11 novembro, 2007

 

Museu Salazar


Porque a memória não é eterna...





http://www.correiodamanha.pt/noticia.asp?id=264338&idselect=10&idCanal=10&p=200

http://www.portugaldiario.iol.pt/noticia.php?id=921952&sec=3

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Petição de 16 mil contra museu do Estado Novo

SUSETE FRANCISCO

Documento é entregue hoje a Jaime Gama, na Assembleia da República
A União de Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP) entrega hoje no Parlamento uma petição com 16 mil assinaturas, pedindo aos deputados que travem a criação de um museu dedicado a Salazar, em Santa Comba Dão. Entre os subscritores contam-se nomes como Jerónimo de Sousa, líder do PCP, Carvalho da Silva (secretário-geral da CGTP) ou os capitães de Abril Vasco Lourenço, Vítor Alves e Mário Tomé.

A URAP pretende assim contrariar a intenção de construir no Vimieiro (terra natal de Salazar) o "Centro Documental Museu e Parque Temático do Estado Novo". Para isso, a autarquia conta já com parte do espólio de Oliveira Salazar - um terço dos bens imóveis da herança da família, que recebeu por doação de um sobrinho-neto.

A URAP, pela voz do coordenador do Conselho Directivo, Aurélio Santos, diz não contestar que a "figura de Salazar seja estudada, historicamente, com rigor". Mas acrescenta que o projecto em curso não é mais que a promoção de "uma espécie de santuário de exaltação ao salazarismo". E defende que o Parlamento "se deve pronunciar" sobre esta questão, na medida em que o museu contraria a Constituição, por promover a "divulgação de ideologia fascista".

DN, 5-11-2007
 
BARBA DE TRÊS DÉCADAS

Alberto Gonçalves
sociólogo
albertog@netcabo.pt

É bom saber que, após trinta e tal anos de democracia, os resistentes antifascistas continuam em franca actividade. Agora, na falta de melhor, resistem ao pincel da barba e a uns pertences de Salazar, que a autarquia de Santa Comba Dão quer desavergonhadamente expor. Um representante da URAP, a associação que congrega os profissionais acima mencionados, explica: o eventual Museu e Parque Temático do Estado Novo terá "muito mais o sentido de um santuário, uma espécie de mausoléu, em que se pretende fazer a exaltação da personalidade do ditador". Avisados, os antifascistas desconfiam que o pincel de barba e "alguns tarecos" (palavras deles) do ditador seriam o epicentro de peregrinações em massa ao Vimieiro. Nos seus piores pesadelos, milhares de incautos ou rematados fascistas acorrem aos tarecos na esperança de que a mera contemplação da intimidade de Salazar os abençoe, como dantes o toque do rei abençoava os simples. Não imagino se isto traduz a péssima ideia que os antifascistas fazem do povo ou o carácter divinatório que concedem a Salazar. Não importa. Importa que, desde o início, reagiram ao museu da única forma que os autênticos combatentes pela liberdade entendem: berrando pela respectiva proibição. Dado que o berreiro não produziu resultados, voltaram à carga com 18 mil assinaturas e uma petição entregue no Parlamento. Comparados com os sessenta e tal mil votos que beatificaram Salazar num concurso televisivo, os subscritores não parecem assim tantos. Na opinião dos antifascistas, porém, são os suficientes para impedir o projecto, cuja existência em abstracto não contestam, na condição "de ser feito por pessoas idóneas", isto é, por membros da URAP, que veneram praticamente todos os torcionários dos últimos dois séculos mas são intransigentes face ao pequeno Salazar. Além disso, têm experiência em museologia. Santa Comba devia olhar o exemplo do Museu do Comunismo Português. Fica na Soeiro Pereira Gomes e, na ocasião em que passei lá um par de horas, confirmei que não é nenhum santuário, mas um espaço de história quase viva. Maravilhei-me com os espécimes expostos, os quais, embora mumificados em 1917, se movem como se pertencessem ao nosso mundo (quando falam nota-se que não pertencem). Não sendo arejado, o ambiente não é o de um mausoléu. E juro que não detectei vestígios de exaltação de personalidade: a pochette de Cunhal nem se encontra em exibição.

DN, 11-11-2007
 
MICAS, A PUPILA DO SENHOR DITADOR

ANA SÁ LOPES

Maria da Conceição Melo Rita viveu com Salazar até aos 28 anos. Foi só depois de casar que saiu do primeiro lar salazarista da Nação, no Palácio de São Bento, onde se usaram senhas de racionamento durante a guerra e se fazia a comida em panelas compradas com o dinheiro do próprio ditador (que as escolheu, ele próprio, sem saber alemão, num catálogo de uma empresa alemã).

Todas as noites, dos seis até aos 28 anos de Maria da Conceição, o ditador subia ao sótão onde ficava o quarto da pupila para, antes de ele próprio se recolher, ver se estava tudo bem com Micas e aconchegar-lhe os cobertores.

Para Salazar, Maria da Conceição era um nome muito comprido: passou a chamar-lhe Micas. O jornalista Joaquim Vieira recolheu e enquadrou historicamente as memórias dos 35 anos que Maria da Conceição Melo Rita acompanhou o ditador. Mesmo depois do casamento, as visitas da pupila eram constantes. O filho mais velho de Micas viveria no Palácio de S. Bento até à morte de Salazar.

O retrato de Salazar na intimidade, visto pela sua filha adoptiva, é uma pérola para a compreensão desse fenómeno único no contexto das ditaduras europeias que foi o salazarismo. "Com muita gente a mexer num tacho ninguém se entende", dizia Salazar, que adorava metáforas domésticas, e que um dia confessou à governanta que tratava por "menina Maria": "A menina Maria tem mais facilidade em escolher uma criada do que eu um ministro."

Já se sabe que o pai da Nação era austero e misantropo - mas talvez não se soubesse ainda que comia sempre sozinho, nos pratos e talheres que ele próprio comprara - empacotara a louça do Estado, que seria reservada só a jantares oficiais - deixando a filha adoptiva e a governanta D. Maria remetidas à copa.

Salazar, antigo seminarista, ajudava à missa de todos os domingos em S. Bento. Mas nunca foi visto a comungar: Micas interroga a governanta, que responde que o ditador tinha uma licença especial que o desobrigava da confissão e da comunhão.

O namoro de Salazar com Carolina Asseca é um momento duro para a D. Maria que, aflitíssima com a perspectiva de casamento do ditador pede a Micas um favor: que aproveite o beijo de boas noites que Salazar lhe dava todas as noites no quarto para lhe implorar que não casasse. "Deixa lá isso, dorme, dorme", foi a resposta. De resto, todas as cartas de Carolina eram deixadas à vista das mulheres da casa que as liam com fervor. "Como o senhor doutor nunca passava noites fora, duvido mesmo que tenha havido intimidade física" com Carolina Asseca, escreve Micas.

Com Christine Garnier, a jornalista francesa com quem Salazar, aos 62 anos, viveu um romance (chegou a encarregar o embaixador em Paris, Marcello Mathias, da missão de lhe comprar e entregar um anel) a situação pode ter sido diferente. Micas repara que, no forte do Estoril, durante vários encontros, são corridas "as portadas de madeira do escritório do senhor doutor" que nunca antes estavam fechadas.

A vida de Salazar com Micas faz parte da hagiografia do Estado Novo. Rosa Casaco (o agente da PIDE que comandou o assassinato de Humberto Delgado e fotógrafo nas horas vagas), tira o retrato em que o ditador ensina a tabuada à pupila, que depois ilustrará a manchete de O Século "Como vive e trabalha o sr. dr. Salazar". E o Diário de Notícias é avisado do dia, hora e local do exame de 4.ª classe de Micas: para surpresa da examinanda, aparece-lhe à frente um flash e, no dia seguinte, 26 de Julho de 1941, o DN publica uma reportagem intitulada "Era uma vez uma menina", que noticia o exame e afirma que um "acontecimento tão simples e tão pequeno deve ter chegado para animar com a sua claridade o dia do presidente do Conselho".

DN, 14-11-2007
 
UMA CASA EM RUÍNA, OUTRA CASA PRONTA A TORNAR-SE MUSEU

AMADEU ARAÚJO, Viseu

No número 23 da Avenida do Cristo Rei, em Cabanas de Viriato, no concelho de Carregal do Sal, parece faltar vontade política para recuperar a Casa do Passal, que foi em tempos a residência de Aristides de Sousa Mendes, entretanto adquirida pela fundação com o seu nome. A fundação nasceu em 2000, pouco tempo depois da reabilitação do cônsul proscrito pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros no Estado Novo. Esta casa, cheia da memória e dos afectos para muitos que hoje ainda estão vivos graças à acção do cônsul português em Bordéus, foi homologada como monumento nacional, em 2005, mas continua sem ser classificada como tal. Aqui a memória não se perpetua. Só quem vem em busca deste destino sabe onde está. Mas 12 quilómetros a sul, no Vimieiro, já no concelho de Santa Comba Dão, a antiga casa de António de Oliveira Salazar também está em ruínas. Com uma pequena diferença. Alguém lá colocou uma placa para lembrar quem por lá passou. E a vontade política permanece irredutível na intenção de ali construir um museu em homenagem ao ditador.

Duas intenções, sempre celebradas, de construir dois museus, antagónicos, mas dois museus destinados a perpetuarem a memória de gente como Aristides de Sousa Mendes e a sua acção exemplar, que arriscou a carreira diplomática, contrariando as ordens de Salazar. Aquele cuja homenagem sob a forma de museu é de mais fresca data e, apesar disso, está mais adiantado na fase de concretização.

Recordemos.

No auge do poder nazi, no início da década de 40 do século passado, milhares de fugitivos demandavam Bordéus em busca de Aristides e dos seus salvo-condutos para a vida. O que esses fugitivos ignoram é que havia ordens estritas de Lisboa para a concessão de vistos. O Ministério dos Negócios Estrangeiros, então dirigido por Salazar, determinou que "os cônsules de carreira não poderão conceder vistos consulares, sem prévia consulta ao ministério, aos estrangeiros de nacionalidade indefinida, contestada ou em litígio, aos apátridas e àqueles que apresentem nos seus passaportes a declaração ou qualquer sinal de não poderem regressar livremente ao país de onde provêm; aos judeus expulsos dos países da sua nacionalidade ou daqueles de onde provêm". Determinações que o cônsul de Portugal em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes, não acata. A 24 de Abril de 1940, uma carta do ministério ameaçara-o de sanções, a que se segue a destituição do cargo diplomático. Regressada a casa, em Cabanas de Viriato, a família Sousa Mendes dava, todas as quintas-feiras, um jantar aos pobres e recebia amigos e refugiados. Mas em breve o cônsul entra em dificuldades e é forçado a abandonar a mansão de Cabanas e a mudar-se para um pequeno apartamento em Lisboa. Para sobreviver à destituição do cargo diplomático, o cônsul teve de vender a sua casa em Cabanas de Viriato que desde então entrou numa fase de ruína crescente. Até hoje.

A intenção da fundação era erigir ali um museu e a intenção até começou bem. Em 2000, Jaime Gama, então ministro dos Negócios Estrangeiros, atribui à fundação 250 mil euros. Apesar do dinheiro chegar, mesmo que a conta-gotas, a casa lá continua em ruínas, guardando nas paredes decrépitas a vontade de reunir o espólio do cônsul e divulgar a história das perseguições durante a Segunda Guerra Mundial.

Transmitir às gerações futuras, principalmente aos mais jovens, a sua herança moral, é um princípio que os defensores do Museu Salazar também advogam. Com a ressalva de que estes dois homens estiverem em lados diferentes da barricada da humanidade. Vontades muito portuguesas de homenagear as grandes figuras nacionais. Aristides de Sousa Mendes, o diplomata português nascido em 1885, em Cabanas de Viriato, foi o cidadão do mundo que mais seres humanos salvou durante a Segunda Guerra Mundial. Contrariando as ordens do Governo de Salazar. Foi expulso da carreira de diplomata, mas permitiu que milhares de pessoas se salvassem do extermínio. A sua casa em Cabanas de Viriato continua em ruínas sem que se avance com a tão proclamada casa-museu. Embora a fundação anuncie que está a ser executado o projecto de arquitectura, o processo avança com a rapidez do caracol. Enquanto a casa permanece em desconstrução, os descendentes do cônsul tudo fazem para recuperar a memória deste herói que até já tem a história contada em banda desenhada. Um calvário que em 2006 os deputados Emídio Guerreiro e Luís Carloto Marques quiseram interromper. Em requerimento dirigido ao Parlamento relevavam a "acção humanitária do ex-cônsul de Bordéus que permitiu que 30 mil pessoas não conhecessem a deportação e a morte". Os deputados exigiam que se promovesse "a recuperação da casa onde viveram Angelina e Aristides de Sousa Mendes e os seus 15 filhos". Em 2006 a fundação reconhecia estar em "dificuldades" para reunir a verba necessária para reconstruir a antiga casa.

DN, 17-11-2007
 
Vandalizado jazigo de Salazar no Vimieiro

AMADEU ARAÚJO, Viseu

O jazigo de Oliveira Salazar no cemitério do Vimieiro, em Santa Comba Dão, foi vandalizado e partido durante a madrugada de ontem. O sobrinho do ditador já apresentou queixa na GNR, que a fez seguir para o Ministério Público.

Segundo apurou o DN de fonte policial "durante a manhã de ontem uma senhora foi ao cemitério e deu conta da situação aos familiares do ditador que entretanto apresentaram queixa contra desconhecidos".

Manuel dos Santos, morador nas imediações do cemitério, contou ao DN : "Atiraram uma pedra contra o jazigo e partiram a fotografia e a lápide". De acordo com o morador esta não foi a primeira vez que tal aconteceu: "Já o ano passado vieram aí uns malandros que partiram várias coisas no cemitério".

Desde a sua morte, em 1970, que os restos mortais do ditador repousam no Vimieiro, terra natal de Oliveira Salazar. O túmulo sempre apresentou flores frescas e duas vezes por ano, nos aniversários de nascimento e da morte, a aldeia recebe a visita de imensos saudosistas.

Desde há dois anos que a aldeia que viu nascer o homem que governou Portugal durante 48 anos tem estado sob polémica com a intenção da autarquia local de criar um museu em memória do ditador. No Vimieiro, terra natal de Salazar os populares aplaudem a decisão municipal e sempre garantiram que "se Estado não der o dinheiro, nós arranjamo-lo". Motivos que levam os habitantes do Vimieiro a considerarem os actos de vandalismo no cemitério da aldeia como "obra de gente ruim que nem os mortos respeitam". Também o presidente da Câmara Municipal de Santa Comba Dão, João António Lourenço, estranhou a ocorrência. Lamentou que "hoje em dia até os mortos incomodem!". A União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), é contra o museu, que considera que se irá "criar uma organização centrada na propaganda da ditadura corporativo-fascista".

DN, 24-1-2008
 
Vandalizado jazigo de Salazar no Vimieiro

AMADEU ARAÚJO, Viseu

O jazigo de Oliveira Salazar no cemitério do Vimieiro, em Santa Comba Dão, foi vandalizado e partido durante a madrugada de ontem. O sobrinho do ditador já apresentou queixa na GNR, que a fez seguir para o Ministério Público.

Segundo apurou o DN de fonte policial "durante a manhã de ontem uma senhora foi ao cemitério e deu conta da situação aos familiares do ditador que entretanto apresentaram queixa contra desconhecidos".

Manuel dos Santos, morador nas imediações do cemitério, contou ao DN : "Atiraram uma pedra contra o jazigo e partiram a fotografia e a lápide". De acordo com o morador esta não foi a primeira vez que tal aconteceu: "Já o ano passado vieram aí uns malandros que partiram várias coisas no cemitério".

Desde a sua morte, em 1970, que os restos mortais do ditador repousam no Vimieiro, terra natal de Oliveira Salazar. O túmulo sempre apresentou flores frescas e duas vezes por ano, nos aniversários de nascimento e da morte, a aldeia recebe a visita de imensos saudosistas.

Desde há dois anos que a aldeia que viu nascer o homem que governou Portugal durante 48 anos tem estado sob polémica com a intenção da autarquia local de criar um museu em memória do ditador. No Vimieiro, terra natal de Salazar os populares aplaudem a decisão municipal e sempre garantiram que "se Estado não der o dinheiro, nós arranjamo-lo". Motivos que levam os habitantes do Vimieiro a considerarem os actos de vandalismo no cemitério da aldeia como "obra de gente ruim que nem os mortos respeitam". Também o presidente da Câmara Municipal de Santa Comba Dão, João António Lourenço, estranhou a ocorrência. Lamentou que "hoje em dia até os mortos incomodem!". A União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), é contra o museu, que considera que se irá "criar uma organização centrada na propaganda da ditadura corporativo-fascista".

DN, 24-1-2008
 
Salazar retratado em minissérie da SIC

PAULA BRITO

Salazar retratado em minissérie da SIC

Adaptação de 'Uma Aventura...' é um dos filmes

A SIC, em parceria com a Valentim de Carvalho (VC) Filmes, vai produzir uma minissérie sobre a vida privada de António de Oliveira Salazar. Do acordo entre as duas entidades, estão ainda contempladas as produções de três filmes ou telefilmes. Os conteúdos têm emissão prevista entre o final deste ano e 2010, segundo o canal.

"Estes projectos vão diversificar a oferta apelando a outros públicos e constituem a garantia de um forte investimento da SIC na ficção nacional", explica Nuno Santos, director de Programas da estação de Carnaxide. O mesmo garante que o canal vai manter, ou mesmo intensificar, a produção de novelas e séries. Facto que justifica a contratação, anunciada ontem, de Virgílio Castelo como consultor para a ficção nacional.

A minissérie A Vida Privada de Salazar vai contar, ao longo de quatro episódios, o lado desconhecido do ditador. As gravações começam nos próximos meses, adianta a SIC, e a história é baseada nos testemunhos e documentos que atestam a importância de algumas mulheres na vida do político. Em especial, a proximidade que Salazar manteve com a jornalista francesa Christine Garnier.

Os três filmes estão já em fase de desenvolvimento. Dois são originais e a estação não adiantou a sua temática. A outra produção resulta da adaptação de Uma Aventura na Casa Assombrada, a partir do livro de Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada.

O administrador da VC Filmes, Manuel Fonseca, sublinha "a ousadia deste acordo que tanto envolve uma ficção sobre Salazar, figura central do nosso imaginário, como a primeira tentativa de produção de um filme nacional infanto-juvenil". Com a ligação à VC Filmes, a SIC "reforça também a sua relação com a produção independente portuguesa".

A estação tem apoiado o cinema nacional, nomeadamente na produção de alguns dos maiores êxitos de bilheteira. De acordo com os dados do Observatório Europeu para o Audiovisual, os sete filmes mais vistos de sempre em Portugal, foram apoiados pela SIC na sua exibição em sala. O director-geral do canal de Carnaxide, Bastos e Silva, fez questão de lembrar, no seu discurso da assinatura do protocolo com o Fundo de Investimento para o Cinema e Audiovisual (FICA), em Julho de 2007, que em relação a O Crime do Padre Amaro e o Filme da Treta a "SIC teve um envolvimento decisivo na sua produção".

O responsável recordou ainda que a parceria do canal com o ICAM (Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia) deu origem à SIC Filmes, responsável por 21 telefilmes. Na época, 1998, um dos mentores desta iniciativa era Manuel Fonseca, curiosamente hoje à frente dos destinos da VC Filmes.

A SIC, em conjunto com as principais operadoras de televisão, foi convidada pelo ICA (Instituto do Cinema e Audiovisual) para integrar, enquanto sócio fundador, o FICA, entidade que financia e desenvolve a indústria do audiovisual. Com A.B.F.

DN, 14-3-2008
 
"Branqueamentode Salazar até já o fez antifascista"

FRANCISCO MANGAS

Entrevista. MANUEL LOFF, HISTORIADOR

No seu livro O Nosso Século é Fascista! - O Mundo Visto por Salazar e Franco analisa as ditaduras ibéricas. Houve mesmo fascismo em Portugal?

É claro que houve fascismo em Portugal. O salazarismo foi a adequação que as direitas portuguesas fizeram de um modelo fascista à conjuntura portuguesa. Neste livro sustento que o salazarismo é claramente o fascismo.

António José de Brito, que se assume como fascista e de extrema-direita, diz que há apenas afinidades entre o Estado Novo e o fascismo.

A ultradireita do regime defende isso. Não nos esqueçamos de que Jaime Nogueira Pinto sustentava a tese, em 1971 ou 1972, de que Marcelo Caetano era um criptocomunista… Melhor que António José de Brito, José Hermano Saraiva, em determinado momento, chegou a dizer que Salazar teria sido um antifascista, porque teria mandado prender fascistas. O Hitler mandou matar nazis, não é nazi, está visto; Estaline mandou matar 700 mil comunistas, entre 36 e 38, então não é comunista. Isto é absurdo, é óbvio que a pluralidade interna do regime incluía sectores, sobretudo da área intelectual e sectores de uma pequena burguesia mais moderna que do ponto de vista cultural imitava directamente o caso italiano ou caso alemão.

E queriam um regime mais radical?

Queixaram-se da falta de solidez ideológica do regime e consideraram, por exemplo, que Salazar era contra-revolucionário. Salazar falou da revolução a vida toda! O 28 de Maio não era outra coisa senão uma revolução nacional: o ditador recordou nos anos 30 e anos 60, durante a Guerra Colonial, que era necessário restaurar o espírito do 28 de Maio. Uma das coisas que procuro analisar neste livro, no capítulo da natureza ideológica, é como o salazarismo se descreveu a si próprio como o novo, o revolucionário, o moderno. Evidentemente não cumpriu todas as expectativas daqueles que queriam mudança mais radical.

Em que base se apoia Salazar para dizer que o seu século, o século XX, era fascista?

Salazar usa outra fase: diz que existe uma linha geral europeia que os triunfos da Alemanha nazi e da Itália fascista têm vindo a consagrar. Salazar não gosta de utilizar o termo fascista, porque sabe que está a usar um termo criado por estrangeiros, e um ultranacionalista não gosta de dizer que o seu regime é uma imitação. Portanto, fala de um nova ordem, como falavam também Hitler, na Alemanha, Mussolini, em Itália, e Franco, em Espanha. A transformação que a Alemanha estava a produzir na Europa, entendia Salazar, iria consagrar o triunfo dessa via. As direitas ibéricas imaginaram no triunfo da Alemanha uma espécie do fim da história: o triunfo definitivo para o resto do século daquilo que seria a nova ideologia.

Essa ilusão esvai-se com a derrota da Alemanha.

Podemos chegar um bocadinho para trás. Em 1943, Salazar arrasta os pés, mas é obrigado a ceder as bases dos Açores. A situação militar na Europa já é muito diferente; e o predomínio anglo-americano nos mares e no Atlântico, em concreto, é tão esmagador. Salazar não tem outra saída: para sobreviver terá de ceder e criar a ilusão de que nunca foi fascista.

É uma mudança de discurso?

Sabemos que as mudanças em 1945 são cosméticas, ele não altera nada de estrutural no seu regime. Sabe, no entanto, que não há mais perspectiva de que as suas ideias vão vingar à escala internacional. Em Portugal conseguirá manter mais 30 anos do regime.

Quais são as provas documentais que analisou para o ajudarem a definir a natureza "intrinsecamente fascista das duas ditaduras ibéricas"?

No caso português, analisei documentação diplomática portuguesa e política produzida dentro do Governo português, na maior parte dos casos documentos confidenciais até agora desvalorizados. Quis perceber aquilo que até agora ainda não tinha sido feito na historiografia portuguesa: ver como é que Salazar imaginou, nos anos do triunfo fascista, o que seria o mundo. É aí que eu apanho estes documentos surpreendentes: o seu embaixador em Berlim, Tovar de Lemos, diplomata de carreira, um homem intrinsecamente salazarista, definiu no fim de 1941 que se havia regime na Europa com mais semelhanças com o regime nazi esse regime era o português.

Após 1945, Oliveira Salazar muda de discurso, pelo menos a nível externo. A nível interno, a violência permanece?

A violência não volta a assumir o mesmo nível que teve nos anos 30 e anos 40 até às eleições de Humberto Delgado, em 1958 - esse é um dos momentos de grande violência. Outra das características abertamente fascista do regime é que o grau de violência no final dos anos 30, período da Guerra Civil de Espanha, é o mais forte de toda a ditadura à escala portuguesa actual porque, evidentemente, não podemos esquecer a Guerra Colonial: os africanos sofreram muito mais violência a partir de 1961. O Tarrafal, não nos esqueçamos, é aberto em 1936, e é designado como campo de concentração.

DN, 23-6-2008
 
AFINAL, SALAZAR TINHA VIDA AMOROSA

PAULA BRITO

Primeiro a minissérie, em Setembro, depois o filme sobre a vida íntima e amorosa de um homem que gera, ainda hoje, ódio e amor. Foi justamente o amor de quatro mulheres com quem o governante privou que fez a SIC e a VC Filmes revelarem 'A Vida Privada de Salazar'

O homem que durante 40 anos conduziu os destinos do País tinha, afinal, uma vida privada cheia de paixões. Os seus biógrafos têm-no dito, sobretudo em livro, mas a minissérie para televisão, seguida de filme, produzida pela Valentim de Carvalho Filmes (VC Filmes) para a SIC, vai mostrá-lo.

Já se conhecia o episódio do namoro platónico com a francesa Christiane Garnier, encarnada pela actriz luso-belga Helena Noguerra, que no Verão de 1951 veio a Portugal fazer-lhe uma entrevista e acabou numa longa estada no retiro do Vimieiro. Mas desconhecia- -se-lhe, por exemplo, o relacionamento com Maria Emília Vieira, uma cartomante, encarnada por Soraia Chaves. "Era uma mulher à frente no seu tempo - vestia calças, andava a cavalo no Chiado, fazia tiro ao alvo, ia a bares -, era uma alma livre, segura, mas irreverente, extravagante, boémia. Conhece Salazar porque lhe traça cartas astrais", pois o ditador "recorria a ela para tomar algumas decisões impor- tantes da governação", definiu assim Soraia Chaves a sua personagem.

A actriz que assegura ser este papel tão carregado de sensualidade como os dos seus trabalhos anteriores, confessa que ficou "bastante surpreendida e satisfeita com a personagem". Já em relação ao ditador, protagonizado por Diogo Morgado, salientou esse lado íntimo e desconhecido que os portugueses poderão agora conhecer.

"Maria Emília Vieira adivinhou o atentado de que Salazar ia ser alvo quando ia para a missa", conta um pouco mais Diogo Morgado sobre esta mulher, que ao mesmo tempo é reveladora do lado místico do governante. Quer esta quer as outras quatro mulheres retratadas na produção da SIC "fazem a história evoluir. Cada uma delas chega a um Salazar cada vez mais envelhecido", acrescenta o actor, que diz ser este seu trabalho "curioso e exaustivo". Curioso, porque desconhecia a vida íntima da personagem que encarna, e exaustivo, porque tem feito uma pesquisa igualmente intensa. Dos cinco livros disponíveis, leu "apenas dois" - o de Felícia Cabrita (Amores de Salazar) e o de Fernando Dacosta (As Máscaras de Salazar) -, além de ver o documentário de Inês de Medeiros (Cartas a Uma Ditadura).

À pergunta "o que pensa do ditador?", o actor não responde, alegando que "passou ainda muito pouco tempo". Em vez disso diz que foi estranho ver-se com mais anos em cima, fruto do latex e da maquilhagem de três horas, sobretudo nas cenas acima dos 26 anos, "quando [Salazar] sai de Coimbra e assume a pasta das Finanças".

Do elenco desta minissérie que passa por quatro épocas, que vão dos anos 20 à década de 50 do século passado, fazem ainda parte Cláudia Vieira, Margarida Carpinteiro, Maria João Pinho, Catarina Wallestein, Virgílio Castelo, Filipe Vargas, Benedita Pereira, Ana Padrão, entre outros, num total de 40 actores. A realização está a cargo de Jorge Queiroga, a produção é de Manuel S. Fonseca (entrevista na página ao lado). A história é de Pedro Marta Santos, que também participou no argumento com António Costa Santos.

A série A Vida Privada de Salazar, composta por dois episódios de 90 minutos cada, tem estreia prevista para o final de Agosto ou princípios de Setembro. "Uma série desta natureza ensina-nos a olhar para as grandes figuras da história portuguesa, tendo esta marcado para o bem e para o mal, além de que nos dar a conhecer um modelo de sexualidade masculina e do seu impacto em mulheres de diferentes condições sociais e diferentes personalidades", defende Manuel S. Fonseca.

O filme chegará às salas em 2009. E "não se trata da mesma história condensada", defende Jorge Queiroga, adiantando que tem duas lógicas narrativas diferentes. "A perspectiva da minissérie é dada por uma mulher [Maria João Medeiros] e no filme, com cenas adicionais, haverá outro olhar..."

Grande investimento

Destacando o apelo crescente que a marca Salazar tem gerado junto do público, Nuno Santos, director de Programas da SIC, elogia o trabalho dos actores, extensível às equipas de maquilhagem e guarda-roupa. Os mesmos elementos são destacados por Manuel S. Fonseca, que salienta a importância da pesquisa e o trabalho em parceria com a SIC. "A SIC foi absolutamente decisiva no guião ou na escolha do elenco."

Relativamente a investimentos, quer a SIC quer a VC Filmes apenas salientam o apoio do Fundo de Investimento para o Audiovisual (FICA) além dos capitais próprios, sem revelar valores.

Esta produção, incluída num conjunto de quatro projectos, fruto de acordo com a VC Filmes (2008 a 2010), "abre um novo ciclo de programação que se inscreve na linha de recuperação da SIC", define Nuno Santos.

DN, 22-7-2008
 
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