25 maio, 2008

 

Manoel de Oliveira


Manuel de Oliveira




http://pt.wikipedia.org/wiki/Manoel_de_Oliveira

http://www.madragoafilmes.pt/manoeloliveira/#

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MANOEL DE OLIVEIRA E O AMOR PELO CINEMA

João Lopes
crítico

Sou um dos portugueses que se sentiram orgulhosos de ver o cineasta Manoel de Oliveira reconhecido como membro honorário da Academia das Ciências (em cerimónia realizada na quinta-feira, dia 13). Antes do mais, por uma razão muito simples e linear: independentemente dos juízos de valor que cada filme particular de Oliveira possa suscitar, ele é o símbolo mais forte de uma ideia de cinema português que não abdica de um permanente desafio às fronteiras do próprio trabalho cinematográfico, ao mesmo tempo que resiste à mera dissolução (estética e económica) desse mesmo cinema no caldeirão amorfo das ficções "telenovelescas" que, no nosso país, e perante a lamentável indiferença da maioria dos decisores políticos, tomaram o poder.

Compreendo, por isso, o desencanto com que Oliveira comentou as homenagens que tem recebido nos EUA. Desabafou ele: "Noticiadas por mil jornais americanos e aqui nada." De facto, o problema não decorre de uma mera quantificação das notícias que foram ou não foram publicadas (algumas houve, claro). O problema enraíza-se num statu quo em que o trabalho de Oliveira, e, obviamente, também o da maior parte dos realizadores portugueses, está ameaçado por uma evolução mediática e, em particular, político-económica, em que a especificidade do cinema se tornou um valor fraco, para não dizer inexistente.

Afinal de contas, vivemos num país em que os noticiários televisivos secundarizam, ou ignoram, os criadores artísticos ("bons" ou "maus", não é isso que está em causa), ao mesmo tempo que um fait divers anedótico ou um crime passional ocorrido em alguma pobre aldeia esquecida podem ocupar, nesses mesmos noticiários, muitíssimo mais tempo que a situação no Iraque ou o drama do Darfur (não estou a exagerar: esta é uma verdade metricamente irrecusável).

E para que não simplifiquemos os dramas da nossa própria história colectiva, importa também não esquecer que a vida pública do cinema português sempre foi marcada por activíssimos preconceitos. Exemplo? Oliveira é o mesmo cineasta que, há quase 30 anos, e por causa desse filme extraordinário que é Amor de Perdição (1979), era objecto de chacota pública protagonizada por personalidades dos meios jornalístico e cultural (em boa verdade, a palavra "chacota" peca por defeito).

Nada disto diminui o valor simbólico do reconhecimento da Academia das Ciências. Bem pelo contrário, apenas o reforça. Mas, por respeito pelo trabalho de Oliveira (e, por extensão, de todos os profissionais do cinema português), será liminarmente pedagógico lembrar que as homenagens públicas não nos devem fazer distrair em relação ao triunfo ameaçador de uma cultura de raiz televisiva em que o cinema é tratado como uma matéria culturalmente descartável e financeiramente residual.

Revejo, entretanto, algumas imagens desse maravilhoso filme biográfico que é Porto da Minha Infância (2001), em que Oliveira se representou em jovem através do actor Ricardo Trêpa, seu neto. Reencontro o testemunho simples, mas radical, de um verdadeiro amor pelo cinema: é um amor que não escolhe entre a "vida" e o "cinema", celebrando a teia sem fim que ambos desenham e reinventam.

DN, 16-3-2008
 
Admiração por Oliveira vale Palma de Ouro

EURICO DE BARROS, em Cannes

Cineasta foi ovacionado ontem no festival

Manoel de Oliveira é, desde ontem, o feliz possuidor de uma Palma de Ouro do Festival de Cannes. Dada "não por antiguidade, mas sim por estima e por admiração, pela obra e pelo homem", como frisou ontem Gilles Jacob, presidente do festival, antes de a entregar ao cineasta português, durante a cerimónia de homenagem que teve lugar no Théâtre Lumière do Palácio dos Festivais, para assinalar os cem anos do autor de Francisca, que em termos de calendário só serão cumpridos em Dezembro.

Agradecendo a honra, que veio acompanhada pela surpresa de uma curta-metragem biográfica do realizador assinada pelo próprio Gilles Jacob, Un Jour dans la Vie de Manoel de Oliveira, o realizador confessou-se: "Muito comovido pela Palma de Ouro que recebi finalmente, e gostei muito de receber assim, porque não gosto de competições, de estar a concorrer contra os meus colegas." Após algumas breves palavras de agradecimento, parte improvisadas, parte escritas, Manoel de Oliveira concluiu dizendo: "Cresci com o cinema e foi o cinema que me fez crescer. Viva o cinema!"

Antes, perante uma sala bastante cheia que nunca poupou palmas - e até deu alguns vivas - a Oliveira, o presidente do Festival de Cannes fez o elogio do homenageado, a quem tratou por "meu caro amigo". Segundo Gilles Jacob, Oliveira "conheceu o doce grito do silêncio" dado pelo cinema mudo, e por isso é "o último pioneiro do cinema, cuja história tem acompanhado". O cineasta português é também "o diapasão dos apaixonados do cinema de autor", e dedica-se incansavelmente ao "deboche da experimentação". Jacob chamou-lhe por isso "o mais jogador de todos os realizadores, que não tem medo de se pôr em perigo", de onde resulta uma obra "cheia de estranhas e sublimes metamorfoses".

No palco com Manoel de Oliveira e Gilles Jacob estiveram apenas Thierry Frémaux, director artístico do Festival de Cannes, que conduziu a homenagem e evocou outros dois centenários ilustres de 2008, Oscar Niemeyer e Claude Levi-Strauss; e Michel Piccoli, intérprete de vários dos filmes do realizador, a quem Oliveira se dirigiu jocosamente durante o seu discurso, chamando-lhe "meu amigo e meu inimigo".

Na assistência, e além dos membros do júri desta 61.ª edição do Festival de Cannes, presidido por Sean Penn, encontravam-se, entre outros, a mulher e o neto de Manoel de Oliveira; o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, que à entrada da sala foi alvo de um sonoro "Durão oportunista!" em português, vindo do balcão; a ministra da Cultura e da Comunicação de França, Christine Albanel; o embaixador de Portugal em Paris, António Monteiro; João Bénard da Costa, presidente da Cinemateca Portuguesa; e o realizador romeno Cristian Mungiu, que no ano passado venceu o Festival de Cannes com o filme 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias.

Uma das maiores ovações da tarde estava reservada para Clint Eastwood, que apresenta hoje na competição o seu filme Changeling e fez questão de estar presente na homenagem, para saudar pessoalmente Manoel de Oliveira. A sessão terminou com a projecção do primeiro filme do realizador, Douro, Faina Fluvial, rodado em 1931 e ainda hoje agitadamente moderno.

DN, 20-5-2008
 
Manoel de Oliveira vai processar a Lusomundo

ALFREDO MENDES

Polémica. Em causa os direitos de 'Aniki-Bóbó'

Cineasta acusa a distribuidora de arrogância

Manoel de Oliveira pretende levara a Lusomundo (agora Zon) a tribunal) por esta se recusar a pagar-lhe os direitos de autor da sua primeira longa-metragem, Aniki-Bóbó, de 1942. Em resposta, a distribuidora garante que não há lugar a qualquer pagamento e mostra-se disponível a entrara em batalha jurídica se necessário.

A obra tem crianças de rua como protagonistas, reflectindo a passagem de Oliveira do documentário para a ficção. Começou a ser filmada em 1941, estreou no cinema Éden, em Lisboa, em Dezembro de 1942 e figuraria como um marco do cinema e da própria carreira de Manoel de Oliveira, nascido no Porto em 1908. Na ficha técnica do filme consta o nome de António Lopes Ribeiro, como produtor.

Só que, precisa o realizador, "foi feito em co-produção com o António Lopes Ribeiro. Ele sempre agiu comigo da forma mais correcta", sublinha Oliveira ao DN.

A razão da ausência do seu nome foi simples: "O Lopes Ribeiro pediu-me para não o incluir nas legendas afim de não pesar". O realizador de Benilde ou a Virgem Mãe e de Francisca, sustenta: "Deveria ter-se chegado a um acordo com a "Lusomundo", que até vende vídeos do filme. Há a lei de Francisco Ribeiro, da Sociedade Portuguesa de Autores. Mas são arrogantes e poderosos. Dominam o cinema". Assim, acrescenta o realizador, essa postura "obrigou-me a agir. Perdi as esperanças. O caso já está no advogado".

Já Paulo Camacho, porta-voz da Zon (antiga Lusomundo) sustentou ao DN que Manoel de Oliveira não dispõe de qualquer documento que comprove ser o titular dos direitos reclamados. "Ele exige com base em algo inexistente. Se tem direitos, tem igualmente de os provar", insistiu.

Em resposta num tom irónico, falando num sentido lato, Manoel de Oliveira remata: "Levaram-me tudo, menos as dívidas".

DN, 4-6-2008
 
Manoel de Oliveira prova direitos sobre 'Aniki-Bobó'

ALFREDO MENDES

Polémica. Em resposta ao repto da Lusomundo (agora Zon), segundo o qual o realizador teria de apresentar provas de que co-produziu o filme 'Aniki-Bobó', a fim de receber os direitos de autor, Manoel de Oliveira divulga uma carta de António Lopes Ribeiro, revelando ter em seu poder mais documentos

Cineasta pergunta agora pelos direitos da distribuidora

O realizador Manoel Oliveira tem na sua posse documentos que diz provarem que foi produtor do filme Aniki-Bobó e está profundamente agastado com a postura da distribuidora Lusomundo (Zon) que lhe tem recusado os direitos de autor inerentes à sua primeira longa-metragem, estreada no cinema Éden, Lisboa, em 1942.

Oliveira fala de arrogância e, em resposta à empresa que o desafiou, através do seu porta-voz, Pedro Camacho, a mostrar documentação demonstrativa de que co-produziu a obra, o cineasta enviou ao DN uma dessas provas. Porém, adiantou "disponho de mais documentos" que, naturalmente, usará em tribunal, caso a Lusomundo não altere o procedimento.

O realizador - premiado em festivais como os de Cannes, Veneza e Montreal - exibiu uma carta, na qual o produtor António Lopes Ribeiro, com quem, assinalou, sempre manteve as melhores relações, lhe confere autorização para assinar contratos, dado que ele foi "realizador e também produtor associado de 'Aniki-Bobó'.

Nesse sentido, o decano dos realizadores podia celebrar com o Centre d'Animation Cinematographique, de Genebra, Suíça, um contrato de exibição do filme no território helvético até 31 de Dezembro de 1981. Um prazo que "poderá ser prolongado no caso de se atrasar a entrega das cópias necessárias para além de Novembro deste ano, nas condições que tiver por mais convenientes". A carta é datada de Agosto de 1978.

O autor de cerca de 30 longas-metragens e mais de uma dezena de curtas e médias metragens, diz-se surpreendido com a desconfiança da Zon, ao referir que não dispõe de qualquer documento que comprove ser o titular dos direitos. E escreveu: "Como se a Lusomundo (agora Zon) tivesse o cuidado de ter mostrado as provas de que dispõe que lhe garante os direitos com que tem explorado cinematograficamente e por vídeos o meu filme Aniki-Bobó, ou qualquer outro documento que prove que Manoel de Oliveira não é o autor do argumento e o realizador do Aniki-Bobó".

Em outra passagem, Manoel de Oliveira lembra que os seus pais lhe "ensinaram, desde menino, a ser correcto nas suas acções, o que passou a ser o meu rumo de sempre. Nos velhos tempos de meu pai, a palavra bastava. Mas esses eram outros tempos".

O realizador de Belle Toujours e de Os Canibais afirma que "gostaria agora que a distribuidora Zon mostrasse algum documento a comprovar os direitos que diz ter sobre o filme Aniki-Bobó". Trata-se de um trabalho rodado na zona ribeirinha do Porto a que a escritora Agustina Bessa-Luís caracterizaria como "um dos filmes mais perfeitos de Manoel de Oliveira. Um dos mais inquietantes porque é orgulhoso da sua candura". Em breve será evocado na Casa da Música, no Porto.

DN, 7-6-2008
 
Oliveira fecha um século e abre ciclo em Serralves

MARCOS CRUZ

Primeira grande homenagem em solo nacional ao centenário de Manoel de Oliveira, o mais importante realizador da história do cinema português, abre hoje no Museu de Arte Contemporânea de Serralves, onde fica patente até 2 de Novembro. Mostra contempla excertos de todos os seus filmes.
A ideia de abordar a obra de Manoel de Oliveira num contexto expositivo presta-se a uma leitura perversa: a de que o cinema de autor, hoje em dia, é coisa de museu. Observando, porém, o homem que temos diante dos olhos, a vitalidade e a lucidez que irradia sopram para fora do nosso pensamento quaisquer resquícios de fatalismo, como se fossem as velas do seu 100.º aniversário, que se cumpre no próximo mês de Dezembro - e fazem-nos admitir a hipótese de o fechar de um século ser o abrir de um ciclo.

À proposta de João Fernandes, director do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, Manoel de Oliveira reagiu assim: "Mas tem lá um sítio onde projectar os meus filmes?". Nada mais natural para quem encarou sempre a sala de cinema como destino lógico do seu trabalho. A verdade é que, posto perante a pertinência do ponto de vista do curador, que, genericamente, sugeria a troca de papéis entre espaço e tempo no desfrute da obra - a experiência convencional do cinema não oferece ao espectador a decisão do tempo que quer "perder" com cada fita ou imagem, ao passo que a da exposição transfere a "ditadura" da montagem para o espaço -, o realizador aceitou o desafio. Predispôs-se a lançar um olhar novo sobre mais de 70 anos de carreira.

A mostra, que fica patente de hoje a 2 de Novembro, é "um convite a ver os filmes de Oliveira", na definição de Fernandes. E isto porque usa excertos desses mesmos filmes onde estão concentradas as questões essenciais da sua obra - da relação entre documentário e ficção, cinema e teatro, cinema e literatura, à autonomia entre texto, imagem, som e música, passando pela reflexão sobre o País e a sua história - para propor outro modo de descobrir ou reencontrar a singularidade que lhe é atribuída.

Cartazes, cenários, desenhos preparatórios, fotografias, adereços e diversos objectos (como, por exemplo, a boneca de Aniki-Bóbó) completam, fora dos ecrãs (neste caso, plasmas), a viagem ao planeta Oliveira, que inclui ainda o confronto com duas fitas inspiradoras de Douro, Faina Fluvial, o seu primeiro filme, de 1931: Berlim, Sinfonia de uma Capital, de Walther Ruttmann (1927) e O Homem da Câmara de Filmar, de Dziga Vertov (29).

João Bénard da Costa, presidente da Cinemateca Portuguesa, amigo e conhecedor profundo da obra do realizador, partilha o comissariado da exposição com João Fernandes. "Estou feliz por ter contribuído para esta iniciativa, a primeira grande manifestação em Portugal sobre o centenário", confessava ontem, na apresentação da mostra à imprensa.

A pedido de Oliveira, a conferência abriu com um brinde. "À vossa!", saudou o cineasta, de Bailey's na mão. Inevitavelmente, foi questionado sobre a relação que tem com a morte, a meses de fazer 100 anos. "Ainda não experimentei", respondeu. "Depois digo-lhe mais, lá do outro mundo".

DN, 12-7-2008
 
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