12 março, 2008

 

Discriminação


em função do sexo


Lei n.º 14/2008, D.R. n.º 51, Série I de 2008-03-12

Assembleia da República

Proíbe e sanciona a discriminação em função do sexo no acesso a bens e serviços e seu fornecimento, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2004/113/CE, do Conselho, de 13 de Dezembro

Comments:
"A minha filha mereceu morrer por se apaixonar"

HELENA TECEDEIRO

Pai esfaqueou rapariga por falar com soldado

Abdel-Qader Ali não tem dúvidas: o mínimo que a filha merecia era morrer. O crime da rapariga de 17 anos? Ter-se apaixonado por um dos 1500 soldados britânicos estacionados na cidade iraquiana de Baçorá. "Se eu soubesse no que ela se ia transformar, tê-la-ia matado logo que a mãe a deu à luz", garantiu este funcionário público xiita, numa entrevista ao semanário britânico The Observer.

Dois meses depois de a morte de Rand Abdel-Qader - sufocada e esfaqueada pelo pai e irmãos a 16 de Março - ter chocado o mundo, Abdel-Qader Ali continua em liberdade. Foi no jardim da sua casa que o homem de 46 anos recordou como teve "o apoio dos meus amigos que também são pais e sabem que o que ela fez é inaceitável". A própria polícia, que chegou a deter Abdel-Qader umas horas, deu-lhe razão. "Todos sabem que os crimes de honra são impossíveis de evitar", disse o iraquiano, segundo o qual "os agentes ficaram ao meu lado o tempo todo a dar-me os parabéns pelo que fizera".

Rand Abdel-Qasser terá conhecido Paul, um militar britânico de 22 anos, numa acção de caridade na cidade do Sul do Iraque, em que ambos participavam como voluntários. Como qualquer adolescente apaixonada, apressou-se a contar tudo à melhor amiga Zeinab. "Ela gostava de falar do seu cabelo louro e olhos cor de mel, da sua pele branca e da sua maneira suave de falar", recordou a rapariga de 19 anos em declarações ao Daily Mail. Para as amigas, o britânico era "muito diferente dos homens de cá, rudes e analfabetos".

Estudante de Inglês na Universidade de Baçorá, Rand tinha a vantagem de poder falar com Paul sem intermediários. E rapidamente começou a usar todos os argumentos possíveis para prolongar o seu trabalho de voluntariado, que lhe dava a oportunidade de estar com ele.

Uma paixão que podia até nem ser retribuída. De facto, Rand e Paul não se terão encontrado mais de meia dúzia de vezes e sempre em locais públicos. "Ela nunca fez nada para além de falar com ele", garantiu Zeinab. Mesmo assim, esta não se cansou de alertar a amiga para os perigos desta amizade: "Disse-lhe vezes sem conta que ela era muçulmana e que a sua família nunca aceitaria que casasse com um soldado britânico cristão." Como confidente de Rand, era Zeinab quem guardava os presentes que este lhe oferecia, como um leão em peluche para o qual diz agora ser "difícil olhar".

E foi o que aconteceu. Quando o pai de Rand soube que a filha se andava a encontrar com o militar, perdeu a cabeça. "Entrou em casa com os olhos raiados de sangue e a tremer", recordou ao The Observer a mãe da rapariga. Quando viu o marido a sufocar a filha com o pé, Leila Hussein chamou os dois filhos, de 21 e 23 anos, para ajudarem a irmã. Mas quando o pai lhes disse o motivo da agressão estes ainda o ajudaram.

Considerada "impura", Rand não teve direito a funeral e os tios cuspiram sobre o seu corpo quando este foi lançado a uma vala. Incapaz de viver sob o mesmo tecto que o homem que matou a sua filha, Leila pediu o divórcio e está, desde então, escondida para evitar a vingança do marido. "Fui espancada e fiquei com o braço partido", disse a mulher, que agora trabalha para uma organização que denuncia os crimes de honra.

Em 2007, 47 mulheres foram mortas por terem violado "a honra" da família só em Baçorá e desde Janeiro deste ano a Comissão de Segurança da cidade garante que o número já vai em 36. Segundo a ONU, pelo menos cinco mil mulheres são anualmente vítimas de crimes de honra em todo o mundo, e, apesar de a maioria decorrer em países islâmicos, estão a acontecer cada vez mais a muçulmanas que vivem no Ocidente.

Apesar da presença britânica, Baçorá é em parte controlada pelas milícias, que definem regras estritas de comportamento. São elas quem impõem os códigos de vestuário, as práticas religiosas e determinam que a prostituição e a homossexualidade são puníveis com a morte.

DN, 12-5-2008
 
Portugal pioneiro na luta contra a discriminação das mulheres

MANUEL ESTEVES

Ordenados. "Trabalho igual, salário igual", diz a Constituição. E quando o trabalho é diferente mas tem o mesmo valor? A dificuldade reside precisamente em calcular o justo valor de cada profissão. Foi esse desafio que sindicatos e patrões da restauração tomaram em mãos. Por uma questão de justiça
As empresas do sector da restauração e das bebidas dispõem desde o mês passado de um instrumento de avaliação objectiva do valor real das várias profissões que lhes permite saber quanto ganham com o trabalho realizado por cada um dos seus empregados. E se conseguem saber quanto beneficiam com cada trabalho, também podem saber quanto devem pagar e, sobretudo, a quem devem pagar melhor.

Em que país é que isto se passa? Não foi na Escandinávia - a região do Velho Continente onde a igualdade entre homens e mulheres está mais próxima de se tornar realidade. Não foi na Alemanha nem em França. Também não se passou na vizinha Espanha onde o Governo elegeu a igualdade de géneros como o seu primeiro objectivo. Aconteceu em Portugal e teve como principais intervenientes a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) e a Associação da Restauração e Similares de Portugal (ARESP). A Organização Internacional do Trabalho (OIT), que participou activamente no projecto, garante que este é pioneiro em todo o mundo. Em alguns países, foram ensaiadas metodologias de análises semelhantes para empresas. Nunca para um sector integral. E um sector que emprega mais de 40 mil trabalhadores!

Elas custam menos 30%

As estatísticas oficiais são claras: as mulheres ganham menos do que os homens. Segundo os Quadros de Pessoal, relativos ao ano de 2006, o ganho médio (que soma à retribuição base os subsídios e prémios variáveis) dos homens é de 1037 euros, mais 30% do que o recebido pelas mulheres.

Porém, a Constituição da República Portuguesa e, por maioria de razão, todas as leis laborais que dela emanam proíbem a discriminação salarial. O artigo 59.º da lei fundamental determina que "todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual". Significa isto que a Constituição não é cumprida? Não propriamente. É que a discriminação salarial é indirecta e, por isso, muito mais difícil de combater.

Com efeito, salvo raras excepções, quando exercem a mesma profissão, as mulheres recebem o mesmo do que os homens. A discriminação ocorre antes disso, mais precisamente no acesso ao mercado de trabalho: as mulheres são encaminhadas para certas funções e os homens para outras. E, quase sempre, as profissões desempenhadas predominantemente por mulheres são mais mal remuneradas do que as que são exercidas por homens.

A isto Odete Filipe, da CGTP, chama "discriminação indirecta". E, explica, a solução não está no princípio constitucional de "para trabalho igual salário igual" porque os trabalhos são funcionalmente diferentes. No combate à discriminação indirecta o que interessa não é o conteúdo funcional da profissão, mas o seu valor acrescentado. "Muitos trabalhos de conteúdos diferentes com um valor semelhante são pagos de forma distinta", atira Odete Filipe. Sobretudo quando uns são desempenhados por mulheres e outros por homens. É o caso, nos hipermercados, das peixeiras, que ganham bem menos que os talhantes (ver exemplos em baixo).

A OIT pôs o dedo na ferida há mais de 50 anos. A convenção n.º 100, ratificada por Portugal, defende o princípio de "salário igual para trabalho de valor igual". Mas como se calcula o valor do trabalho? Foi para encontrar uma resposta a essa difícil questão que a CGTP desafiou a ARESP a sentarem-se à mesa para, juntas, desenvolver um processo de avaliação dos postos de trabalho do sector da restauração sem o tradicional enviesamento de género. Depois de três anos de trabalho árduo, a metodologia foi validada no passado dia 18 de Junho, durante uma reunião que contou com a presença de 40 pessoas, representando a federação sindical do sector, a associação patronal, o Governo, os organismos internacionais independentes e os empresários.

Menção elogiosa da OIT

O projecto acordado no sector da restauração chamou a atenção da OIT, que não lhe poupa elogios. O trabalho desenvolvido pela CGTP e pela ARESP, em parceria com outras entidades, vem citado no relatório global da OIT. Albertina Jordão, do escritório desta organização em Portugal, sublinha que "não é fácil conseguir uma menção num relatório que traça o panorama mundial, e a OIT ao mencionar a experiência portuguesa fê-lo por considerar um exemplo a seguir. Aliás, esta experiência tem sido referida noutras iniciativas da OIT sobre igualdade salarial".

"Empresas e sindicatos têm nas mãos uma ferramenta que pode ser extremamente útil em sede de negociação do contrato colectivo de trabalho", acrescentou. Claro que, alerta esta especialista em assuntos laborais, "as injustiças não podem ser corrigidas de um dia para o outro". Albertina Jordão lembra que, ao contrário do que parece, esta metodologia pode representar uma redução de custos para as empresas: "Esta ferramenta dá--lhes uma visão mais objectiva do valor acrescentado de cada trabalhador. As empresas sabem melhor como recrutar e que requisitos exigir para o exercício de cada função".

Estas declarações são confirmadas pela própria associação do sector. A vice-presidente da ARESP, Ana Jacinto, disse ao DN que o principal objectivo é conseguir recrutar os trabalhadores mais adequados, dignificando as profissões do sector.

E agora venha a formação

Validada a nova metodologia, as partes vão agora empenhar-se nas acções de formação profissional para explicar às empresas a forma como podem utilizar esta ferramenta. "Temos de criar os conteúdos formativos e o referencial de formação", o que vai ser feito até ao final do ano, explicou Ana Jacinto. A ideia é que esta ferramenta comece a produzir resultados já no próximo ano.

Para a CGTP, a quem se deve esta iniciativa, há ainda outro objectivo. Conseguir fazer deste acordo um exemplo para outros sectores. E a responsável da OIT reforça: "Esta metodologia está em condições de ser aplicada a outros sectores".

DN, 11-7-2008
 
Enviar um comentário



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?