12 novembro, 2007

 

Do jornalismo


a alguns jornalistas



http://pt.wikipedia.org/wiki/Jornalismo



http://dre.pt/pdf1sdip/2007/11/21300/0805208063.PDF

http://dre.pt/pdf1sdip/2007/12/24500/0897208972.PDF

Decreto-Lei n.º 70/2008, D.R. n.º 74, Série I de 2008-04-15
Presidência do Conselho de Ministros
Aprova a organização e o funcionamento da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista e regulamenta o sistema de acreditação e o regime de deveres e incompatibilidades profissionais dos jornalistas

Declaração de Rectificação n.º 32-B/2008, D.R. n.º 113, Série I, 2.º Suplemento de 2008-06-13
Presidência do Conselho de Ministros - Centro Jurídico
Rectifica o Decreto-Lei n.º 70/2008, de 15 de Abril, da Presidência do Conselho de Ministros, que aprova a organização e o funcionamento da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista e regulamenta o sistema de acreditação e o regime de deveres e incompatibilidades profissionais dos jornalistas, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 74, de 15 de Abril de 2008

Aviso n.º 23504/2008, D.R. n.º 180, Série II
Presidência do Conselho de Ministros - Secretaria-Geral
Aprova o regulamento disciplinar dos jornalistas

Comments:
Sindicato quer que TC fiscalize o estatuto

INÊS DAVID BASTOS

O Sindicato dos Jornalistas (SJ) vai pedir ao provedor de Justiça ou ao procurador-geral da República que requeiram ao Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva da constitucionalidade do Estatuto dos Jornalistas, que o Presidente da República acaba de promulgar. O diploma - aprovado no Parlamento apenas pelo PS e alvo de acérrima contestação da parte da classe e da oposição - foi ontem publicado em Diário da República. As mexidas no sigilo profissional, os direitos de autor e a atribuição à Comissão da Carteira dos poderes de fiscalizar e sancionar os jornalistas são os pontos do diploma mais contestados.

"Lamentamos que o Presidente da República não tenha sido sensível às advertências do sindicato, nomeadamente quanto às inconstitucionalidades demonstradas, até, pelo parecer que pedimos ao constitucionalista Jorge Miranda", reagiu ao DN o presidente do SJ, Alfredo Maia, garantindo que o organismo vai "usar todas as armas" ao seu dispor para "lutar contra" o Estatuto, que tinha sido vetado em Agosto por Cavaco Silva e alterado no Parlamento. Para já, Alfredo Maia quer que o Tribunal Constitucional (TC) se pronuncie sobre a constitucionalidade do diploma. Como este organismo não tem competência para se dirigir ao TC, vai fazer o pedido ao provedor de Justiça ou ao PGR. De acordo com o número 2 do artigo 281.º da Lei Fundamental, apenas o Presidente da República, o presidente do Parlamento, o primeiro-ministro, o provedor de Justiça, o PGR ou um décimo dos deputados podem requerer a fiscalização abstracta da constitucionalidade (já depois de uma lei ter sido promulgada e publicada). "Não é crível que se reúna a maioria necessária no Parlamento para requerer a fiscalização sucessiva", previu Alfredo Maia.

Outras formas de luta

Não é certo, contudo, que o pedido feito pelo SJ ao provedor ou ao PGR tenha seguimento para o TC, porque estes podem entender que não existe fundamento para pedir a fiscalização. Daí que, garantiu Alfredo Maia, "a luta" do sindicato não se ficará por esta iniciativa. "Há um conjunto de acções que estamos a preparar e que vão ser debatidas amanhã [hoje]", disse o presidente do SJ, escusando-se a especificar. O sindicato tinha pedido a Cavaco que não promulgasse o diploma, alertando com um parecer de Jorge Miranda, onde este afirmava existir inconstitucionalidades ao nível dos direitos de autor.

Ainda antes do envio do primeiro diploma para Belém foi criado o Movimento Informação é Liberdade (MIL), composto por mais de 700 jornalistas, que tinham como porta-voz Mário Bettencourt Resendes, que pediu a Cavaco a não promulgação do Estatuto, por considerar que o diploma encerrava um ataque à liberdade de imprensa. O diploma viria de facto a ser vetado e enviado à Assembleia da República para correcção. O MIL considerou, então, que as alterações feitas tornaram o diploma "menos gravoso" para os jornalistas.

Feitas as alterações, o Estatuto dos Jornalistas foi aprovado em Setembro (com toda a oposição contra) e enviado a Cavaco Silva, que, desta vez, o promulgou.|

DN, 7-11-2007
 
IRAQUE É O PAÍS MAIS MORTÍFERO

MARIA JOÃO ESPADINHA

Mais de 2600 'sites' foram fechados

O risco de ser repórter em territórios em conflito é cada vez maior. Prova disso são os números apresentados esta semana pela Repórteres Sem Fronteiras (RSF) - pelo menos 86 jornalistas foram mortos por causa do seu trabalho em todo o mundo, em 2007.

Segundo esta organização francesa, que se dedica à denúncia de quebras da liberdade de expressão destes profissionais em todo o mundo, o número é o maior desde 1994, quando muitos jornalistas morreram durante o genocídio de Ruanda. Trata-se de um aumento de 244% nos últimos cinco anos, acrescenta. Quanto a colaboradores do sector, o número de mortes desceu de 32, em 2006, para 30, em 2007.

O Iraque foi o país com o maior número de mortes de jornalistas no ano passado, com 47 profissionais do sector a perderem a vida devido ao conflito existente no país. Com excepção de um repórter russo, todos os jornalistas que morreram no Iraque eram iraquianos. A RSF afirma que o Governo do país tem demonstrado uma inércia alarmante e que a única medida até agora tomada foi permitir que os jornalistas andem armados, para sua defesa.

"Em nenhum outro país houve tantos jornalistas mortos como no Iraque, com, pelo menos, 207 trabalhadores da imprensa mortos desde a invasão americana, em Março de 2003 - mais do que na Guerra do Vietname, nos combates na antiga Jugoslávia e nos massacres da Argélia e de Ruanda", afirma a organização no relatório. "As autoridades iraquianas e norte-americanas - elas próprias culpadas de sérios ataques contra jornalistas - têm de tomar atitudes firmes e pôr um fim nesta violência. Os jornalistas iraquianos são deliberadamente marcados por grupos armados e não são simplesmente vítimas de balas perdidas", acrescenta.

A Somália e o Paquistão são os países que registam mais mortos depois do Iraque, oito e seis, respectivamente. "A Somália e o Paquistão registaram mais jornalistas mortos em 2007 do que nos últimos anos. A Somália é ainda um país sem leis, onde o mais forte lidera e os media são alvos fáceis. Já no Paquistão, os jornalistas são 'apanhados' no fogo cruzado entre o exército, os militantes islâmicos e os gangs. A única boa notícia deste ano é que, pela primeira vez em 15 anos, não morreu nenhum jornalista da Colômbia devido ao seu trabalho", conclui a RSF.

Esta semana foi também divulgado um relatório da Federação Internacional de Jornalistas (FIJ), com números diferentes. Segundo este documento, morreram 177 profissionais, menos que em 2006. A diferença entre os dois relatórios está nos critérios, pois a FIJ inclui todos os trabalhadores do sector (não só jornalistas) como todas as causas de morte.

2600 sites fechados

A repressão também chegou à Internet. Foram encerrados, pelo menos, 2676 sites, na sua maioria fóruns de discussão. "A censura mais forte ocorreu antes e durante o 17.º congresso do Partido Comunista chinês", durante o qual 2500 sites, blogues e fóruns foram interditos em apenas poucas semanas.

DN, 5-1-2008
 
O VALOR DA INFORMAÇÃO

João Marcelino

Como confirmar que em Portugal se vive com uma segurança de fazer inveja, mesmo no contexto europeu? Pelos números da estatística, claro. Mas podemos, ainda, fazer essa descoberta pelo conhecimento do mundo. Quem tem o privilégio de poder viajar sabe que isto é verdade. E mesmo quem gosta de se mortificar na leitura de jornais capazes de manter a fotografia de uma vítima de homicídio dias e dias a fio na primeira página, ou de classificar o mundo pela abertura dos telejornais, deveria saber comparar. No cabo estão lá os canais e os programas suficientes para nos permitir comprovar como a sociedade portuguesa vive uma situação apesar de tudo excepcional, sem os piores problemas da criminalidade organizada ou da imigração selvagem. Ajuda-nos neste caso a periferia que em quase tudo o resto nos aflige.

Mas como se diz isso a quem vive nos bairros periféricos onde ainda assim o dia-a-dia é marcado pelo sobressalto permanente?

E, acima de tudo, como acalmar a dor de quem perde um familiar, um amigo, num assassínio tão brutal quanto gratuito?

A verdade geral, bem o sabemos, não tem significado para quem é tocado pela injustiça particular.

É legítimo, e normal, o alvoroço informativo por fenómenos de cariz invulgar na sociedade nacional, como por exemplo a guerra pelo controlo do negócio da noite nas duas grandes cidades, e que motivam notícias com mais mercado do que a sensaboria oriunda das movimentações políticas, mas o jornalismo deve saber cumprir a sua função e, ao mesmo tempo, manter a cabeça fria. Num momento em que abundam os reguladores candidatos a tutelar a actividade dos media, o valor da informação mede-se também pela sua serenidade.

DN, 8-3-2008
 
QUANDO O JORNALISMO SE CRUZA COM OS AFECTOS

Mário Bettencourt Resendes
provedor@dn.pt

Fernanda Câncio pertence aos quadros redactoriais do DN e é, além disso, titular de uma coluna semanal de opinião nas páginas do jornal e de outra na Notícias Magazine, a revista que acompanha as edições de domingo do DN e do JN.

Num dos seus recentes artigos, publicados às sextas-feiras, a jornalista criticava, com a contundência e desassombro que fazem parte da sua "imagem de marca", uma intervenção pública de Pedro Santana Lopes. O texto suscitou um número razoável de protestos de leitores, dirigidos ao provedor, defendendo que Fernanda Câncio, por motivos relacionados com a sua "vida pessoal", se deveria abster de criticar um dirigente da oposição.

O provedor pouco dirá sobre a "questão concreta". Primeiro, porque, de acordo com o estatuto das suas competências, não lhe cabe pronunciar-se sobre o conteúdo de artigos de opinião, a não ser em casos absolutamente excepcionais; depois, porque nada sabe - nem está interessado, nem lhe cabe saber... - sobre a vida pessoal da jornalista, salvo duas ou três pseudo-reportagens especulativas que não são bons exemplos de jornalismo credível. A verdade é que a jornalista sempre resguardou a sua vida pessoal com um cuidado assinalável, merecendo, pois, que essa reserva seja respeitada. E, portanto, daqui deriva que não faz qualquer sentido pretender que Fernanda Câncio se abstenha de opinar sobre o que quer que seja: fá-lo há muito tempo, num registo muitas vezes polémico e há que reconhecer que sempre evidenciou independência de espírito. O provedor conhece a personalidade e o currículo da jornalista o suficiente para afirmar que é um completo absurdo pensar que Fernanda Câncio se resignasse a ser porta-voz de ideias que não sejam as suas.

A "questão concreta" remete, mesmo assim, para uma temática que, essa sim, merece reflexão no âmbito da análise do discurso dos media e que, por sinal, alimentou já animadas controvérsias noutros países: as relações familiares ou pessoais de um jornalistas devem, em alguma medida, condicionar o seu comportamento profissional?

Foram solicitados comentários - publicados na íntegra noutro local desta página - a Fernanda Câncio, a Ricardo Costa, jornalista/comentador político da SIC e irmão do actual presidente da Câmara de Lisboa, e a Judite de Sousa, actual directora adjunta e entrevistadora de primeiro plano da RTP, casada com o presidente da Câmara de Sintra e figura destacada do PSD, Fernando Seara.

Excertos dos três depoimentos resumem, com rigor, o pensamento do provedor nesta matéria: estamos perante situações que podem, em algumas circunstâncias, causar embaraços profissionais, mas não faz sentido criar regras para além das que já regem o exercício da profissão - para além, obviamente, do bom senso recomendável numa área em que as questões de forma, nos tempos que correm, fragilizam muitas vezes a substância. De resto, será o trabalho quotidiano do jornalista que, em última análise, funcionará como instrumento de aferição da sua credibilidade.

Um derradeiro comentário, de interesse predominantemente académico, sobre a convicção de Fernanda Câncio de que um artigo de opinião "não é jornalismo". A sua argumentação assenta, aliás, neste pressuposto - bem como o arremedo de ironia final. Ora, não é possível definir o "acto jornalístico" com os padrões de rigor científico que caracterizam outras profissões, mas o jornalismo existe tanto no exercício noticioso, mais ou menos enquadrado, como no artigo de opinião. Por sinal, boa - e notável - parte da sua história, nos séculos XVIII e XIX, aconteceu no exercício da opinião.

Em patamares diferentes, todos os géneros jornalísticos, em retórica diferenciadas, traduzem uma ambição de intervenção no espaço público, sendo óbvio que a opinião publicada - independentemente de ser ou não subscrita por jornalistas - carrega uma responsabilidade acrescida ao seu autor. A quem estiver interessado em aprofundar o tema, aconselha-se a leitura de O Quarto Equívoco, de Mário Mesquita, ou ainda um excelente ensaio do prof. Hermenegildo Ferreira Borges (disponível na rede), intitulado "Espaço Público e 'Retórica do Jornalismo'." PS - Nas próximas duas semanas, o provedor estará em gozo de "merecido repouso". A coluna regressa no dia 5 de Abril. Boa Páscoa.

MAS QUAL É MESMO A QUESTÃO?

Fernanda Câncio

Jornalista

Não estou certa de entender a relevância da questão a que o provedor me pede para responder - "Será que as relações pessoais dos jornalistas interferem na sua vida profissional?", mas lá que é interessante é. Devo porém exprimir a minha estranheza por ser colocada, neste caso, a propósito de um artigo de opinião.

De facto, o artigo de opinião, apesar de ser um género jornalístico, não é jornalismo. É, por definição, a expressão da posição pessoal de quem o assina, pelo que suscitar, a propósito de um artigo de opinião, a questão sobre a interferência da esfera pessoal do autor naquilo que escreve é no mínimo bizarro. Colocada desta forma, aliás, esta questão só poderá ser assim interpretada: a pessoa x, por ser relacionada/aparentada com a pessoa ou pessoas tais, não pode exprimir a sua opinião. Teríamos pois uma espécie de índex dos cidadãos impedidos de escrever opinião, índex esse que, naturalmente, deveria evoluir à medida que as relações se fizessem e desfizessem. Note-se que este impedimento não existe para filiados em partidos políticos, membros de governos, directores de empresas. Seria só para quem, não sendo nenhuma dessas coisas, tem com essas pessoas "uma relação pessoal". Não esquecendo o facto de o índex só valer para as relações conhecidas - a não ser que a ideia fosse a de obrigar todos os opinadores a entregar uma certidão de todas as suas relações pessoais, que seria aditada a cada novo relacionamento/ruptura e fiscalizada por um órgão criado para o efeito.

Passando deste cenário absurdo para a essência da pergunta - a da forma como a actividade jornalística pode ser afectada pelas relações pessoais --, parece-me evidente que a generalidade do que disse sobre os opinadores se aplica aos jornalistas. A gestão da vida pessoal do jornalistas versus a sua vida profissional só pode depender do bom senso do jornalista e da sua consciência profissional. Não há nem pode haver regras para esta matéria, e por motivos óbvios: primeiro, a vida pessoal do jornalista só a ele diz respeito. Depois, uma relação pessoal, entendida como uma relação de parentesco, amizade ou amor, não é evidentemente uma relação de dependência hierárquica e/ou económica. Qualquer inferência nesse sentido é, mais que disparatada, insultuosa.

O que está em causa na avaliação deontológica/ética da actividade jornalística só pode ser a correcção do trabalho produzido e da postura do jornalista ao produzi-lo. Não há impedimentos apriorísticos a não ser os ditados pelo código deontológico, pelo estatuto do jornalista, pela consciência profissional do próprio e pelas regras do órgão de comunicação social para o qual trabalha. Tanto assim é que um jornalista pode entrevistar o pai e essa entrevista ganhar um prémio de jornalismo - já aconteceu. Não posso, pois, senão terminar como comecei: desculpe, mas qual é mesmo a questão?
UMA CERTA 'RESERVA'

Judite de Sousa

Jornalista

A questão não é fácil porque coloca a questão do trabalho e dos afectos. Eu, pessoalmente, acredito que um ou uma jornalista podem e devem realizar o seu trabalho conforme os princípios e os valores éticos e deontológicos da profissão independentemente daquilo que se passa ao nível das suas vidas pessoais. No entanto, a forma como a opinião pública pode olhar para essas situações, entendendo que o ou a jornalista serão menos isentos pelo facto de poder estar em causa uma pessoa que lhes é muito próxima, coloca a questão de uma certa " reserva ". Assim, julgo que o mais prudente é manter uma separação, tanto mais se se tratar do jornalismo político. Na prática, isto pode significar a não intervenção em debates políticos ou em entrevistas por parte de jornalistas que em outras circunstâncias poderiam intervir profissionalmente nesses espaços.

DESVANTAGENS ÓBVIAS

Ricardo Costa

Jornalista

Falo em causa própria e com própria experiência. Quando comecei no jornalismo, em 1989, na Política do Expresso, já o meu irmão António era da direcção do PS. Ao longo dos anos isso foi uma coisa que nos acompanhou aos dois. Provocou mais embaraços pessoais do que qualquer outra coisa. Vantagens: nenhuma. Desvantagens: algumas, todas óbvias. A qualidade e a independência do trabalho é que têm que valer por si. É apenas a isso que ligo.

DN, 15-3-2008
 
JORNALISMO INTERPRETATIVO E A ARTE DO DESMENTIDO

Mário Bettencourt Resendes
provedor dos leitores

No âmbito do seu magistério, há episódios que exigem, da parte do provedor, um trabalho de investigação apurado e atento. O tema da coluna de hoje é um bom exemplo.

Tudo começou com os 255 caracteres finais de uma notícia publicada no baixo da página 20 da edição do DN de 15 de Fevereiro. O tema da polémica não tem, por sinal, nada a ver com o título da peça ("Socialistas criticam ministra da Educação").

A página é inteiramente dedicada à cobertura da actualidade parlamentar e a notícia aqui em causa relata a reunião do grupo do Partido Socialista. Começa por transcrever as críticas de alguns deputados à ministra da Educação - justificando-se, assim, o título - e acrescenta-se depois uma breve referência a uma intervenção do deputado Vasco Franco sobre corrupção.

Segundo o DN, Vasco Franco "insurgiu-se contra alegados insultos a deputados que tem ouvido de forma generalizada". O deputado considerou que a Assembleia "não pode ficar indiferente aos insultos generalizados de que é alvo, devendo responder institucionalmente, no sítio próprio, que são os tribunais". O jornalista João Pedro Henriques, autor das linhas em análise, recordava, de seguida, que "Vasco Franco foi durante várias legislaturas vereador na Câmara Municipal de Lisboa" e que "foi um dos que votaram a favor da permuta em que a CML deu à Bragaparques metade dos terrenos da Feira Popular (e direito de preferência no leilão da outra metade) em troca dos terrenos no Parque Mayer". O jornalista concluía afirmando que o Ministério Público considerou o negócio "lesivo da autarquia em pelo menos 40 milhões de euros".

Vasco Franco reagiu em carta dirigida ao jornal, com cópia para o provedor, solicitando uma apreciação do caso. No texto afirmava que a notícia "é falsa" e "atenta contra o seu bom nome". E explicava: "Quem acompanhou o caso Parque Mayer na comunicação social sabe que a acusação está formulada, não me afectando em nada, e sabe também que eu não votei a concessão do direito de preferência referido e que o prejuízo que o Ministério Público considera ter existido se deve à aprovação de um loteamento que teve o meu voto contra e ao reconhecimento de um direito de preferência que não foi aprovado pela Câmara nem pela Assembleia Municipal."

Na edição de 22 de Fevereiro, o DN publicou, na íntegra, ao alto da página 19, a carta do deputado, complementada por um breve nota do jornalista João Pedro Henriques, reconhecendo que "é verdade que Vasco Franco não votou pelo direito de preferência da Bragaparques e pelo erro o DN pede desculpa; é verdade também que Vasco Franco votou a favor da permuta que agora está a ser judicialmente escrutinada".

O que está, verdadeiramente, aqui em causa? Em primeiro lugar, um episódio de "jornalismo interpretativo" que explica a indignação do deputado. De facto, ao fazer uma referência ao caso Bragaparques como suposto enquadramento a uma intervenção de Vasco Franco contra as acusações de corrupção aos políticos, João Pedro Henriques, fosse essa ou não a sua intenção, abre caminho para que os leitores possam inferir alguma falta de legitimidade, da parte do deputado, para se pronunciar sobre o assunto. Ora, tanto quanto se apurou, Vasco Franco não é arguido no caso Bragaparques, ao contrário do que acontece com outros responsáveis (ou ex-responsáveis) da autarquia lisboeta.

Da parte do deputado, há, no seu desmentido, uma habilidade epistolar que, a ser evitada, teria contribuído para um melhor entendimento sobre o que se passou. De facto, e conforme investigou o provedor, Vasco Franco votou contra a concessão do direito de preferência referido, mas votou a favor da permuta, como reafirmou o jornalista. Ora, no seu texto, o deputado ensaia uma redacção que passa ao lado desse segundo voto.

Enfim, um caso que poderia ter sido evitado com um pouco mais de ponderação prévia por parte do jornalista. O enquadramento e a interpretação das notícias, práticas recomendáveis no jornalismo moderno, devem ser claros e bem sustentados.

DN, 26-4-2008
 
O 'JORNALISMO SUBSTANTIVO' NO NOTICIÁRIO POLÍTICO

provedor dos leitores
Mário Bettencourt Resendes
provedor@dn.pt

O actual presidente da Assembleia da República e dirigente histórico do Partido Socialista foi à Madeira e fez um rasgado elogio aos méritos da acção governativa de Alberto João Jardim. O episódio suscitou compreensível surpresa nos sectores da opinião pública que acompanham a vida política, não só pela conhecida crispação dos últimos tempos entre Jardim e o PS de Sócrates, mas também porque foi Jaime Gama que, em 1992, comparou Jardim ao ditador africano Bokassa.

Multiplicaram-se os comentários e as tentativas de explicação das palavras de Gama, oscilando-se entre "abrir caminho para um apaziguamento político" da Madeira com os poderes centrais nas vésperas da visita de Cavaco ou ainda um suposto exercício de "refinada ironia", talento que Gama sempre exerceu com singular mestria.

O DN, na sua edição de 5 de Abril, dedicou ao assunto uma peça desenvolvida, assinada por João Pedro Henriques, em que se fazia eco de especulações sobre a matéria, atribuídas a deputados, não identificados, do Partido Socialista. O texto era também enquadrado por citações do polémico discurso de Gama no Funchal e pela transcrição da contundente acusação de 1992.

Ora, o leitor que assina Augusto Dias (e que acrescenta, numa aparente tentativa de fazer humor, o nome de Alastair Campbell, o célebre spin doctor de Tony Blair) não apreciou o artigo. Começa por afirmar que "se observa na leitura do DN a sistemática confusão entre notícia, comentário e opinião", alarga o "pecado" a toda a imprensa, explicando a "prática insalubre" através de um conhecido número de circunstâncias, desde a "concorrência desenfreada" até à "progressivamente mais deficiente formação geral e específica dos jornalistas". O provedor não se alongará neste capítulo particular, mas não deixa de expressar a sua discordância sobre a última afirmação: em média, a formação dos jornalistas, geral e específica, nos tempos que correm (mesmo não ignorando limitações que são comuns a toda uma geração) é muito superior ao que acontecia há décadas. E, nesta matéria, o provedor fala com o conhecimento de quem exerce a profissão desde 1975.

O leitor contesta, de seguida, o que considera ser, por parte do jornalista, "sarcasmo" ou "humor doente", numa "inaceitável confusão, premeditada ou não, entre géneros de jornalismo".

Solicitou-se um comentário ao jornalista João Pedro Henriques (e também ao director João Marcelino, depoimento que é publicado na íntegra noutro local desta página). Depois de salientar que o jornalismo "não tem que se limitar a espelhar (noticiar) certezas" e que "a incerteza pode ser matéria de notícia", João Pedro Henriques defende o seu texto, "equilibrado, isento e rigoroso". A sua própria opinião "não se intrometeu" na notícia, diz o jornalista, que garante ainda, escudado nos seus mais de 15 anos de experiência de cobertura da vida político- -parlamentar, que "os deputados do PS, e das outras bancadas, passam parte importante do seu tempo especulando sobre a actualidade".

O jornalista não esclarece se essa especulação acontece em conversas particulares (um direito que assiste a todos os cidadãos) ou nas chamadas trocas de impressões off-the-record com jornalistas, o que legitima a sua utilização em matéria noticiosa, desde que evidente o seu interesse público. Presume-se que seja este último o caso em apreço.

O provedor leu com atenção a notícia e considera que estamos perante um episódio da vida política que dificilmente poderia ser retratado apenas com base no "jornalismo factual", ou "substantivo", como refere João Marcelino no seu depoimento. Na verdade, a decifração de muitas das intervenções de Jaime Gama quase poderia constituir matéria para uma cadeira num curso de Ciências Políticas, dada a reconhecida inteligência e habilidade com que faz a gestão de presenças e ausências, de palavras ou de silêncios.

Nessa medida, o discurso da Madeira e as suas consequências justificam peças de jornalismo interpretativo e o recurso a fontes não identificadas, embora politicamente localizadas. Dir-se-á que não é o ideal para quem aprecia, e bem, o jornalismo que João Marcelino defende nesta página. O certo, no entanto, é que a vida política não se passa apenas "à boca do palco" e o mais importante está mesmo, muitas vezes, nos bastidores. E a obrigação da imprensa, nomeadamente da chamada de "referência", é levar até aos leitores essas movimentações que ajudam a entender melhor a actualidade.

Admite-se que o leitor possa não ter apreciado o estilo de um ou outro excerto do artigo de João Pedro Henriques. No entanto, e numa apreciação global, o provedor não encontra, neste caso, motivo para censura.

DN, 3-5-2008
 
CARTA ABERTA A 'O INIMIGO PUBLICO' QUE FOI MAU COMIGO

Ferreira Fernandes
jornalista
ferreira.fernandes@dn.pt

Esta semana, o conceituado semanário O Inimigo Público - que à sexta-feira traz o Público à volta, como o Expresso traz o saco de plástico - dedicou-se à epidemia de saudades sobre o Maio de 68 que varre o País. Num artigo intitulado "Oh não! Já começaram a pregar petas sobre o Maio de 68", meteu-se comigo. Cito: "O Ferreira Fernandes , por exemplo, garante que esteve no 25 de Abril, no Maio de 68, na Guerra dos Seis Dias (Junho de 1967), na Independência dos EUA (Julho de 1776) e na partida do Fernão de Magalhães (Agosto de 1556) tendo assim testemunhado um straight flush (Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto) de acontecimentos relevantes."

Descobriram-me a careca. De facto, nem a um par de duques assisti. Cheguei a Paris um ano depois do Maio de 68, e a Lisboa na semana seguinte ao 25 de Abril; o Moshe Dyan, com a pala, viu mais do deserto do Neguev que eu com os meus dois olhos abertos; o mais perto que estive da independência dos EUA foi a tomar chá, em Boston, é certo, mas em Dezembro; e o Fernão, por eu ter chumbado nos testes anti-enjoo, preferiu o Sebastián para imediato, mandando a minha candidatura por "del cano abaixo" (como ele disse, o traidor, em portunhol).

Esses os factos. Mas O Inimigo Público excusava de ser tão cruel comigo. Sugerir que não estive num sítio em data importante é como revolver a faca numa ferida aberta. Na verdade, a minha carreira pode ser resumida assim: "Aquele que não esteve lá." Ou, se esteve, chegou tarde.

Da primeira vez que passei pelo DN, anos 90, o director Bettencourt Resendes mandou-me para a Tailândia onde tinha havido um golpe militar. Ainda eu ia de avião e os generais já se tinham arrependido. Tive de escrever sobre as ossadas dos portugueses na cidade de Ayuthia, assunto emocionante mas um pouco demodé (as campas eram de 1511).

No entanto, o director continuou a apostar em mim: "Quero-te em Los Angeles. Vão ser julgados os tipos que bateram no Rodney King." Este era um negro que fora filmado a ser espancado por polícias. Esperavam-se explosões nos bairros negros durante o julgamento. Comprei um colete de dez bolsos e um seguro reforçado. Fiz uma crónica que deu brado. Brado interno, entenda-se. Escrevi: "Estou em Malibu, bebo um Bloody Mary, sentado no meu Chevrolet descapotável, e aborreço-me." Era a pura verdade. Nem o bairro de Watts, o mais violento, se mexeu durante a minha estada em Los Angeles. A administração do jornal fez-me saber que não estava disposta a pagar para eu andar a laurear a pevide. Mas tenho eu culpa por espantar a pólvora?

Por essa altura, já a ONU me tinha debaixo de olho, para embaixador itinerante. Dizia-me o secretário-geral Boutros-Ghali: "Você vai para os pontos quentes do globo e aquilo arrefece logo." Eu seria uma espécie de fotógrafo Sebastião Salgado mas ao contrário. Onde ele chegava é porque a coisa estava preta. Eu chegava e compunha-a. Não aceitei o convite porque achei incompatível com a carteira profissional. Anulando crises eu tirava o pão da boca dos meus colegas.

Mas continuei na mesma. Com uma equipa da RTP filmei as Torres Gémeas... dias antes do 11 de Setembro. Andei com os guerrilheiros da UNITA seis semanas e nem um tirito para amostra. Na guerra dos Balcãs, andei pela Croácia e Kosovo, nem tudo paraísos mas lugares catitas comparados com a Bósnia, onde nunca estive . Sou um Gandhi da esferográfica. Eu merecia ser um verso do Imagine de John Lennon. E foi isso que O Inimigo Público, cruelmente, me recordou.

DN, 4-5-2008
 
Jornalismo feito por pessoas

Luís António Santos
Professor da Universidade do Minho

O Papa Bento XVI disse há dias a uma plateia de representantes das faculdades de Comunicação de universidades católicas que é necessário fazer um esforço para que a formação ética tenha uma
presença mais forte nos “curriculae”. “É importante
que esta formação [em Comunicação] jamais seja considerada como um simples exercício técnico ou como mero desejo de dar informações, afirmou o Papa, acrescentando: “é oportuno que seja muito mais um convite a promover a verdade na informação e a fazer nossos contemporâneos reflectirem sobre os acontecimentos”.
Perante quebras nas vendas e nas audiências e as decorrentes baixas nas receitas, grande parte dos ditos media tradicionais discutem que caminhos trilhar numa economia de face alterada e com públicos mais exigentes mas, ao mesmo tempo, menos fiéis. Uma opção, sempre disponível, é aceitar profecias de catástrofe, actuando em consonância – reduzindo ainda mais os investimentos.
Outra, de sinal contrário é, precisamente, a da aposta numa maior credibilização do trabalho jornalístico, por forma a ser entendido como relevante e de confi ança.
Bento XVI, na sua mensagem, diz-nos estar mais próximo desta última. Diz-nos que o jornalista
não é apenas um técnico de equipamentos, é um ser humano, que deve procurar ser leal com
aqueles que nele confi am.
Num mundo de comunicações cada vez mais fragmentadas, em que o profi ssional e o não profi ssional se confundem como nunca no passado, em que o verdadeiro e o falso partilham plataformas, em que a pressão gestionária pouco mais imagina do que a exaustão de
modelos de negócio ultrapassados,
Bento XVI parece dizer-nos que está
na altura de apostar nas pessoas. A
mensagem do Papa contrasta, naturalmente, com uma realidade plena de infracções, a ponto de ser necessário discutir, neste momento, entre nós, os detalhes de um estatuto disciplinar dos jornalistas. São muitos os atropelos éticos que quase todos
conseguimos lembrar de memória, cometidos por empresas jornalísticas grandes e pequenas, da Imprensa, Rádio ou Televisão. Mas as palavras do Papa não são apenas circunstanciais, são indicações para uma rota. Importaria não as perder de
vista.

RRP, 26-5-2008
 
Jornalistas espanhóis pela concilição trabalho/família

Madrid. Manifesto pede maior racionalização de horários no jornalismo

Jornalistas, políticos e especialistas anunciaram a sua adesão a um manifesto que invoca uma maior conciliação entre a família e o trabalho nos meios de comunicação social. Entre várias reivindicações, estes profissionais solicitam que não se convoquem conferências de imprensa para depois das 18.00, porque tal implica um "esforço adicional".

A Secretaria de Estado da Comunicação, a Presidência do Senado, a Associação de Imprensa de Madrid, a Federação de Associações de Imprensa de Espanha, a Comissão para a Racionalização dos Horários Espanhóis e a Fundação + Família são alguns dos subscritores do manifesto, que conta com o apoio do Ministério da Igualdade, noticia o El Mundo.

A ministra titular, Bibiana Aído, destaca a importância desta iniciativa para impulsionar a conciliação nos meios de comunicação, através da "aposta no bem comum e no serviço à cidadania. Não duvidem que contarão sempre connosco para levar a cabo estas tarefas".

Estas declarações foram proferidas na inauguração do curso de Verão "Informação, formação, desinformação. Os meios de comunicação de que a sociedade precisa", no qual o manifesto foi apresentado. Bibiana Aído destacou a importância não só do curso mas também do manifesto: "Abrirá um grande debate sobre o papel dos meios de comunicação no século XXI e a sua relação com a construção de uma modelo social mais justo e democrático."

O documento centra-se na "importância do trabalho social" que os profissionais da comunicação desempenham e que, como tal, "deve ser compatível com os horários mais racionais possíveis", o que não implica condicionar a relação entre empresas e profissionais, mas sim "chamar a atenção" para a questão dos horários e condições de trabalho.

DN, 9-7-2008
 
CONTINUA O MISTÉRIO DOS DOIS IRMÃOS

Ferreira Fernandes
jornalista
ferreira.fernandes@dn.pt

Uma notícia. A carta de condução por pontos - que retira a licença de condução ao fim de algumas multas - fez cair os acidentes graves em Espanha. Excelente notícia. Mas que esconde uma má: agora, quem precisa de transplante de órgãos espera mais tempo. Segundo o jornal El País, com a quebra de acidentes rodoviários (os maiores causadores de morte de jovens) escasseiam os órgãos em bom estado: há 15 anos, 43 por cento dos doadores vinham dos acidentes; em 2007, só dez por cento...

Outra notícia. Segundo o jornal Nice-Matin, os veraneantes da Côte d'Azur coçam-se muito: a alforreca Pelagia noctiluca já atacou mais de 500 banhistas. E é uma surpresa. Desde há 200 anos que estes animais gelatinosos são estudados e sabe-se que aparecem num ciclo imutável. Ora este é o oitavo ano seguido que esta alforreca incomoda, um recorde nunca visto. Será que a Pelagia noctiluca veio para ficar? Sim e estas podem ser as causas: as pílulas contraceptivas e as hormonas que limitam os efeitos da menopausa entram nas águas do Mediterrâneo (pois as banhistas que as usam também entram). As pílulas diminuem a reprodução do atum e as hormonas "feminizam-no" - daí haver menos peixes. E menos predadores das alforrecas. E mais e perenes alforrecas.

Sobre a crise institucional belga, o jornal francês Le Monde falou com um especialista de questões europeias, Philippe Moreau-Defarges. Este receia que "o pacto de Estado", que ao longo da História soldou a maioria dos países europeus, possa estourar por todos os lados, e não só entre valões e flamengos. E qual o papel da União Europeia nessa desintegração dos Estados? "A integração europeia teve um papel desintegrador sobre os Estados membros. Os Estados perderam muitas competências que foram transferidas para a UE, e muitos grupos estimam que não têm mais necessidade dos Estados existentes já que há a Europa", disse o investigador do Instituto Francês de Relações Internacionais.

Três notícias de jornais - uma sobre tragédias humanas, outro de ambiente e outra de política internacional - e todas com a preocupação de, além de debitar o facto, propor "porquês" para ele, causas e consequências. É a diferença entre um jornal e uma agência de notícias (esta pode contentar-se em dizer rapidamente: "Kennedy morto"). Há uma semana, li num jornal que dois irmãos portugueses gastaram uma fortuna contratando detectives para intimidar, seguir e insultar, durante dois anos, um editor. Continuo sem saber porquê. Continuo, pois, sem ter lido nada. Esta é a minha crónica dedicada à campanha: quando a polícia quiser filtrar informações para os jornais, estes só devem aceitar informações que digam alguma coisa. O crime não é menos que os belgas ou as alforrecas.

DN, 20-7-2008
 
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