz do código ético, tal como já fez no aborto.

Esta semana, o escritor belga Hugo Claus, doente de Alzheimer, morreu por eutanásia na Bélgica, um dos poucos países que o permitem. Já uma francesa com a cara completamente deformada matou-se em França, onde a eutanásia não é permitida. Dois casos suficientemente importantes para nos fazerem voltar a reflectir sobre o direito à morte.

DN, 24-3-2008
 
Idoso suicida-se depois de matar a mulher doente

ALFREDO TEIXEIRA

Porto. Casal septuagenário vivia sozinho num condomínio fechado de luxo na zona da Foz e tinha apenas como companhia a cadela. Perante a doença e sofrimento da mulher, o antigo militar disparou sobre ela, pondo depois termo à vida. Foi a empregada que ontem encontrou os corpos no quarto

Luís quis acabar com o sofrimento da mulher Maria

Um casal de idosos foi encontrado ontem de manhã morto no andar onde vivia, um condomínio de luxo, na zona da Foz do Porto. As autoridades suspeitam que o marido terá morto a tiro a mulher e suicidou-se. Plano que terá sido arquitectado por ambos os septuagenários, uma vez que a mulher estava doente. Para não a ver sofrer, o marido, antigo oficial do Exército, consumou o acto. "Quando se gosta de uma pessoa, gosta-se mesmo!", disseram-nos no edifício Montebelo.

Luís e Rosa Maria Almeida, professora catedrática reformada, eram um casal que se dava bem. Essa é a impressão de vizinhos e funcionários do condomínio fechado, localizado na Rua do Carvalho. "Não faltava dinheiro nem a eles nem a qualquer outros dos moradores que residem nos 19 apartamentos do edifício, todos da classe alta", disse uma das empregadas de limpeza que andam pelo edifício a cuidar dele ou a passear as crianças ou os cães. Para além dos porteiros há também os motoristas. "Desde há três meses que a senhora estava muito debilitada por uma doença", diz outro funcionário. Os filhos "raramente os visitavam" e a companhia dos idosos passava em exclusivo pela cadelita Teté.

"Nas últimas semanas não eram as mesma pessoas. Sobretudo ele, que andava mais cá fora. Não se via alegria naquele homem", refere um vizinho. Ao contrário do que acontecia anteriormente. "Era o morador que melhor gratificava os funcionários do prédio e por alturas do Natal deixava sempre na portaria à volta de 500 euros", diz um dos porteiros. Fonte do prédio revelou também, ao DN, que há moradores que, por ano, pagam um condomínio à volta dos dez mil euros.

O casal tinha duas empregadas. E o Dia de Portugal, feriado, acabou por ter um desfecho trágico. Os idosos dispensaram uma delas, a mesma que ontem os encontrou mortos no quarto, com uma carta de despedida ao lado. Para além da PSP, no local estiveram elementos da Brigada de Homicídios da Polícia Judiciária. Os corpos foram depois removidos e transportados para o Instituto de Medicina Legal pelos Bombeiros de Pedrouços.

DN, 12-6-2008
 
Ex-político alemão mostra como ajudou a morrer

PATRÍCIA VIEGAS

Bettina S, de 79 anos, receava o lar e quis pôr fim à vida

Roger Kusch quer quebrar a todo o custo o tabu da eutanásia

Ao longo de muitos anos a eutanásia foi um tabu na Alemanha por causa do programa dos nazis, que visou milhares de mulheres e crianças, consideradas como deficientes ou como mentalmente doentes. Mas o ex-ministro da Justiça do estado federado de Hamburgo, Roger Kusch, parece disposto a tudo para quebrá-lo.

Após ter inventado e apresentado uma máquina para a eutanásia, apareceu agora perante a imprensa para confessar que ajudou uma mulher de 79 anos, Bettina S, a morrer. Juiz, antigo conselheiro dos chanceleres Helmut Kohl e Gerhard Schroeder, segundo escreveu ontem o Times, Kusch tem contornado as lacunas da legislação alemã e tomado todos os cuidados para não ser preso.

No mês de Abril apresentou uma versão modificada do aparelho utilizado para injectar medicamentos nos pacientes por um longo período: acrescentou um botão que permitia aos doentes terminais controlarem o próprio equipamento e tomarem uma dose de anestésico e uma quantidade letal de cloreto de potássio.

Agora, três meses depois, não só não usou a sua máquina de eutanásia para ajudar Bettina S a morrer, como ela não era doente terminal. O máximo que tinha eram diabetes e dores provocadas pelo reumático. Apenas não queria ir para um lar e, então, decidiu que queria morrer com a ajuda do ex-ministro de Hamburgo.

Ambos decidiram fazer do suicídio de Bettina S um modelo para os que querem morrer e para obrigar o Governo alemão a mudar as leis. No sábado passado, pela manhã, ele foi ao seu apartamento, em Wurzburg, tendo a mulher preparado uma mistura de medicamentos que ela obtivera no hospital onde trabalhara. A seguir, ele deixou a casa, tendo voltado três horas mais tarde. Nessa altura ela já estava morta.

Kusch não participou nem lhe arranjou os medicamentos. Nem pode ser acusado de não ter prestado assistência porque não estava lá. Filmou tudo para apoiar a sua versão. Os críticos do ex-político democrata-cristão, o partido de Merkel, dizem que ele não deu alternativas a Bettina S nem procurou ajudá-la a esclarecer as suas dúvidas. Mas ele defende-se e diz que só quer evitar que mais alemães vão morrer à Suíça.

DN, 3-7-2008
 
Enviar um comentário



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?