24 janeiro, 2008

 

Os 50 melhores

Da televisão portuguesa

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O QUE FALTA NOS '50 MELHORES' DA TV PORTUGUESA

Eurico de Barros
jornalista

As listas dos "Melhores" - livros, filmes, canções, etc. - são sempre incompletas, subjectivas, esquecidas, distraídas, esburacadas, contestáveis, injustas. É da própria natureza do formato. Não só o gosto, como também a memória, são fundamentais para a elaboração de listas destas. E quando alguém se propõe fazer uma lista dos 50 melhores programas de TV portugueses, é bom que quem esteja metido na empreitada tenha começado a ver televisão muito cedo, tenha sido extremamente voraz e omnívoro, e possua um armazém das recordações bastante grande.

A lista dos "50 mais" da produção televisiva nacional que as Produções Fictícias e aTime Out, associadas aos DN, têm para votação nos respectivos sites (http/pffv.sapo.pt e www.timeout.pt), representa um esforço hercúleo para fazer um apanhado o mais completo possível dos melhores 50 programas falados em português, desde que a televisão começou, há meio século, a iluminar as salas de estar nacionais e a encher os cafés de basbaques.

Inevitavelmente, faltam lá muitas coisas. E o problema parece ter sido mais de memória do que de critério, porque as coisas que faltam são do tempo em que a televisão portuguesa (leia-se: a RTP) tinha muitos defeitos, era censurada e quase heroicamente artesanal. Mas também era orientada por uma noção infinitamente maior e mais formativa de serviço público do que agora, e tinha muito mais sentido da variedade de interesses e gostos dos telespectadores.

Recordem-se as Charlas Linguísticas, do padre Raul Machado, a primeira pessoa a ir à televisão explicar a língua portuguesa aos seus falantes, com uma erudição e uma clareza nunca mais igualadas; Quem Sabe, Sabe, o primeiro concurso televisivo de cultura geral, apresentado por Artur Agostinho, em que se revelou o padre Raul Machado, logo a seguir convidado pela RTP para fazer as suas Charlas; Sangue na Estrada, de Joaquim Filipe Nogueira, o "pai" de todos os programas sobre prevenção e segurança rodoviária, no tempo em que ainda se podia escolher onde estacionar em Lisboa, e nas estradas andava gente de carroça e a cavalo ao lado dos automóveis; Vamos Falar de Saúde, que consagrou o Dr. Ramiro da Fonseca como pioneiro da divulgação televisiva dos temas da saúde familiar e da medicina caseira; Segredos Do Mar, de Hélder Mendes, o que de mais aproximado aos programas do comandante Cousteau se fez na televisão portuguesa; João Villaret, onde o grande actor, encenador e declamador trouxe a poesia dos autores de língua portuguesa ao pequeno ecrã, muito antes de Mário Viegas; Imagens da Poesia Europeia, de David Mourão-Ferreira, que estabeleceu o padrão de como falar de história da poesia (e, por extensão, da literatura) na televisão; ou A Feira e Sabadabadu, variedades e humor pela pena de César de Oliveira, com Ivone Silva e Camilo de Oliveira multiplicando os brilharetes cómicos. E a lista não acaba aqui.

Todos estes programas foram enormemente populares, passando do ecrã para as conversas quotidianas dos portugueses. Mais uma razão para serem resgatados ao esquecimento e lembrados à memória curta.

DN, 24-11-2007
 
'O Tal Canal' é o melhor dos últimos 50 anos

INÊS DAVID BASTOS

Herman José acumula primeiro e terceiro lugares
E o vencedor é... O Tal Canal. O programa humorístico de Herman José, emitido em 1983 na RTP, é o grande vencedor da eleição dos melhores programas de televisão dos últimos 50 anos, promovida pelo DN, revista Time Out e Produções Fictícias, cujos resultados foram ontem conhecidos. O Tal Canal obteve 9,13% dos votos. Na 2.ª posição, com 8,45%, estão os Gato Fedorento, que passaram na SIC Radical e na RTP, e em terceiro de novo Herman, com o Herman Enciclopédia, emitido em 1997 na televisão pública, com 7,49%.

"Estou muito orgulhoso, estou numa fase em que se valoriza o que se fez e na altura O Tal Canal foi feito de uma maneira quase inconsciente, trabalhava de forma solitária, era incompreendido", reagiu Herman ao DN, acrescentando: "vale a pena acreditar nos nossos projectos".

RTP em cima, TVI em baixo

A estação pública é outra das grandes vencedoras, vendo sete programas a pontuarem-se nas dez primeiras posições das preferências dos portugueses, que votaram pela Internet (ver ao lado). Além dos já citados, estão Rua Sésamo (4.º), Duarte & C.a (5º), Contra Informação (6.º), Liga dos Últimos (8.º - passa na RTPN) e a série Portugal, Um Retrato Social (10.º). A SIC conseguiu ver dois programas nos dez mais - A Noite da Má Língua (7.º) e Grande Reportagem (9.º), além de os Gato Fedorento - e a TVI foi a grande perdedora, com nenhum programa no top mais.

O humor é o terceiro vencedor. Dos dez mais, seis são humorísticos: O Tal Canal; Gato Fedorento; Herman Enciclopédia, Duarte & C.a; Contra Informação e A Noite da Má Língua. "São as coisas que ficam na memória das pessoas e é a arte mais difícil", diz Herman José. "Esta é a vitória do humor", disse ao DN Mafalda Mendes de Almeida, da Mandala, produtora do Contra Informação. Também Rui Mendes, protagonista de Duarte & C.a disse-se "muito satisfeito" com o 5.º lugar, afirmando que, depois de mais de 20 anos, é raro o dia em que uma pessoa não lhe fale do programa. "Foi das coisas que mais prazer me deu", disse. Manuel Serrão, uma das figuras de A Noite da Má Língua, disse que "faz falta hoje um programa" daquele género, interpretando o triunfo do humor com o facto de hoje as pessoas "estarem com falta de motivos para rir".

José Alberto Lemos, da RTPN, disse ser "fantástica" a posição da Liga dos Últimos, esclarecendo que o segredo está no facto de o programa "mostrar um país desconhecido".

DN, 12-12-2007
 
'Conta-me como foi' considerado o melhor de 2007

Conta-me como foi, série transmitida pela RTP1, foi eleita o melhor produto da televisão portuguesa em 2007, pela Associação de Telespectadores (ATV). O programa que conquistou o título de pior do ano foi A Bela e o Mestre, da TVI. A RTP2 foi o único canal que só obteve menções de mérito.

A produção que retrata a vida de uma família portuguesa dos anos 60 é, segundo declarações da ATV publicadas pela Lusa, uma "série interessantíssima". A associação destaca a fidelidade na reprodução dos últimos anos do salazarismo, em termos sociais, feita em Conta-me como foi.

A revelação do ano foram os documentários, da RTP1, Portugal - Um Retrato Social e A Guerra. O quarteto humorístico Gato Fedorento recebeu a única menção de honra atribuída em 2007 pela ATV. O pior da RTP1 são os formatos O Preço Certo e Rouxinol Faduncho.

A estação de Queluz de Baixo viu o seu concurso A Bela e o Mestre ser considerado o pior do ano. A associação refere ainda que este é um "programa de baixíssima qualidade, onde os concorrentes se prestam a figuras completamente ridículas".

Menções de mérito receberam também o programa Diário da Manhã, os comentários de Miguel Sousa Tavares e António Perez Metelo e o Cartaz das Artes, da TVI.

A ATV, criada em 1991, avalia todos os meses a programação dos quatro canais em sinal aberto. Rui Teixeira da Mota é o seu presidente.

DN, 12-1-2008
 
SERVIÇO PÚBLICO DE TELEVISÃO

João Miranda
investigador em biotecnologia
jmirandadn@gmail.com

A RTP comprou os direitos de transmissão em canal aberto dos jogos da Liga de futebol. A Administração da RTP, seguindo a lógica das televisões privadas, decidiu dar aos seus telespectadores o entretenimento que eles querem ver. Ao fazê-lo, reconheceu a falência do conceito de "serviço público" de televisão. A RTP foi atrás das audiências, sem as quais não tem como justificar a sua existência, porque percebeu que os programas considerados de "serviço público" (as artes, os documentários, o teatro e o cinema de autor) não atraem público.

Numa sociedade livre, o conceito de "serviço público" de televisão perde qualquer sentido. As pessoas são livres de escolher. Os programadores da televisão pública são forçados a optar entre uma programação de "serviço público", que a maior parte do público não quer ver, e uma programação vulgar que as empresas privadas já emitem. Mas o problema é ainda mais profundo. Numa sociedade livre, não existe ninguém que possa falar em nome da comunidade. Cada membro da sociedade tem direito a exprimir livremente as suas próprias ideias e a defender os seus próprios interesses. Os programas de televisão são serviços prestados aos interesses de quem os vê. Não há razão nenhuma para que todos paguem aquilo que apenas interessa a alguns.

A televisão pública é uma imposição política de uma parte da sociedade. Tende a ser defendida por aqueles que são a favor da predominância do Estado e das elites sobre a sociedade. Este facto coloca a RTP num conflito de interesses. A RTP tem obrigação de tratar a discussão pública de forma imparcial, mas tem o interesse em promover as ideias que justificam a sua própria existência. A RTP resolve esse conflito a seu favor. Faz uma defesa intransigente do serviço público de televisão nos seus programas. Mas, mais importante, defende as ideias culturais e políticas que a favorecem. A RTP adopta o discurso cultural das elites e transmite ao espectador uma visão benigna do Estado enquanto instituição dirigente da sociedade.

DN, 26-7-2008
 
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