07 dezembro, 2007

 

7 de Dezembro


Dia de Timor-Leste




http://pt.wikipedia.org/wiki/Timor-Leste
http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/infotimor.html
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http://timor2006.blogspot.com/
http://timor.no.sapo.pt/
http://www.timor-online.blogspot.com/

http://www.portugaldiario.iol.pt/consola.php?tipo=1&art_id=916020&pagina=2&mul_id=4838743

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Comments:
A vida para além de Reinado

PEDRO ROSA MENDES, em Díli

Atentados alteram quadro político timorense

A sala do Conselho de Ministros no Palácio de Governo, em Díli, e a cafetaria do Hotel Timor, antro oficioso da política do país, fervilhavam ontem com a mesma dúvida existencial que ocupa, e divide, as opiniões tanto do "povo kiik" timorense (a arraia miúda, em língua tétum) como da elite que governa o país, a saber: o que aconteceria, e com que gravidade, se o major levasse um tiro.

Alfredo Reinado levou um tiro, ironicamente disparado por um elemento da sua antiga unidade, a Polícia Militar. E agora? É desta perspectiva - a do atirador potencial, mesmo que ninguém cometa o indecoro de o dizer alto - que todo o país, afinal, olhava para Alfredo Reinado.

Foi possível ouvir, na classe política timorense, nos assessores internacionais e no aparelho judicial, ao longo do dia de ontem, as reacções que correspondem ao que cada um pensava, afinal, do major. "No final do dia, com Xanana ileso e Ramos-Horta fora de perigo, o que Timor-Leste resolveu foi um dos problemas que impedia a resolução da crise", comentava um assessor estrangeiro do Governo.

"O caso judicial (contra Alfredo Reinado) está fechado por ordem divina", comentou, lacónico, um jurista do Ministério Público, depois de a morte do militar ter sido oficializada. Outros comentadores eram mais apreensivos, avançando com a tese, que sempre prevaleceu na estratégia do Estado com Reinado, segundo a qual a morte do major vai libertar forças que apenas ele controlava.

É para este último cenário que o aparelho de segurança timorense e internacional foi preparado: uma presença policial e militar potente, visível nas ruas.

Para o confronto previsível entre forças da ordem e agentes de desestabilização, há apenas uma referência: 3 de Março de 2007, ataque por tropas australianas a Same (Sudoeste) contra Reinado, que escapou, e que desencadeou em Díli uma onda de violência.

Nessa noite, dois pelotões operacionais da GNR serviram para controlar a situação, sem aliás, "nunca ter permitido que a desordem ganhasse a mó de cima", como recordou ontem um oficial das forças internacionais.

Não começaram ontem, com o duplo ataque contra José Ramos-Horta e Xanana Gusmão, as especulações e análises sobre se há vida em Timor- -Leste para além da morte do major rebelde, ex-comandante da Polícia Militar. Em abono da verdade, é essa a questão - ou o cálculo, porque se trata de política e de segurança - que ocupa toda a gente que é alguém em Díli, desde, pelo menos, a crise de 2006.

A generalidade dos comentadores ouvidos pela Lusa, dentro e fora da classe política, concordam que a paisagem política timorense não será a mesma sem Alfredo Reinado - o "joker" imprevisível num "jogo" de poker estratégico onde nunca é claro quem está sentado à mesa, como explicava recentemente um assessor de defesa australiano em Díli.

Reinado nunca foi eleito, sempre foi nomeado. Era, portanto, impossível avaliar o seu peso eleitoral. O "eleitorado" potencial de Alfredo Reinado situava-se numa balança diferente: a de uma camada jovem que, com uma franja alienada dos veteranos da resistência, o tinha como herói rebelde e que podem, agora, tentar vingar nas ruas a morte do seu ídolo ou do seu peão.

O desaparecimento de Alfredo Reinado concretiza um dos cenários que, em termos teóricos, sempre esteve em cima da mesa durante os quase dois anos em que o Estado timorense procurou resolver o caso do major rebelde.

Alfredo Reinado morreu cerca de 45 minutos antes de o próprio Presidente da República ter sido alvejado com três tiros. Entre os dois tiroteios que houve na residência do chefe de Estado, nenhum sinal de alarme foi dado a partir dela.

Surpreendidos pela ausência de Ramos-Horta na residência, os homens de Reinado "arrombaram várias portas a pontapé, à sua procura", relatou fonte oficial. Não o encontraram - e não se sabe o que fizeram na meia hora seguinte.

Nem se sabe por que razão não foi lançado um alerta de segurança que impedisse o ataque, 01.30 depois, ao primeiro-ministro Xanana Gusmão. São outras tantas perguntas sobre a capacidade de Timor-Leste lidar com o legado póstumo de Reinado.

DN, 12-2-2008
 
CINZAS E NEVOEIRO NA POLÍTICA TIMORENSE

António Perez Metelo
redactor principal

No auge da crise político-militar de meados de 2006, Xanana Gusmão sai do seu Palácio das Cinzas e dirige-se à multidão exultante, concentrada na praça central de Díli: "Ganhámos porque fomos mais espertos!" O que tinham ganho era a demissão de Mari Alkatiri da chefia do Governo. A quem Xanana erguia o braço triunfante era o tenente peticionário Gastão Salsinha. O mesmo que, agora, o tentou matar.

O outro fugitivo, Alfredo Reinado, celebridade internacional via media australianos, andava há mais de um ano a ser protegido pelo actual Presidente da República, José Ramos-Horta, da execução de uma ordem de captura emitida pelo tribunal de Díli. Inúmeras foram as diligências de mediação para convencer Reinado e as duas dezenas dos seus irredutíveis armados a entregaram-se à Justiça pelos crimes de Maio de 2006 de que vêm acusados. Tudo em vão. E é o próprio Reinado quem conduz o comando de ataque a Ramos-Horta.

Os operacionais do golpe-por-etapas- -em-câmara-lenta, iniciado em Abril de 2006, viraram-se, agora, contra os líderes políticos, que lhes deram cobertura política. Porquê? Ou se trata de tresloucados com delírios de poder ou se adensa o nevoeiro de uma luta política opaca, que substitui a luta democrática nas urnas, pela conspiração golpista, nostálgica das figuras míticas dos guerrilheiros do passado.

A resultante conduz sempre ao mesmo: declarar Timor-Leste um Estado falhado, incapaz de se autodeterminar, dependente de um protector amigo...

DN, 12-2-2008
 
O major rebelde que provocou dois anos de instabilidade

LUÍS NAVES

Desertor desde 2006, Alfredo Reinado era um mito imprevisível

A figura do major Alfredo Reinado era tão complexa que quase se torna incompreensível. Citando uma frase que Winston Churchill aplicou à Rússia de 1939, Reinado era uma "adivinha, embrulhada num mistério, dentro de um enigma". O mais difícil, nesta personagem, é encontrar sentido nas suas acções.

Sabe-se que o major rebelde tinha à volta de 40 anos, que gostava de fardas, que se dizia insubmisso. Porque ninguém quebrou o grupo por ele liderado, mereceu a admiração incondicional de muitos jovens desenraizados. Mas a sua agenda política continua incoerente e apenas ele a parecia compreender. Haverá também motivações sociais na base de alguma simpatia popular, mas nada de concreto.

A carreira deste desertor golpista, fanfarrão, "rambo" sem causa acabou ontem de manhã em Díli (madrugada em Lisboa), num tiroteio cujos detalhes são tão contraditórios como era o actor principal do drama. Foi pela violência que este major da polícia militar se tornou famoso, em 2006, ao criar uma crise que levou à queda do Governo liderado por Mari Alkatiri, o qual pouco antes negociara um acordo petrolífero com a Austrália, em termos muitos favoráveis para Timor.

A violência estalou em Abril de 2006, com um incidente envolvendo os chamados peticionários (600 homens que tinham sido expulsos das forças armadas). Reinado desertou nesse altura, com 20 dos 33 efectivos da unidade que comandava. E tentou tornar-se rapidamente o líder de um grupo vasto de homens armados, que incluiria os peticionários. Na qualidade de rebelde, Reinado iludiu as forças internacionais (militares australianos), foi preso pela GNR e depois fugiu da prisão, guardada por australianos. Enquanto esteve nas montanhas, encontrou-se com o então presidente Xanana Gusmão. Passados dois anos, apenas no mês passado, Reinado acusou Xanana de ter sido o "instigador" da crise de 2006.

A relação com as vítimas de ontem sempre foi enigmática. A queda de Alkatiri tirou a Fretilin do poder. Reinado conhecera na Austrália, nos anos 90, o homem que ontem tentou matar José Ramos-Horta. Foi por intermédio do futuro presidente que o major entrou na resistência. No passado, servira, com sofrimento, como transportador das tropas indonésias.

Para conhecedores da actualidade timorense, Alfredo Reinado não era suficientemente "inteligente" para ser ele o verdadeiro autor das suas façanhas. Há quem diga que era "facilmente manipulável" e há quem use, para o definir, a palavra "marioneta".

Neste "teatro de sombras" da política timorense, Reinado era a carta vinda do nada e usada em momentos propícios para manter a efervescência. O Governo tentou negociar com o rebelde, numa estratégia de dividir peticionários e desertores. Isto, aparentemente, exacerbou o conflito. Além das acusações de homicídio (no ataque de Fatuahai contra viaturas das Falintil, em 2006), Alfredo Reinado era acusado de deserção e rebelião. Muito pouco para justificar o mito.

DN, 12-2-2008
 
Timor pede soldados, Austrália acrescenta polícias

PEDRO ROSA MENDES, em Díli

Ataques provocam reforço de presença australiana

Dois aviões militares australianos aterraram ontem à tarde em Díli, com o reforço do contingente da Austrália em Timor-Leste. Um dos aparelhos trazia soldados. No outro vinham polícias.

O duplo pacote reflecte uma abordagem nova sobre a utilização da Polícia Federal Australiana (AFP) como instrumento de política externa de Camberra - com uma "citação" directa da GNR portuguesa em Timor-Leste enquanto modelo operacional.

Este reforço do contingente australiano acontece na sequência do duplo atentado contra o Presidente da República e o primeiro-ministro, segunda-feira.

A Austrália desembarcou ontem em Timor-Leste 200 soldados das Forças de Defesa (ADF), na maioria provenientes de uma Companhia de Caçadores do 3º Regimento Real Australiano (RAR).

Pouco antes tinha aterrado no aeroporto internacional de Díli a guarda-avançada do reforço australiano: 30 elementos da AFP, oferecendo uma imagem literal da nova abordagem dos contingentes policiais como instrumento directo de projecção da força e dos interesses de um país no exterior.

A Austrália, através do Grupo de Intervenção Internacional (IDG), é pioneira desta transformação da manutenção de paz clássica para um novo tipo de contingentes em que a polícia está inserida no grupo militar, como é o caso do reforço que ontem chegou a Díli.

O governo do ex-primeiro-ministro John Howard operou a transformação do IDG numa ambiciosa força paramilitar, com um investimento de quase 500 milhões de dólares australianos nos próximos 5 anos.

No final de 2008, o IDG terá uma força total de 1200 homens, equipados com material bélico pesado e meios de desembarque fora da Austrália, incluindo veículos blindados de transporte de tropas. A expansão do IDG absorve um terço do orçamento anual da AFP.

A AFP está, ou esteve recentemente, em missões no Iraque, Afeganistão, Sudão, Chipre, Camboja, Ilhas Salomão, Vanuatu, Nauru, Tonga - e Timor-Leste, o segundo maior contingente da AFP no exterior.

Fontes do Governo timorense e da Missão Integrada das Nações Unidas em Timor-Leste (UNMIT) afirmaram ontem, sob anonimato, que "a Austrália aproveitou o pedido timorense de ajuda militar para enviar também um contingente policial que não estava pensado inicialmente. Aconteceu o mesmo em 2006".

Na carta assinada em nome dos órgãos de soberania de Timor-Leste, o Estado pediu à Austrália "assistência na segurança", nomeadamente das ADF.

A carta, com três assinaturas, inclui também um pedido de "uma contribuição separada de polícia", com elementos da AFP.

O ministro dos Negócios Estrangeiros timorense, Zacarias da Costa, explicou ontem que, na realidade, Díli aceitou o que Camberra sugeriu, formalizando o "pedido". "Para ser mais preciso, foi Camberra que ofereceu. Não fomos nós que pedimos. A Austrália voluntarizou-se para apoiar imediatamente na sequência dos incidentes. Agradecemos muito esse apoio", disse Zacarias da Costa.

"Disseram-nos que estavam prontos e depois concordámos apenas com a vinda. Falámos primeiro de reforço militar e depois a polícia foi uma oferta deles", acrescentou.

Esta atitude política, reflectida no conceito de "interoperacionalidade" da ADF e AFP, não é estranha para analistas e académicos que, na Austrália, têm seguido a "transformação da AFP em instrumento de política externa" e publicado ensaios e livros.

A expansão da AFP e a musculação do IDG numa força com capacidade militar foi, aliás, objecto de uma comissão de inquérito no Senado australiano.

A colocação em prática da AFP em cenários de "desestabilização" levanta problemas acrescidos no caso de Timor-Leste, segundo o académico Andrew Goldsmith, da Universidade de Adelaide, que lidera há 3 anos um estudo co-financiado pela AFP sobre a expansão da instituição.

"A Austrália enfrenta uma percepção na região de ser uma espécie de Grande Irmão simbólico", disse no Senado australiano e concluiu: "O envolvimento australiano no petróleo e gás de Timor tingiu a nossa capacidade de operar tão eficazmente quanto gostaríamos em Timor-Leste."

O desembarque de ontem foi precedido pela chegada a águas timorenses da fragata HMS Perth, com 150 homens.

DN, 13-2-2008
 
Díli defende inquérito internacional à crise

LUÍS NAVES

Parlamento aprova estado de sítio por mais dez dias

O Parlamento timorense aprovou ontem o prolongamento do estado de sítio por mais dez dias, decisão que cabe ao Presidente interino, Fernando "La Sama" Araújo, já em funções. Na votação participaram apenas 44 dos 65 deputados eleitos. A Fretilin, na oposição, absteve-se, alertando para a ausência de um relatório sobre a situação do país, ao fim de dois dias de estado de sítio.

Fernando "La Sama" defendeu entretanto a constituição de uma comissão de inquérito internacional aos incidentes de segunda-feira. As autoridades timorenses contam com apoio explícito do Governo português.

Durante a viagem para Dili, proveniente de Lisboa, o Presidente interino afirmou à Lusa que a acção do grupo liderado por Alfredo Reinado foi uma "tentativa de golpe de Estado muito grave, que tem de ser investigada". Segundo disse, o diálogo terminou e todos os rebeldes terão de entregar as armas.

Para participar na comissão de inquérito, Fernando "La Sama" Araújo sugeriu, além de Portugal, Reino Unido, Indonésia e Filipinas. Lisboa já respondeu. O Presidente interino pediu a participação da GNR no inquérito e o ministro da Administração Interna, Rui Pereira, explicou ontem estar disposto "a responder sim ao pedido e, no âmbito do contingente da GNR, criar valências que ajudem a desenvolver a investigação criminal".

O chefe da diplomacia portuguesa, Luís Amado, elogiou na Assembleia da República a ideia de uma comissão internacional de inquérito. Na opinião do ministro dos Negócios Estrangeiros português, "o que se passou em Dili, do ponto de vista de um pequeno Estado em formação, tem de ser avaliado até às últimas consequências". O chefe da missão das Nações Unidas em Dili, Atul Khare, também já se pronunciou a favor.

Refira-se que no duplo atentado do grupo do major Reinado, na manhã de segunda-feira (na noite de domingo, em Lisboa) ficou gravemente ferido o Presidente timorense, José Ramos-Horta, que teve de ser hospitalizado em Darwin, na Austrália.

Depois do Governo de Xanana Gusmão ter decretado o estado de sítio, com o respectivo recolher obrigatório, não houve mais violência, mas a tensão permanece na capital. O velório do major rebelde atraiu uma multidão considerável. As pessoas gritaram vivas e mostraram grande emoção, sobretudo quando o caixão foi aberto. O enterro de Reinado estava previsto para quinta-feira às 10 horas, madrugada de hoje em Portugal.

O corpo de Reinado foi levado para a casa da família adoptiva sob protecção da GNR. Junto, estava o caixão de um elemento do seu grupo, Leonardo, também abatido na segunda-feira. Os dois homens eram de Maubisse, mas o enterro não se iria realizar naquela vila, pois podia haver distúrbios, incluindo a possibilidade de rapto do corpo.

DN, 14-2-2008
 
Um herói muito relutante

FERNANDA CÂNCIO

Um herói muito relutante

"Estão a concentrar tudo em mim mas foi um trabalho de equipa", diz

Podia ser uma manhã como as outras, num dia como os outros - como os outros desde 4 de Janeiro, bem entendido. Foi quando Jorge Marques chegou a Díli , depois de dois dias de viagem. Uma semana para habituar o corpo às nove horas de diferença e ao calor, muito calor, e muito húmido, de Timor. Para um alentejano como ele, explica, o calor não faz diferença. A humidade sim - "Custa muito a fazer tudo, nos primeiros dias. E o jet lag é terrível... Levamos umas boas duas semanas a habituar-nos." Isso já lá ia, felizmente, a 11 de Fevereiro, segunda-feira, sete da manhã, quando uma comunicação para o quartel da GNR, onde este enfermeiro do Instituto Nacional de Emergência Médica está 24 horas sobre 24 horas em prevenção, alerta para "uma troca de tiros na Areia Branca". A Areia Branca é uma praia onde Jorge Marques já foi com alguns membros do contingente. Uma praia junto à casa do presidente de Timor, José Ramos-Horta.

O resto é já história - daquela que às vezes aparece com agá grande. É por esse motivo que no meio da conversa o enfermeiro de 38 anos, que desde Dezembro de 1990 trabalha no hospital de Portalegre (agora renomeado "Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano"), faz alto. "Há uma coisa que me tem incomodado um bocadinho. Estão a concentrar as atenções todas em mim e tudo isto resultou de um trabalho de equipa, só com esse trabalho é que se conseguiu socorrer o presidente. Se vai escrever sobre isto e fazer um artigo grande, queria que frisasse esse aspecto."

A lealdade ao colectivo rima com a admiração pelo "espírito de grupo" do subagrupamento presente em Timor, uma das coisas que Jorge Marques guarda mais intensamente desta experiência. Isso e a realidade que encontrou nos campos de refugiados de Becora, Comoro e Metinaro, onde a GNR tem "um plano de assistência". "Nunca me tinha deparado com isto, uma pessoa demora um bocadinho a habituar-se. Encontramos lá o pessoas com muitas doenças infecciosas e muitas lesões associadas às condições em que vivem... Malária, dengue, feridas, úlceras na pele." Muitas pessoas, metade delas crianças, a viver em péssimas condições. "Não faço ideia dos números concretos, duvido que alguém os tenha. A situação não é tão boa como nós, portugueses, desejávamos. É um povo que necessita de muita coisa ainda até ficar em condições de tomar conta de si, que está a começar a procurar o caminho da sua organização democrática."

Apesar do choque causado pela realidade dos campos, não esperava encontrar uma situação muito diferente. "Já tinha alguma informação, de pessoas dos bombeiros que tinham cá estado." Mas confessa nunca ter esperado algo como aquilo em que esteve envolvido na manhã de 11. "A minha opinião é a de um leigo, mas muito francamente nada me fazia prever que houvesse uma situação destas. Uma coisa com esta violência sobre dois símbolos do Estado não esperava." Assume "uma certa amargura, algum desalento". Afinal, como a maioria dos portugueses, Jorge Marques torceu apaixonadamente por Timor durante anos - e durante o decisivo processo de 1999.

Convidado pelo INEM para participar na missão - não há voluntários nestas situações, mas convites efectuados pela instituição a quem reúne as condições necessárias, e Jorge Marques, fazendo parte da equipa da viatura médica de Portalegre, era um candidato adequado -, aceitou no mesmo dia. "Só não disse logo que sim porque tinha de falar com a minha família". As saudades da mulher e "das duas crianças muito pequenas" apertam e tão depressa não se vê a largá-las. "Daqui a uns tempos, desde que não seja muito em breve, voltaria com gosto. Mas primeiro tenho de matar as saudades..."

De regresso marcado para 20 de Fevereiro, com os outros membros da equipa do INEM, a médica de Penafiel Fátima Santos e o técnico de emergência médica do Porto Márcio Moreira, Jorge Marques leva também na bagagem uns rudimento de tétum - e algum desembaraço no tetunhol que faz a ponte entre portugueses e timorenses. E a memória da "adoração pela bandeira portuguesa" de que ali a maioria dá provas, a cada vez que se deparam com ela nos uniformes dos militares. "Estão sempre a pedir que lhes arranjem uma."

DN, 16-2-2008
 
TIMOR: CONFLITOS INTERNOS E INTERESSES ESTRANGEIROS

Barbedo de Magalhães
professor catedrático da Faculdade de Engenharia
do Porto e presidente do IASI

Em 18 de Janeiro de 2008, dia seguinte ao do lançamento do seu livro sobre Timor na Fundação Mário Soares, o autor teve uma longa conversa com o embaixador da Austrália em Lisboa. Preocupado com a situação em Timor, disse ao embaixador que considerava imprescindível que o novo primeiro-ministro, Kevin Rudd, um velho amigo de Timor e um amigo pessoal de Ramos-Horta, controlasse as forças australianas colocadas em Timor, e os seus serviços secretos. De facto, em governos anteriores, estas tinham estado mais ao serviço da Austrália e de interesses económicos de algumas petrolíferas do que da estabilidade e da democracia no novo país.

A ineficácia dos serviços de informações das forças internacionais, quase exclusivamente australianas, que não souberam prever e evitar os ataques contra as duas principais figuras do Estado timorense, nem capturar ou neutralizar os militares que apoiavam o major Reinado, é um sinal de que, até ao dia do atentado, a política herdada do Governo anterior ainda não tinha sido mudada no terreno.

Convém não esquecer que em Março de 2002 o Governo de Howard retirou a Austrália dos tribunais internacionais relacionados com fronteiras marítimas. Em Dezembro desse ano, uma semana depois do MNE Downer ter ameaçado o PM timorense de lhe dar uma lição de política, a casa de Alkatiri foi revistada por um australiano e incendiada. A fúria de Downer contra Mari resultava de este não ceder às excessivas e ilegais exigências australianas relativamente ao petróleo do mar de Timor.

Aos exacerbados interesses económicos estrangeiros soma-se uma diferença de estratégias e um conflito quase permanente entre Mari e Xanana.

Ela vem dos anos oitenta, quando Xanana substituiu a política radical e exclusivista da Fretilin, por uma política mais realista e abrangente, de inclusão de todos os timorenses, mesmo que colaborassem com o ocupante. Nesse quadro assumiu o compromisso de que Timor-Leste não se tornaria numa "ameaça à estabilidade da área" e de que se oporia à eventual tomada de poder por qualquer partido hegemonista e pouco democrático.

A Constituição foi feita para marginalizar Xanana do processo político. Esta marginalização, os conflitos com a Igreja e o clima de medo criado pelo ex-ministro Lobato contribuíram fortemente para a eclosão da crise de 2006. A reacção de Xanana, tipicamente de guerrilheiro, também não foi a mais feliz.

Ao afirmar que o actual governo, de maioria parlamentar, era ilegítimo, Alkatiri continuou a tentar destruir politicamente um líder essencial para Timor. Com isso enfraqueceu a democracia, debilitou o estado e contribuiu para que este ficasse ainda mais dependente de forças e interesses estrangeiros.

(1) Barbedo de Magalhães, António Pinto - Timor-Leste - Interesses internacionais e actores locais. Afrontamento. Porto, 2007

DN, 16-2-2008
 
SOL NASCENTE, TIMOR NEM TANTO

Alberto Gonçalves
sociólogo
albertog@netcabo.pt

Leio num blogue que o reboliço em Timor-Leste é motivado por "alguma coisa" que os portugueses "lá deixaram". O blogue não especifica se se refere a um vírus, a um gene, a uma simples inclinação cultural. Mas já é um favorito ao prémio de originalidade no concurso "Invente Uma Razão para as Regulares Chacinas entre Timorenses".

É que as demais justificações são um bocadinho monótonas. Para o Bloco de Esquerda, a balbúrdia resulta de "interferências externas" e da "instabilidade" perversamente causada pela Austrália. Para o PCP, os timorenses matam-se devido a uma vaga "acção de ingerência externa". Com jeito, isto acaba na típica acusação dos EUA, que mesmo sem tossirem fomentam todos os males da Terra. A dra. Ana Gomes, aliás, comparou o major Reinado (visto pela juventude local enquanto uma espécie de "Che" Guevara) a John Rambo, o que é meio caminho andado.

Confesso: ainda não me decidi se a culpa de o tiroteio ser o passatempo timorense é dos EUA, da Austrália, de Portugal, da Indonésia, do Vaticano ou da Disneylândia. A verdade é uma: a culpa não é dos timorenses. Os timorenses, conforme fomos ensinados desde que os descobrimos, aí por 1991, são umas coisinhas meigas e carinhosas, que gostam de nós e que, espantosamente, chegam a comunicar em português. Não é a tese do Bom Selvagem: apesar de tudo, Rousseau considerava os selvagens gente. E não, não é mero paternalismo: apesar de tudo, Kofi Annan chamou a Timor um "filhinho da comunidade internacional". Portugal, pelo contrário, olha os timorenses como caniches de estimação, tão prontos a seguir estranhos quanto a abanar a cauda se lhes atiramos com retórica oca e boas intenções. Portugal não aprende.

No referendo de 1999, a retórica e as intenções acabaram em massacre. Na festiva independência de 2002, a "mais jovem nação da Terra" comemorou com arruaças, incêndios e o ocasional abatimento do transeunte. Para quem não levita numa nuvem de prosápia, os acontecimentos de 2008 limitam-se a confirmar o peculiar estilo de vida de Timor, repleto de violência e determinado pela miséria, por velhos e internos ódios, pela radical incapacidade de se afirmar um estado de direito e de facto. Se não são características meritórias, são pelo menos características humanas. E se este pormenor não consola nem recomenda os timorenses, pelo menos deveria servir de lição a Portugal. Ao que se vê e ao que certamente se voltará a ver, não serve.

DN, 17-2-2008
 
José Ramos-Horta pretendia antecipar eleições para 2009

PATRÍCIA VIEGAS
Assessora jurídica de Alfredo Reinado foi ontem detida e feita arguida

José Ramos-Horta pretendia antecipar as eleições legislativas e presidenciais para 2009 com ou sem acordo entre a Aliança para a Maioria Parlamentar e a Fretilin.

O chefe do Estado timorense comunicou essa intenção ao primeiro--ministro, Xanana Gusmão, e também ao seu homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, na recente viagem que fez ao Brasil, indicaram fontes diplomáticas ouvidas pela Lusa a coberto do anonimato.

O jornal australiano The Age já tinha citado o secretário-geral da Fretilin e ex-primeiro-ministro timorense, Mari Alkatiri, na semana passada, a falar na hipótese de antecipação de eleições. O seu partido foi o mais votado nas legislativas de 2007 e não reconhece a legitimidade do actual Governo de coligação entre quatro formações (CNRT, PD, PSD e ASDT). Alkatiri também estaria em conversações com José Ramos-Horta sobre uma solução para o futuro do país.

O chefe do Estado timorense, a recuperar no Royal Darwin Hospital, na Austrália, após ter sido baleado duas vezes nas costas pelos homens de Alfredo Reinado, estaria a negociar, juntamente com Xanana, um acordo com os rebeldes.

Estes estiveram na origem da crise que levou à queda do Governo de Alkatiri em Junho de 2006. Afirmavam-se discriminados dentro das Forças Armadas e mudanças. Há quem diga que estariam a obedecer a outro tipo de interesses.

José Ramos-Horta ignorou mandados de captura contra Reinado, morto no ataque à sua casa, em nome da reconciliação timorense. A estratégia foi criticada após os atentados - Xanana saiu ileso de um - tendo sido entretanto emitidos 18 mandados de captura contra os rebeldes que, tudo indica, são agora liderados pelo ex-tenente Gastão Salsinha.

"Foram disparados [há semanas] tiros por Reinado e os seus homens e o contingente australiano retirou-se em concordância com o Governo de Timor-Leste. José Ramos-Horta era partidário de uma solução negociada para a situação. Isso é algo em que o Governo de Timor-Leste tem de reflectir - dado o que aconteceu", disse ontem, citado pela AFP, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Austrália Stephen Smith.

As operações policiais e militares de caça ao homem em Timor-Leste, segundo o Conselho de Ministros, serão conduzidas pelas Forças Armadas e pela Polícia Nacional de Timor. O comando das operações ficará a cargo do chefe do Estado-Maior General das Falintil - Forças de Defesa de Timor-Leste, o brigadeiro-general Taur Matan Ruak.

As operações ficam, assim, fora do controlo das forças internacionais presentes no terreno, ou seja, a Polícia da ONU (UNPol) e as Forças de Estabilização Internacionais (ISF). Gastão Salsinha terá liderado o atentado contra a coluna onde seguia Xanana Gusmão, há uma semana, numa estrada de acesso a Díli.

A primeira detenção conhecida após os dois atentados foi a da assessora legal de Alfredo Reinado. Angela Pires foi ontem detida por ordem do Ministério Público timorense e é arguida no processo que envolvia o ex-militar rebelde. A informação foi confirmada por fonte judicial à Lusa.

O procurador-geral de Timor-Leste, Longuinhos Monteiro, disse aos jornalistas que várias pessoas serão notificadas para interrogatório no âmbito do processo Reinado. O nome de Angela Pires não constava da lista de cinco novos mandados de detenção emitidos quinta-feira pelo juiz daquele processo - uma vez que todos os mandados visavam militares ou polícias. Angela Pires é prima da ministra das Finanças.

DN, 18-2-2008
 
Araújo fixa prazo de um mês para apanhar rebeldes timorenses

PATRÍCIA VIEGAS

Fernando "Lasama" Araújo fixou o prazo de um mês para apanhar os rebeldes que tentaram matar José Ramos-Horta e Xanana Gusmão.

O presidente interino de Timor- -Leste, citado pela ABC News, garantiu que o tempo do diálogo terminou. E, segundo a Lusa, anunciou que peritos do FBI chegam hoje a Díli para ajudar a procuradoria timorense na investigação dos atentados.

Estes tiveram como alvo os chefes do Estado e do Governo timorenses. José Ramos-Horta foi baleado duas vezes nas costas e é hoje submetido a uma quinta cirurgia em Darwin. Xanana Gusmão escapou ileso.

"Os peritos são necessários para efectuar uma investigação profunda", disse Araújo, que ainda não tem definida a forma como as forças portuguesas de investigação da GNR integrarão a equipa de investigação.

"Espero que não os matem", disse o também líder do Parlamento, garantindo que Gastão Salsinha e os seus homens serão alvo de um julgamento e de uma investigação justos.

Salsinha assumiu-se como líder dos rebeldes depois de o major Alfredo Reinado ter sido abatido a tiro na casa de José Ramos-Horta no dia em que ocorreram os atentados. Mas negou ter participado em qualquer tentativa para matar Xanana.

No dia do ataque, o dia 10, o primeiro-ministro timorense terá pedido a ajuda de um helicóptero das forças australianas no terreno, mas não obteve qualquer resposta, segundo indicou o Sydney Morning Herald.

O jornal cita um conselheiro de Xanana, Joaquim Fonseca, que grante que o líder histórico timorense e o seu motorista tiveram, então, de fugir para o mato e apanhar um dos muitos autocarros locais. A informação não foi, porém, confirmada.

Enquanto decorre a caça ao homem em Timor-Leste, sabe-se agora que José Ramos-Horta pretendia antecipar eleições para 2009, bem como amnistiar os rebeldes. A assessora de Reinado, Angelita Pires, foi entretanto libertada sob termo de entidade e residência.

DN, 19-2-2008
 
ONU confirma ligação de ataques a Ramos-Horta e Xanana Gusmão

ABEL COELHO DE MORAIS
FIRDIA LISNAWATI-AP

Os ataques contra o Presidente Ramos-Horta e o primeiro-ministro Xanana Gusmão "estavam relacionados, foram feitos pelo mesmo grupo" e visavam "eliminar" os dois governantes de Timor-Leste.

Esta é a conclusão de uma investigação da Missão das Nações Unidas no território, ontem obtida pela Lusa em Díli, sobre os acontecimentos de 11 de Fevereiro de que resultou a morte do major rebelde Alfredo Reinado, de um dos seus cúmplices e graves ferimentos em Ramos-Horta.

Ontem em Díli, emergiram também novos detalhes sobre os movimentos de Reinado nas horas antes dos ataques. De acordo com fontes da investigação citadas nos media australianos, o líder rebelde esteve reunido com figuras ligadas a partidos políticos e um dos veículos em que estes se deslocavam foi empregue na acção contra Ramos-Horta. O encontro sucedeu em Gleno, a 30 quilómetros da capital, numa casa particular.

Horas depois sucediam os ataques a Ramos-Horta e Xanana, especificando o relatório que Reinado e seis dos seus homens "entraram no jardim do Presidente pelo portão principal", "todos mascarados", com excepção do major. Ao não encontrarem Ramos-Horta, "voltaram ao portão e ficaram na estrada principal", onde se envolvem num tiroteio com a segurança timorense. Aquele e os seus seguranças, apesar de ouvirem os tiros, "continuaram na direcção da residência". A 50 metros desta, apercebem-se da presença dos atacantes, seguindo-se os confrontos em que o Presidente é atingido.

No caso de Xanana, o relatório conclui ter sido a rapidez da acção dos elementos da polícia da ONU integrados na escolta a possibilitar que o chefe do Governo escapasse ao ataque. Segundo a investigação, é à passagem do veículo em que seguia Xanana que vêem "um homem de pé com uma metralhadora" a disparar contra o carro do líder do Executivo. A sua rápida resposta pôs em fuga o atacante, que estava encapuzado.

DN, 21-2-2008
 
Aumenta número de ex-militares que aceita acantonamento em Díli

Iniciativa do Governo timorense começa a produzir resultados

Mais de 500 peticionários, antigos elementos das forças armadas timorenses, estão já acantonados em Díli, segundo notícia ontem divulgada pela Lusa.

O processo de acantonamento dos chamados peticionários iniciou-se em Fevereiro de 2007, a convite do Governo timorense, após quase dois anos de impasse na situação destes ex-militares.

O Governo preparou um local de acantonamento no centro da cidade para receber as centenas de ex-militares que, em 2006, estiveram na origem da crise política e militar que atingiu o território. De 71, no primeiro dia de acantonamento, o número de peticionários chegou ontem aos 557. A parte mais substancial deste grupo chegou de vários distritos nos últimos três dias, transportados ou acolhidos pelas Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste, Polícia Nacional de Timor-Leste, Polícia das Nações Unidas e Forças de Estabilização Internacionais.

Helicópteros da Austrália e Nova Zelândia participaram no transporte de peticionários de zonas mais distantes como Oécussi, um enclave na parte ocidental da ilha.

Uma petição inicial com 159 signatários surgiu em Janeiro de 2006, referindo alegadas discriminações de base regional no seio das forças armadas, de que seriam alvo os militares originários dos distritos ocidentais, ou "loromonu". Na primeira manifestação dos peticionários, como ficou conhecido o grupo de signatários, havia 418 elementos e semanas depois, quando a petição foi levada ao então Presidente Xanana Gusmão, havia 592 assinaturas.

Os peticionários abandonaram os quartéis e o estado-maior das forças timorense decidiu pela sua expulsão, com efeitos a partir de Março de 2006. No mês seguinte, uma manifestação de peticionários em Díli, terminou em violência e desencadeou a presente crise política e militar.

Alguns oficiais juntaram-se mais tarde, a título individual, ao grupo dos peticionários, como os majores Tilman e Tara. Mas o grupo foi alegadamente dirigido pelo ex-tenente Gastão Salsinha, o oficial mais graduado dos peticionários.

Salsinha lidera agora o grupo de homens armados, em número incerto, que, desde a crise de 2006, era chefiado pelo major fugitivo Alfredo Reinado, morto a 11 de Fevereiro no ataque contra a residência do Presidente da República, José Ramos-Horta. - LUSA

DN, 28-2-2008
 
Entrega-se participante no ataque a Ramos-Horta

Governo espera que grupo de Salsinha se entregue pacificamente

António Soares da Costa, um dos principais envolvidos no ataque ao Presidente timorense José Ramos-Horta, admitiu ontem em Díli ter tido envolvimento directo nesta acção protagonizada pelo grupo de militares rebeldes liderado por Alfredo Reinado.

Também conhecido por Susar, Soares da Costa entregou-se sábado à noite em Turiscai, localidade no Sudoeste do país de onde é natural, após mediação de Francisco Xavier do Amaral, que foi o presidente da efémera república proclamada pela Fretilin em 1974 e hoje dirige um partido político, a ASDT.

Falando em Díli, num encontro com a imprensa em que estiveram presentes o primeiro-ministro Xanana Gusmão e o tenente-coronel Filomeno Paixão, responsável pela operação em curso para capturar os militares rebeldes, Susar afirmou ter tido intervenção directa na acção, mas sem entrar em pormenores. Segundo fontes militares australianas, citadas ontem nos media deste país, terá sido Susar a alvejar Ramos-Horta.

O Presidente timorense, numa das suas primeiras declarações em Darwin, disse ter sido alvejado por alguém que era visto com frequência ao lado de Reinado ao longo da crise desencadeada em 2006 pelos militares peticionários. E, de facto, Susar acompanhou, em diferentes momentos, o grupo de Reinado, estando envolvido na preparação da fuga deste da prisão de Díli em Agosto daquele ano.

No encontro com a imprensa, Filomeno Paixão afirmou-se seguro de que o novo chefe dos militares rebeldes, o ex-tenente Gastão Salsinha, acabará por se entregar. "Continuamos a dar tempo ao grupo de Salsinha para reconsiderar a sua postura e tomar uma decisão correcta e pacífica na busca de solução para o seu caso", referiu o oficial timorense.

A rendição de Susar, comandante da guerrilha na época da ocupação indonésia e possuidor de boa reputação como militar, constitui um indicador de que os rebeldes a monte admitem estarem a perderem a sua margem de manobra e preferem negociar a sua entrega. Uma situação que interessa também ao poder em Díli, que evita assim a possibilidade de eventuais conflitos violentos. Até ao momento, entregaram-se 550 dos quase 600 envolvidos nos acontecimentos de 2006, segundo um porta-voz do Executivo timorense.

Outro sinal desta convergência de interesses, foi a divulgação ontem em Díli de um comunicado do Presidente da República interino, Fernando de Araújo, após um encontro em Darwin com Ramos-Horta, em que se pode ler que este último "perdoa ao falecido Alfredo Reinado e pede ao Governo que apoie a sua família".

A. C. M., com agências

DN, 3-3-2008
 
Grande incerteza sobre rendição iminente de Gastão Salsinha

LUÍS NAVES

As autoridades timorenses esperaram anteontem, "a qualquer momento", a rendição do ex-tenente Gastão Salsinha, um dos líderes do grupo que atacou o Presidente José Ramos-Horta e o primeiro-ministro Xanana Gusmão, a 11 de Fevereiro.

Segundo relato do correspondente da Lusa, em Dili, ao longo de segunda-feira chegou a circular a notícia de que a operação de rendição ou captura tinha sido concluída com êxito, mas a informação foi desmentida por uma fonte militar.

O mesmo correspondente, Pedro Rosa Mendes, descreve a cena vivida junto ao Palácio do Governo, em Dili, no final do dia: após as autoridades terem abandonado o local onde tinham esperado a chegada do rebelde, houve um novo rumor de que Gastão Salsinha se tinha entregue numa igreja, em Gleno. De novo, não houve confirmação. "O 'a qualquer momento' sobre a rendição passou, entretanto, a ser perspectivado 'nas próximas 48 horas'", escrevia a Lusa.

"Trabalhamos para reunir as condições para que ele desça [das montanhas]. Constato que ele se mostra cooperativo", dizia ontem o general Taur Matan Ruak, chefe do estado-maior timorense, citado pela AFP, e referindo-se ao antigo tenente, ainda a monte.

O próprio Salsinha confirmou a sua intenção, através de um SMS enviado ao correspondente da agência francesa. Mas a certeza transformou-se de novo numa espera inútil. De qualquer forma, a rendição poderá ocorrer em breve. Salsinha está numa zona de Ermera, de difícil acesso, cercado pelas forças de estabilização internacional.

Gastão Salsinha era o líder dos chamados peticionários, os militares afastados em 2006 do exército, após um motim. O grupo correspondia a um terço dos efectivos e continha elementos que tinham combatido na resistência aos indonésios, daí o seu forte sentimento de injustiça.

O problema dos peticionários nunca chegou a ser resolvido, provocando a desestabilização do país. A dificuldade em reintegrar estes elementos foi um factor decisivo na crise política timorense, ao longo de quase dois anos. Ao chefe do movimento dos peticionários juntou-se aquele que se transformaria no líder rebelde do país, o major Alfredo Reinado, que foi abatido no início dos incidentes de 11 de Fevereiro.

No caso de Salsinha se render em breve, as suas acções poderão ser analisadas por uma comissão internacional de inquérito, cuja formação foi aprovada pelo parlamento timorense, numa resolução aprovada na segunda-feira.

A votação revela um alinhamento partidário surpreendente. A resolução foi aprovada com votos do principal partido da oposição (Fretilin) e do principal partido da coligação do Governo, o CNRT de Xanana Gusmão. Mas votaram contra esta resolução formações que participam na aliança para a maioria governamental, nomeadamente o PD.

DN, 6-3-2008
 
Autor do atentado a Ramos-Horta integra grupo de Gastão Salsinha

PEDRO ROSA MENDES, Díli

Na opinião de Xanana, o militar rebelde "não tem mais opções"

O homem que disparou contra o Presidente José Ramos-Horta há um mês integra o grupo do ex-tenente Gastão Salsinha e está na área de Atsabe, Ermera, disse ontem fonte do Comando Conjunto da operação "Halibur".

Em conferência de imprensa, o tenente-coronel Filomeno Paixão afirmou que "a maioria" dos elementos que atacaram a residência de Ramos-Horta, a 11 de Fevereiro, já se entregou às autoridades. "Faltam uns tantos. Um deles (é) o que pessoalmente atirou sobre o Presidente. Mas sabemos exactamente onde está neste momento", disse o comandante da operação "Halibur". E acrescentou: "Está com o grupo de Gastão Salsinha, para os lados de Atsabe."

Gastão Salsinha, em fuga desde o duplo ataque de 11 de Fevereiro contra Ramos-Horta e o primeiro-ministro, Xanana Gusmão, ainda não se entregou às autoridades. O ex-tenente das Forças Armadas timorenses, líder dos peticionários em Janeiro de 2006, fez um acordo para a rendição de 32 homens e 18 armas, mas sexta-feira pediu mais dois dias ao procurador-geral da República, Longuinhos Monteiro, para reunir os últimos dois elementos do seu grupo.

"Salsinha vai entregar-se em breve. Não vai aguentar a pressão do cerco feito pelos soldados", disse ontem o tenente-coronel Filomeno Paixão.

A operação "Halibur" tem actualmente no terreno quatro companhias com 465 elementos armados, dos quais 300 são soldados das Falintil - Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL) e os restantes da Polícia Nacional (PNTL). Segundo o comando da operação, as forças conjuntas controlam cerca de 30 pontos, concentrados no distrito de Ermera, a partir dos quais são conduzidas patrulhas diurnas e nocturnas.

"As Forças de Estabilização Internacionais (ISF) colaboram e têm coordenação operacional e táctica com as forças do comando conjunto no terreno, participando activamente nesta operação", adiantaram os comandantes da "Halibur".

Filomeno Paixão explicou que as ISF, que têm um pelotão estacionado junto a Maliana (Oeste), ofereceram--se para evacuar soldados timorenses que sejam feridos no teatro de operações. E declarou: "Salsinha prometeu render-se hoje [ontem]. Não temos conhecimento da sua vontade de se render. Ontem, retirou a intenção de se entregar e hoje o procurador-geral da República ia uma última vez a Ermera falar com ele."

Em Darwin, Xanana afirmou que "Salsinha não tem mais opções. A escolha está do lado dele, não do nosso". Lusa.

DN, 11-3-2008
 
Marcelo Caetano tentou matar Presidente José Ramos-Horta

Departamento de Estado dos EUA denuncia violações de direitos humanos no território

O Presidente Ramos-Horta conhecia bem o militar rebelde que disparou sobre ele no ataque de 11 de Fevereiro, segundo o diário The Australian na sua edição de ontem.

Ramos-Horta, que permanece hospitalizado em Darwin, afirmou que o atirador se chama Marcelo Caetano e que fazia parte do grupo do ex-major Alfredo Reinado, assegurou ao diário australiano Arsénio Ramos-Horta, irmão do Presidente. "José reconheceu-o, ele não disse nada quando disparou. O meu irmão foi atingido estava ele a 18 a 20 metros de Marcelo", declarou Arsénio. A ironia da situação é que Ramos-Horta, ferido com gravidade no tronco, seguiu o tratamento de Marcelo Caetano quando este, há de dois anos, foi também ferido por disparos no tronco.

"O Presidente conhecia-o bem. Marcelo foi atingido por uma bala há dois anos na localidade de Tasi Tolu, a oeste de Díli", segundo a descrição do irmão de Ramos-Horta. Quando "foi preciso operá-lo, o meu irmão fez com que ele tivesse os melhores médicos de Díli". Ainda segundo Arsénio, Caetano permaneceu duas semanas em convalescença na casa do irmão.

Num desenvolvimento separado, o relatório do Departamento de Estado dos EUA sobre os Direitos Humanos para 2007 registou múltiplos abusos cometidos pelas forças de segurança de Timor-Leste."Durante o ano, as forças de segurança e outros protagonistas cometeram nove assassínios, um decréscimo de 29 em 2006. Muitas das execuções foram politicamente motivadas", lê-se no documento.

"Houve ocasiões em que elementos das forças de segurança actuaram fora da autoridade do Governo", lê-se no documento, embora afirmando que o poder civil exerceram "geralmente" controlo efectivo sobre as Forças de Defesa e da Polícia Nacional. O relatório destaca "execuções extrajudiciais de motivação política", "uso excessivo da força e abuso da autoridade pela polícia". O relatório refere ainda que "as condições nos campos para deslocados colocaram em risco a saúde, segurança, educação e os direitos de mulheres e crianças".

AFP/LUSA

DN, 14-3-2008
 
Cavaco envia carta a Ramos-Horta

LUMENA RAPOSO

Alfândega australiana não deixou passar os enchidos portugueses

O capitão Martinho, comandante da GNR em Timor-Leste, entregou ontem ao Presidente Ramos-Horta uma mensagem e vários presentes do Chefe do Estado português, Cavaco Silva. O comandante do Subagrupamento Bravo foi recebido pelo responsável timorense no Hospital Particular de Darwin, Austrália.

"Tenho acompanhado a recuperação do atentado de que foi vítima e dou graças a Deus pela melhoria do estado de saúde que tem vindo a registar", afirma Cavaco Silva na carta que, através do capitão Martinho, enviou a Ramos-Horta e em que diz ainda esperar que este "em breve possa regressar a Timor e reassumir a Chefia do Estado".

No final do encontro, durante o qual Ramos-Horta recebeu ainda uma encomenda de vinho do Porto e pastéis de Belém, o capitão disse à imprensa que o Presidente timorense "está bem", "ainda um pouco debilitado, mas psicologicamente tem um discurso coerente e lúcido".

Ramos-Horta esteve "cerca de uma hora" a falar com o militar sobre os atentados de 11 de Fevereiro contra a sua residência - e que quase lhe custavam a vida - e sobre a segurança de Dili.

O capitão Martinho entregou ainda a Ramos-Horta uma outra encomenda, esta do general comandante da GNR, com produtos tradicionais portugueses, entre eles vinhos, queijos, mel e azeite. Em Timor-Leste ficaram os enchidos, que não passaram na alfândega devido ao crivo apertado dos australianos em matéria de saúde pública.

"Diz que este mês ou no que vem estará em Timor", disse o responsável da GNR ao ser inquirido pela imprensa sobre a data do regresso de Ramos-Horta a Díli. Com Lusa

DN, 18-3-2008
 
Ajudar Gastão Salsinha passa a ser "crime"

CADI FERNANDES

Timorense apanhado a ajudar o foragido ex-tenente Gastão Salsinha já sabe: a justiça irá chamá-lo a prestar contas sobre este "crime", como garantiu, ontem, o substituto interino de José Ramos-Horta, ainda em convalescença num hospital de Darwin, Austrália, depois de ter sido vítima de um ataque à saída da sua casa.

Em entrevista conjunta à agência Lusa e à Rádio Renascença, Fernando "La Sama" de Araújo garantiu que o "crime" é extensível aos restantes membros do grupo que, a 11 de Fevereiro, atacou Ramos-Horta. O grupo era chefiado pelo major Alfredo Reinado, que morreu nesse dia à porta do Presidente. "Reinado era o primeiro. Salsinha é o segundo homem neste atentado", referiu "La Sama".

No terreno, prossegue a chamada operação Halibur, verdadeira caça aos antigos peticionários das Forças Armadas timorenses, actualmente um punhado de 20 homens, munidos de outras tantas, ou ainda menos, armas. "É quase certo que Gastão Salsinha está na área de Ermera." Em Ermera ou na próxima Bobonaro.

Na óptica do estadista, que se base nas investigações efectuadas até agora, Reinado tentou um golpe de Estado. Foi nisso que consistiu o atentado de 11 de Fevereiro.

Assoberbadas por esta crise política, as autoridades estarão a esquecer o busílis humanitário: ainda ontem, a ONG International Crisis Group criticou os sucessivos governos de Díli e os dadores internacionais pela pouca atenção dada às cerca de cem mil pessoas deslocadas no país, pouca atenção a que acresce uma falta de segurança quase sem tréguas.

DN, 1-4-2008
 
Xanana avisa que "chegou a hora" de capturar Gastão Salsinha

Os líderes timorenses decidiram que "chegou a hora" de capturar o líder dos militares peticionários Gastão Salsinha, afirmou ontem o primeiro-ministro Xanana Gusmão à agência Lusa.

"Decidimos que já chegou a hora e, a partir do dia 9 (quarta-feira), as forças conjuntas vão começar a operação", declarou Xanana Gusmão à Lusa, na primeira entrevista após os ataques de 11 de Fevereiro.

"Não vai haver mais aquela tolerância. Tem de se dizer à população que já acabou a brincadeira. O Salsinha tem de se render ou expor-se a combate", afirmou o governante.

"Agora já há ordem para disparar", acrescentou Xanana Gusmão, ao falar sobre as regras aprovadas sexta-feira numa reunião entre as chefias das forças de segurança, o Governo e o Presidente da República interino.

O ex-tenente Gastão Salsinha liderou uma emboscada à coluna onde seguia o primeiro-ministro, na manhã de 11 de Fevereiro, pouco depois de um grupo chefiado pelo major Alfredo Reinado atacar a residência do Presidente da República.

Com a morte de Alfredo Reinado nesse ataque, Salsinha passou a liderar o grupo de fugitivos que, há quase dois meses, se tem movimentado nas áreas montanhosas de Ermera e Bobonaro (oeste).

"Vamos pôr de sobreaviso toda a população daquela área, que não deve sair de casa nos dias da operação. Se saírem e forem vistos a fugir das forças, vão ser alvejados", declarou Xanana Gusmão à Lusa.

Ontem mesmo, os comandantes da "Operação Halibur", para a captura de Gastão Salsinha, deslocaram-se a Maubisse (oeste), para participar numa cerimónia religiosa e aproveitar a ocasião "para explicar aos muitos jovens presentes a estratégia das autoridades", afirmou à Lusa uma fonte do Comando Conjunto.

Objectivo semelhante norteou o Presidente interino de Timor-Leste, Fernando "La Sama" de Araújo, num périplo de dois dias do distrito de Bobonaro, quarta e quinta-feira, de helicóptero, contactando populações nas áreas de refúgio do grupo de Salsinha.

Na entrevista de ontem, Xanana Gusmão explicou que a "Operação Halibur" teve três objectivos, o primeiro dos quais era "criar um sentimento de dever comum colectivo das duas instituições perante o Estado", referindo-se à Polícia Nacional e às Falintil - Forças de Defesa de Timor-Leste.

"Devo dizer que conseguimos. Nunca se pensou que as duas forças, que se andaram a matar uma à outra (em 2006), pudessem depois vir a trabalhar em conjunto dessa maneira", salientou o primeiro-ministro.

Outro objectivo cumprido pela "Halibur" foi "reganhar contacto com a população, que, com dois anos de influência do Reinado e do seu grupo, estava um bocado distanciada das nossas forças".

O terceiro objectivo "é exercer pressão sobre o grupo do Salsinha, o que permitiu que alguns elementos se rendessem", acrescentou Xanana Gusmão.

Na sexta-feira, um juiz internacional do Tribunal de Distrito de Díli impôs a medida de prisão preventiva a mais dois elementos do grupo de Gastão Salsinha.

Os dois homens - Alexandre Araújo ("Alex"), da Polícia Nacional, e Bernardo da Costa ("Cris"), das Falintil - Forças de Defesa de Timor-Leste - foram formalmente detidos no acantonamento de peticionários de Aitarak Laran, em Díli, depois de decidirem entregar-se ao Comando Conjunto. Até agora, sete dos oito arguidos no processo relativo ao 11 de Fevereiro estão em prisão preventiva. Apenas Angelita Pires, ex-assessora legal de Alfredo Reinado, aguarda julgamento em liberdade, com termo de identidade e residência.

Hoje, o chefe do Governo tem um encontro com os comandantes da "Operação Halibur" no terreno.

Gastão Salsinha foi o líder dos peticionários das Forças Armadas em 2006 e juntou-se a Alfredo Reinado em Novembro de 2007, numa parada militar em Gleno.

"O 11 de Fevereiro foi um desfecho trágico, em termos do Estado, dos problemas de 2006, que não são (iniciados) a 28 de Abril. Tudo tem de ser compreendido para trás", explicou Xanana Gusmão sobre as raízes dos "atentados" contra o topo do Estado.

"Andámos um bocado a brincar", acrescentou Xanana Gusmão, que entende o 11 de Fevereiro como "um falhanço de liderança em muitos aspectos".

Xanana recusou, no entanto, qualquer comentário sobre as investigações, "que competem às autoridades judiciais".

"Muita gente fala dos mistérios, dos mistérios. Que se desvendem esses mistérios. Eu apenas repito o que as outras pessoas dizem", declarou apenas o primeiro-ministro. P.R.M., LUSA

DN, 6-4-2008
 
Gastão Salsinha rendeu-se e vai ser levado a tribunal

ABEL COELHO DE MORAIS

O último dirigente dos revoltosos timorenses, que se encontrava ainda a monte, o ex-tenente Gastão Salsinha, entregou-se ontem em Ermera com outros 12 rebeldes, tendo sido transportados para Díli onde vão ser interrogados nas próximas horas.

Protegido por forte dispositivo de segurança, que integrava elementos da GNR e do exército australiano, o grupo foi recebido ao final da manhã no Palácio do Governo pelo Presidente Ramos-Horta e pelo vice-primeiro-ministro José Luís Guterres. Estavam ainda presentes o representante da ONU no território, Atul Khare, e o presidente do Parlamento, Fernando Araújo.

Ramos-Horta prometeu na ocasião que "a justiça será feita sem intervenção política". Depois, apertou mãos com Salsinha e também com o revoltoso que o terá alvejado, um ex-militar chamado Marcelo Caetano.

Recorde-se que o militar revoltoso, cuja rendição foi dada como iminente várias vezes, garantira há cerca de um mês que se entregaria após o regresso do Presidente timorense ao território.

Ao início da tarde, os 13 revoltosos, que envergavam uniformes com as insígnias das Forças de Defesa de Timor-Leste (FDTL), estiveram presentes na conferência de imprensa do oficial das FDTL, tenente-coronel Calixto Coliati, que comandou a operação em Ermera. Estava-lhes todavia vedado fazer declarações assim como os jornalistas não lhes podiam colocar perguntas.

O tenente-coronel Coliati sublinhou que o grupo de Salsinha se "rendeu à justiça" e irá agora ser julgado. Segundo apurou a Lusa, cada um dos elementos do grupo vai ser interrogado em separado até amanhã, sendo então transferidos para a tutela da justiça timo- rense.

O representante da ONU no território emitiu um comunicado em que elogia a "maneira tranquila" como a crise foi gerida nos últimos meses. Atul Khare sublinhou a importância da "entrega pacífica" do último grupo de revoltosos e a necessidade da sua conduta ser avaliada pela justiça, destacando depois a importância de se estudarem as formas de "promover a reconciliação".

De facto, apesar do desenlace pacífico da longa crise que se vive em Timor-Leste o território atravessa uma situação de instabilidade social, económica e de deficiente funcionamento das instituições. Um aspecto ontem salientado por Loro Horta, filho do Presidente timorense e analista em questões de segurança e relações internacionais. Numa entrevista à Lusa, deu como exemplo a situação na área da segurança do país, que considerou dependente de uma lógica de senhores da guerra.

Com agências

DN, 30-4-2008
 
Palácio, 'karaoke', prisão: os três dias de Salsinha

PEDRO ROSA MENDES, Díli
Jornalista da Lusa

Mari Alkatiri acordou mal na quarta-feira e quis saber quem tinha feito a "festa de arromba" que não o deixou descansar na véspera, na sua casa do Bairro do Farol. "Informaram-me que tinha sido no comando conjunto, com Gastão Salsinha", contou o secretário-geral da Fretilin.

Salsinha é o principal suspeito (vivo) dos ataques onde quase perdeu a vida o Presidente da República de Timor-Leste José Ramos-Horta. O comando conjunto é a estrutura mista criada para o perseguir e capturar. Após quase três meses de jogo do gato e rato, Salsinha aceitou render- -se a 25 de Abril. O seu grupo desceu a Díli, a 28, segunda-feira. Teve "uma recepção digna de Presidente", ironizou, na cafetaria do Hotel Timor, um jovem timorense ao ouvir os primeiros alaridos de sirenes penetrando a Avenida Mártires da Pátria.

Uma multidão saiu à rua para ver a rendição do homem mais procurado, suspeito de liderar o ataque ao primeiro-ministro Xanana Gusmão e de ser cúmplice do ataque a Ramos--Horta pelo major Alfredo Reinado. A alusão presidencial ao cortejo do ex-tenente Salsinha não é descabida. Um dia depois da rendição, o comando conjunto assinalou o cumprimento da missão com jantar e música, onde oficiais da operação 'Halibur' fizeram o "karaoke" do conhecido tema "Foin Sae Timor Oan" ("A Nova Geração de Timor").

Alkatiri vive a cerca de duzentos metros do quartel-general do comando conjunto. A festa foi forte para ser ouvida através das casas baixas do bairro do Farol. "Muita cerveja, muita música, muita alegria", resumiu um dos participantes à Lusa. Salsinha comeu e bebeu no salão de conferências onde funciona o comando, sentado à mesa dos oficiais, com o comandante da operação, o tenente-coronel Calixto dos Santos Coliati.

"Divertiram-se todos", resumiu o tenente-coronel Filomeno Paixão, primeiro comandante da "Halibur", sobre o convívio de terça à noite. "O que houve é que os membros das forças conjuntas estavam contentes", disse o oficial superior das F-FDTL.

Junto à mesa de Coliati e de Salsinha os fugitivos que se entregaram foram abraçados com emoção pelos elementos da operação de captura.

Cerca das 22h30, Salsinha e o seu grupo recolheram à detenção. A festa continuou no exterior do salão. No dia seguinte, todo o grupo foi entregue às autoridades pelo comando conjunto. Horas depois da entrega ao juiz, Salsinha e cinco dos seus homens foram constituídos arguidos e foram sujeitos a interrogatório.

DN, 2-5-2008
 
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