12 novembro, 2007

 

Colunistas

Novos e velhos...

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NOVA OPINIÃO NA IMPRENSA PORTUGUESA

FERNANDO MADAÍL

A primeira geração que apenas conheceu a liberdade e a democracia, influenciada pela escrita e pela atitude do semanário Independente e da revista Kapa, treinada no registo curto e incisivo dos blogues, está a mudar o estilo da opinião na Imprensa portuguesa. Quatro dos colunistas trintões que têm imposto o seu nome nos últimos tempos explicam ao DN o que caracteriza a nova abordagem geracional.

João Miguel Tavares, com 34 anos e um espaço no DN que mantém desde 2003 (apesar de ser, actualmente, director adjunto da Time Out Lisboa), obtém a concordância dos seus parceiros de conversa quando diz que há dois elementos fundamentais: "textos curtos e com humor e um estilo mais anglo-saxónico" - que contrasta com a anterior tradição mais francófona.

Representante da geração de 70 (do século XX, não do século XIX, que tinha Antero e Eça), João Miguel Tavares afirma que, para quem cresceu habituado ao ritmo da linguagem televisiva e à permanente surpresa da publicidade, "a chatice é imperdoável, o tédio é insuportável".

Estreando-se na opinião política no mesmo ano e no mesmo jornal que João Miguel Tavares, embora já fizesse crítica literária e tenha entretanto mudado do DN para o Público, Pedro Mexia também destaca o facto do aparecimento das televisões privadas ter acabado com a velha noção "do respeitinho institucional da RTP".

Presença semanal no programa O Eixo do Mal (Sic Notícias) e com coluna no Expresso, Daniel Oliveira, de 38 anos, considera que a sua geração, "mais descomprometida e menos reverente", é também "mais ideológica do que a imediatamente anterior" e assume uma linguagem agressiva.

Vindo directamente da blogosfera para se estrear na imprensa escrita logo na última página do Público, onde alterna com Helena Matos um espaço que deveria ser de polémica, Rui Tavares, de 35 anos, reforça esta ideia. "A dureza nos textos é agora mais esperada pelos leitores e isso é uma coisa boa. As diferenças de opinião passaram a ser assumidas."

"A opinião é agora mais aberta, mais franca e até mais bem preparada", não hesita em proclamar Rui Tavares, destacando a generalizada "melhoria da qualidade do debate, mesmo ao nível da erudição e do rigor."

Neste momento, reforça Rui Tavares, com a Internet, "há 10 mil ou 20 mil pessoas a escrever ao mesmo tempo sobre determinado tema". E, além de estabelecer um paralelo entre este número e o das antigas tertúlias e academias, enaltece sobretudo "o grau de exigência" do debate actual, com intervenientes e espectadores que conhecem muito bem os assuntos que estão ali a ser discutidos.

Mas, no fundo, como reconhecem os quatro, o estilo é tão importante - Pedro Mexia admite que é "um adepto do estilo" e Daniel Oliveira assume-se como "um escravo do estilo" - que são capazes, de acordo com a explicação de João Miguel Tavares, de sacrificar uma boa ideia a um bom texto - embora Daniel Oliveira diga que, neste dilema, hesita na escolha.

A blogosfera é um dos factores que melhoraram a qualidade desta nova geração de opinion makers. Embora João Miguel Tavares considere que nem sempre a passagem dos blogues para os jornais se faz de forma perfeita, pois muitos rendem-se logo à respeitabilidade dos órgãos de comunicação social tradicionais, o universo cibernético foi fundamental para alargar o número de pessoas que se dedicam ao debate e a revelar as melhores.

Os blogues, sintetiza Pedro Mexia, "dão a oportunidade a esta geração de se exprimir". E, depois, como realça Daniel Oliveira, fazendo uma comparação com tempos idos, "as pessoas agora podem ser escolhidas para escrever nos jornais exclusivamente pelo seu próprio mérito", não por conhecimento pessoal ou por outro tipo de favorecimento.

Ainda há outros aspectos, embora já relacionados com a forma, que também têm origem no ciberespaço, nomeadamente algumas "técnicas que se aprenderam nos blogues", já que, explica Pedro Mexia, "os shots [usados, por exemplo, por Daniel Oliveira no Expresso] são, afinal, posts".

"No início, até havia alguma reacção de estranheza", recorda Daniel Oliveira. "É natural", completa Pedro Mexia, "porque este registo não existia enquanto género jornalístico". E, no entanto, adverte, "a única coisa má no texto curto é que puxa mais pelo lado agit-prop, o lado slogan, pelas frases que podem ser escolhidas para as colunas de citações dos jornais".

Ao vê-los concordar em quase tudo nem parece que dois são assumidamente de direita (Pedro Mexia e João Miguel Tavares) e dois claramente de esquerda (Daniel Oliveira e Rui Tavares). E, no entanto, ao contrário dos tempos do centrão ideológico e da procura de consensos, os actuais colunistas afirmam vincadamente as suas posições e assumem abertamente as suas divergências.

Enquanto tagarelam e a conversa vai percorrendo vários tópicos, Daniel Oliveira admite que há áreas onde não se arrisca a opinar, como a economia, e revela que telefona a outras pessoas para se inteirar de temas que domina menos. Pede informações "até sobre religião", exemplifica. "As tuas fontes, nessa matéria, são muito fraquinhas", graceja logo Pedro Mexia, numa cumplicidade geracional.

Afinal, mais do que o 25 de Abril e o PREC (processo revolucionário em curso, como se designou o período entre o 11 de Março e o 25 de Novembro de 1975), de que apenas Daniel Oliveira tem uma vaga ideia, esta geração é, como explica Rui Tavares, pós-queda do Muro de Berlim, "que baralhou as referências ideológicas", e pós-11 de Setembro, que, à maneira de um baralho de cartas, "as voltou a dar".

Quanto ao resto, como na outra geração de 70, o que importa é a forma de interpretar o "bom senso e o bom gosto". E, no dizer de Rui Tavares, de cultivar "o brio cronístico".

DN, 10-11-2007
 
Jovens colunistas demonstram que não eram a geração rasca

Nomes indispensáveis na Imprensa portuguesa? Nem a "santíssima trindade dos colunistas", como João Miguel Tavares se refere a Vasco Pulido Valente, José Pacheco Pereira e Miguel Sousa Tavares, para ele um conjunto de assinaturas incontornável, reúne consenso. Se Pedro Mexia reconhece que são os "três indiscutíveis", já Daniel Oliveira diz que nunca o surpreendem e Rui Tavares acrescenta que "a maior parte dos colunistas não estão a dizer nada de novo, alguns deles desde há uns dez anos".

"Há uma geração que manteve os jornais na mão nos últimos 30 anos", afirma Daniel Oliveira, "e ou a polémica é sempre a mesma ou já se zangaram todos". E, acrescenta João Miguel Tavares, ideologicamente estão sempre próximos do PS e do PSD. "O seu leit-motiv constante", ironiza Rui Tavares, "é que nunca há nada de novo." Daniel Oliveira ilustra: "Repetem que já ninguém vai ao teatro, já ninguém vai ao cinema, mas, como dizia o Hermínio Monteiro [fundador da Assírio & Alvim], se não houvesse jovens, ele não vendia poesia."

Rui Tavares procura esclarecer que "não se trata de uma questão de novos contra velhos, uma querela dos modernos contra os clássicos". Mas se prescindem de muitos nomes das gerações imediatamente anteriores - em jeito de contraste, Rui Tavares enaltece a importância dos intelectuais do pós-II Guerra Mundial, como António José Saraiva, Orlando Ribeiro, Jorge Dias ou Lindley Cintra -, em contrapartida lêem-se uns aos outros, numa evidente cumplicidade etária. "Há uma espécie de chauvinismo geracional que eu assumo", resume Pedro Mexia. Mas acrescenta, "numa nota de cepticismo", que se estiverem a escrever durante 30 anos também se tornarão "uns marretas".

Não podem perdoar à geração anterior o facto de ter inventado o conceito da "geração rasca", esse título de um editorial escrito por Vicente Jorge Silva no Público, em 1994, que perdurou. "Provavelmente", concordam os quatro, "não tinha razão e esta geração, afinal, não é nada rasca", como se poderá avaliar pelos textos que publicam nos principais jornais.

Estaremos, então, perante uma nova "ínclita geração", um grupo etário de excepção? Nada disso, asseguram. A geração seguinte, aposta Daniel Oliveira, lembrando que já cres- ceu com o acesso moderno a toda a informação, essa sim, será de elite.

De tal forma que, sentencia Rui Tavares, "não vamos poder fazer carreira de colunistas, como os que se dedicam a isso há 20, 30 ou 40 anos". Alegando que há cada vez mais pessoas com imensa qualidade a escrever na Net, onde é fácil ir recrutá-las, esta "geração não estará a escrever durante 30 anos; em cinco anos já terá sido substituída". Pedro Mexia, mesmo se considera que há um prazo limite para tudo - e evoca a limitação de mandatos dos políticos -, discorda desta "visão darwiniana" da sucessão das gerações de colunistas. A questão que fica é se algum deles integrará uma futura "santíssima trindade".

DN, 10-11-2007
 
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