07 janeiro, 2008

 

7 de Janeiro


Dia da Liberdade de Culto




http://www.netindex.pt/links/POLITICA/RELIGIAO/index.html

http://afilosofia.no.sapo.pt/10valRelig.htm

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SOMOS LIVRES? DETERMINISMO E LIBERDADE

Anselmo Borges
padre e professor de Filosofia

Esta é a pergunta decisiva. De facto, se não somos livres, o que se chama dignidade humana pode ser uma convenção, mas não tem fundamento real.

Mas quem nunca foi assaltado pela pergunta: a minha vida teria podido ser diferente? Para sabê-lo cientificamente, seria preciso o que não é possível: repetir a vida exactamente nas mesmas circunstâncias. Só assim se verificaria se as "escolhas" se repetiam nos mesmos termos ou não.

Não há dúvida de que a liberdade humana é condicionada. Mas ela existe ou é uma ilusão? Não vêm agora neurocientistas dizer que, mediante dados da tomografia de emissão de positrões e da ressonância magnética nuclear funcional, se mostra que afinal as nossas decisões são dirigidas por processos neuronais inconscientes?

De qualquer modo, em 2004, destacados neurocientistas também tornaram público um "Manifesto sobre o presente e o futuro da investigação do cérebro" - cito Hans Küng, no seu Der Anfang aller Dinge (O princípio de todas as coisas) -, revelando-se prudentes no que toca às "grandes perguntas": "Como surgem a consciência e a vivência do eu? Como se entrelaçam a acção racional e a acção emocional? Que valor se deve conceder à ideia de 'livre arbítrio'? Colocar já hoje as grandes perguntas das neurociências é legítimo, mas pensar que terão resposta nos próximos dez anos é muito pouco realista." É preciso continuar as investigações, no sentido de perceber o nexo entre a mente e o cérebro. "Mas nenhum progresso terminará num triunfo do reducionismo neuronal. Mesmo que alguma vez chegássemos a explicar a totalidade dos processos neuronais subjacentes à simpatia que o ser humano pode sentir pelos seus congéneres, ao seu enamoramento e à sua responsabilidade moral, a autonomia da 'perspectiva interna' permaneceria intacta. Pois também uma fuga de Bach não perde nada do seu fascínio, quando se compreende com exactidão como está construída."

A liberdade não é desvinculável da experiência subjectiva, da "perspectiva interna". Essa experiência é transcendental, no sentido de que se afirma até na sua negação. De facto, se tudo se movesse no quadro do determinismo total, como surgiria o debate sobre a liberdade?

Essa experiência coloca-se concretamente no campo da moral e da responsabilidade. Neste contexto, há um célebre exercício mental de Kant na Crítica da Razão Prática, que é elucidativo e obriga a pensar. Suponhamos que alguém, sob pena de morte imediata, se vê confrontado com a ordem de levantar um falso testemunho contra uma pessoa que sabe ser inocente. Nessas circunstâncias e por muito grande que seja o seu amor à vida, pensará que é possível resistir. "Talvez não se atreva a assegurar que assim faria, no caso de isso realmente acontecer; mas não terá outro remédio senão aceitar sem hesitações que tem essa possibilidade." Existem as duas possibilidades: resistir ou não. "Julga, portanto, que é capaz de fazer algo, pois é consciente de que deve moralmente fazê-lo e, desse modo, descobre em si a liberdade que, sem a lei moral, lhe teria passado despercebida."

O que confunde frequentemente o debate é a falta de esclarecimento quanto ao que é realmente a liberdade. Ela é a não submissão à necessidade coactiva, externa e interna, mas não pode, por outro lado, ser confundida com a arbitrariedade e a pura espontaneidade - não implica a espontaneidade a necessidade?

A liberdade radica na experiência originária do Homem como dom para si mesmo.

Paradoxalmente, é na abertura a tudo, portanto, no horizonte da totalidade do ser, que ele vem a si mesmo como eu único e senhor de si. Então, agir livremente é a capacidade de erguer-se acima dos próprios interesses, para pôr-se no lugar do outro e agir racionalmente.

É preciso distinguir entre causas e razões. Quando se age sob uma causalidade constringente, não há liberdade. Ser livre é propor-se ideais, deliberar e agir segundo razões e argumentos, impondo limites aos impulsos, inclinações e desejos, o que mostra que o Homem pode ser senhor dos seus actos e, assim, responsável, isto é, responder por eles.

DN, 23-2-2008
 
Grupo da 'Penthouse'compra 'site' de religião


O 'site' Big Church promove encontros entre solteiros religiosos

"Um homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá a sua esposa, e eles se tornarão um só corpo" (Genesis 24). Esta é a frase, do Antigo Testamento, que procede a pesquisa de versículos no site BigChurch, uma página cujo objectivo é "juntar as pessoas no amor e na fé". O que pode espantar os utilizadores do site é que a empresa que detém a página é a Penthouse Media Group, que publica a revista pornográfica com o mesmo nome, noticia a Newsweek.

É que os tempos em que a Playboy e a Penthouse eram a grande referência da pornografia ficaram para trás, devido à dura concorrência dos sites gratuitos na Internet. Assim, e para diversificar o seu negócio, o grupo detentor da revista pagou cerca de 500 milhões de dólares (317 milhões de euros) para adquirir dezenas de redes sociais na Internet, como BigChurch ou LikeMyNudePhoto.com.

Deste modo, Penthouse passou a ser apenas mais uma marca do grupo, agora centrado na Internet, afirmou o presidente executivo do grupo, Marc Bell. E é por esta razão que o grupo vai mudar de nome nos próximos meses, passando a chamar-se FriendFinder Networks. "A Penthouse não é mais do que outro site na Internet. Estamos no negócio das redes sociais e não no da Penthouse", justifica Marc Bell.

Cheia de dívidas e perto da falência, a Penthouse foi comprada em 2004 por vários investidores, liderados por Bell. Além do site religioso, o grupo adquiriu um conjunto de redes sociais, com um total de 250 milhões de membros registados. Um destes, Bondage.com, soma 1,2 milhões de adultos que pagam religiosamente as suas quotas. No entanto, a "jóia da coroa" é AdultFriendFinder.com, o "maior site do mundo dedicado ao sexo e ao intercâmbio de casais", contando com 18 milhões de membros. - M.J.E.

DN, 26-5-2008
 
Comissão propõe nova disciplina de religiões

PEDRO VILELA MARQUES

Mário Soares quer combater ignorância face à história dos cultos

Alberto Costa volta a alertar para necessidade de concretizar a laicidade

A Comissão de Liberdade Religiosa (CLR) vai propor ao Governo a criação de uma disciplina de história comparada das religiões para combater a ignorância dos portugueses em relação a esse tema. O anúncio foi feito ontem pelo presidente da CLR, Mário Soares, e foi o facto mais marcante do último dia do colóquio internacional sobre o papel das religiões para a paz.

Em resposta a propostas já defendidas pelo cardeal-patriarca de Lisboa e por António Reis, grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, Mário Soares concordou na utilidade do estudo da história dos principais cultos. "É que, apesar de a maioria da população portuguesa ser católica, há uma enorme ignorância face às questões religiosas", constatou o antigo presidente da República. Para Mário Soares, é necessário conhecer a história das religiões, no que têm de bom e de mau, para "se poder digerir os factos e evitar erros do passado".

Antes da intervenção de Mário Soares, António Reis, que também é professor universitário e historiador, defendeu a criação de uma disciplina de História das Religiões na escola pública, mostrando-se preocupado com o crescente "analfabetismo" religioso na sociedade. "A história comparada das religiões deve ser ensinada na escola pública. Partilho a posição de Régis Debray no seu célebre relatório para o então ministro da Educação francês Jack Lang ao propor a introdução de uma disciplina de história comparada das religiões nos currículos oficiais", defendeu António Reis.

O líder maçónico sustentou ainda a ideia de que a laicidade não é património de ateus, agnósticos e não crentes e que a pertença a qualquer confissão religiosa não é antilaica. Definiu o Estado laico como um Estado neutro e "incompetente" em matéria religiosa que "não é crente, não é descrente, é acrente". António Reis rejeitou o papel de um Estado tutor das religiões, considerando inaceitável a proibição, por exemplo, do uso do véu islâmico nas escolas. "Não aceito que por meios impositivos se emancipem jovens contra a sua vontade ou consentimento. Nesse sentido, oponho-me a certas formas radicais do Estado laico, que levam à proibição de ostentar símbolos religiosos ou não religiosos porque é um direito que faz parte da liberdade religiosa. Nestes casos, proibir é tão grave como obrigar", disse.

Mais tarde, na sessão de encerramento do congresso, as palavras do professor universitário tiveram eco no discurso do ministro da Justiça. À semelhança do que o primeiro-ministro tinha defendido no dia anterior, Alberto Costa voltou a defender a independência do Estado em relação a todas as religiões, enquanto defensor da liberdade religiosa e da igualdade entre crentes. "É preciso que a laicidade se concretize, sem religiões mais amigas ou mais próximas ao Estado", alertou o ministro.

DN, 25-6-2008
 
PREDOMÍNIO DA IMAGEM E POBREZA DO SÍMBOLO

Anselmo Borges
padre e professor de Filosofia

No século VIII, no quadro da ameaça militar e religiosa do islão a Bizâncio, a tradição cristã viu-se confrontada com a pureza radical do monoteísmo islâmico e a sua proibição das imagens. Os imperadores bizantinos mandaram destruir as imagens e os seus defensores foram perseguidos como idólatras. Embora esta luta dos iconoclastas tenha acabado com a vitória dos iconódulos (veneradores das imagens), pois Jesus Cristo é a imagem visível de Deus, nunca deveria esquecer-se que Deus é infinitamente transcendente e, se o Homem foi criado à imagem e semelhança de Deus, Deus não é à imagem do Homem.

Diz-se perante certas imagens: vale mais uma imagem que milhares de palavras. Pense-se, por exemplo, naquelas imagens televisivas das crianças esfomeadas na Etiópia -- pequenos andaimes de ossos a soçobrar, num olhar suplicante e quase morto -, e o soco que nos dão no estômago e na alma.

Aqui, porém, do que se trata é da civilização da imagem, daquela civilização que quer a visualização de tudo. Trata-se daquilo para que uma aluna me chamou a atenção. Ela tinha feito um trabalho sobre A Sociedade do Espectáculo, de Guy Debord, um dos breviários da geração de 68, e disse-me: "Viu a transmissão televisiva do funeral do Papa João Paulo II? Aquilo era espectáculo, donde o mistério da morte foi arredado. Logo a seguir, em sequências vertiginosas, lá estavam imagens publicitárias e futebol: tudo o mesmo." Ah! A alienação com o futebol: "pensar com os pés" (Carlos Fiolhais)!

Há perigos na civilização da imagem?

Nela, por paradoxal que pareça, julga-se que se está perante a hiper-realidade, mas o que se vai impondo é o virtual, com a consequente perda da realidade real.

Depois, é isso: a vertigem de imagens e de informações, em voragem. Mas, então, onde está o tempo da possibilidade de distanciamento e de crítica? Ah!, e a própria crítica, se existe, tem de ser dada em espectáculo, dissolvendo-se então com ele e nele, pois, como escreveu José María Mardones, mais do que permitir a reflexão e a crítica, do que se trata é de "seduzir".

Na civilização da imagem, importante não é ser, mas parecer e aparecer. Quem não aparece existe? Por isso, lá dizem os políticos que decisivo é aparecer, nem que seja para dizer mal.

De novo Mardones: o predomínio da imagem, com a pretensão de mostrar tudo, até a interioridade do sujeito, tem outra consequência perversa: "o esvaziamento da intimidade."

O símbolo, esse, abre para a profundidade do real e para o mistério e vincula à transcendência. Na civilização da imagem, onde a realidade é o que se mostra, vive-se na imediatidade do que há, do mercado das sensações, do empírico-funcional, e, portanto, na in-transcendência.

E uma conclusão, que pode parecer abrupta. O Presidente da República espantou-se com a indiferença e distância dos jovens em relação à política. Seja-me permitido espantar-me com o espanto do Presidente. Razão de fundo - não a única, evidentemente - para esse distanciamento está em que o espectáculo da política e dos políticos é muitas vezes deprimente e pouco recomendável.

Depois, há aquela parábola de Arthur Clarke sobre os nove mil milhões de Nomes de Deus, que li citada por Mardones. Havia uma comunidade de monges tibetanos, que tinha a tarefa de reescrever e contar os nomes de Deus. O seu número ascendia a nove mil milhões, rezando a profecia que, cumprida a tarefa, viria o fim do mundo. Ora, aconteceu que os monges se cansaram com a contagem interminável. Então, recorreram aos peritos da IBM. Eles chegaram armados com computadores de último modelo e rapidamente cumpriram a missão. Os técnicos, que não acreditavam em profecias nem nos nomes de Deus, encaixotaram a maquinaria e iniciaram a viagem de regresso. Mas eis que, quando desciam para o vale, começaram a apagar-se o sol e todas as estrelas, uma a uma.

Com o fim do trabalho simbólico e o império da imagem e da técnica, o mundo humano vai definhando. Sem o símbolo, também não há lugar para a religião na sua autenticidade e verdade. Só para a idolatria.

DN, 19-7-2008
 
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