17 junho, 2008

 

Da vivência


política



http://pt.wikipedia.org/wiki/Pol%C3%ADtica

http://pt.wikipedia.org/wiki/Ci%C3%AAncia_pol%C3%ADtica

http://pt.wikiquote.org/wiki/Pol%C3%ADtica
http://www.citador.pt/citacoes.php?Politica=Politica&cit=1&op=8&theme=196&firstrec=0

http://www.apcp.pt/

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LABIRINTO

António Vitorino
jurista

No seu discurso na cerimónia comemorativa do 25 de Abril o Presidente da República voltou ao tema da qualidade da democracia, desta vez na vertente da participação dos jovens na política. Ou talvez melhor, das causas de não participação.

Os exemplos dados, recolhidos de um inquérito feito pela Universidade Católica, são impressivos no que diz respeito ao desconhecimento de elementos factuais da nossa vida pública actual ou recente.

Mas seria injusto estigmatizar os jovens portugueses por tal facto. Inquéritos semelhantes levados a cabo noutros países europeus conduziram a resultados equivalentes. E, contudo, os jovens de hoje têm acesso a um manancial de informação muito mais amplo e diversificado e, muitas vezes, interessam-se, desde muito cedo, por temas de que as gerações anteriores só viriam a ocupar-se numa idade mais adulta (saúde, ambiente, ajuda humanitária, por exemplo).

Contudo, o exemplo dado dos jovens portugueses poderia estender-se mesmo ao conjunto da população: há de facto uma diminuição do interesse pela política em geral e, consequentemente, uma contracção da participação dos cidadãos na vida pública.

Este alheamento das coisas públicas é mais saliente na esfera política, incluindo a quebra da filiação e da própria militância partidária. A maneira como (ainda) se fazem campanhas eleitorais em Portugal (e os custos inerentes) prova que o modelo de generosidade militante dos primórdios da democracia logo após o 25 de Abril já só se mantém como uma ficção: a forma é a mesma, mas o conteúdo é dado por uma máquina partidária oleada e especializada e por empresas de comunicação e de serviços vários que compõem o quadro.

Do mesmo modo, a quebra de participação afecta também o mundo sindical e um vasto espectro de organizações não governamentais. No ano passado uma conhecidíssima organização ambientalista internacional teve como tema dominante do seu congresso anual precisamente o tema da incapacidade de mobilização dos cidadãos para as suas causas e como a ultrapassar.

O problema, portanto, não é exclusivo da participação política e deriva de uma matriz cultural e de vida colectiva onde os valores da solidariedade, da partilha e da responsabilidade cívica estão em perda.

Mas não se pode diluir numa questão de ordem geral o que tem raízes específicas no caso da participação política.

Importa reconhecer, por isso, que, no mundo de comunicação global em que vivemos, a política constitui uma das actividades humanas que mais dificuldade tiveram em se adaptar às novas regras. Dito de outro modo: a política perdeu o seu "nicho de mercado" reservado, entrou em concorrência directa com outros "produtos" comunicacionais e... perdeu!

Perdeu por incapacidade de adaptação do discurso político aos novos ditames simplificados da mensagem que passa, seja na forma seja no conteúdo. E mesmo quando pretendeu mimetizar outras formas simplificadas de comunicação (de que os populistas de esquerda e de direita são bons exemplos), caiu na banalização ou no descrédito.

Vários inquéritos mostram uma queda abrupta da leitura dos jornais (onde, em tese, se publica o essencial da opinião política), com excepção dos jornais desportivos, fazendo com que cerca de 70% dos europeus digam que tudo o que sabem sobre política lhes vem através da televisão.

Mas na televisão a política foi praticamente banida do prime time, com excepção de alguns serviços públicos e, claro, dos canais de cabo especializados. Mesmo nos jornais televisivos, uma observação atenta do alinhamento prova que a política perdeu dominância e muitas vezes é incluída... porque não pode deixar de ser.

Por contraste, a Internet vai ganhando um espaço próprio no plano político, mas no limite ainda aspirando sobretudo a ser "repescada" pelos grandes meios de comunicação de massas.

Este fenómeno não resulta de uma conspiração tenebrosa contra a política e contra os políticos, como alguns por vezes dizem assumindo o papel de vítimas.

Mas que ele corresponde a um labirinto de que a política tal como é feita hoje ainda não sabe como sair, lá isso corresponde!

DN, 2-5-2008
 
Parlamento quer explicar o que foi a ditadura

O Parlamento deverá aprovar "em breve" propostas para promover o conhecimento da luta contra a ditadura e pela democracia, mais de um ano depois da discussão suscitada por uma petição do movimento Não Apaguem a Memória.

A expectativa da maioria PS é que o Parlamento aprove "a curto prazo" um projecto de resolução que reúna a "unanimidade ou o maior consenso possível" dos grupos parlamentares, disse à Lusa o deputado socialista e capitão de Abril Marques Júnior.

As rondas de negociações com as direcções de todos os grupos parlamentares, do CDS/PP ao PCP, ainda não terminaram, sendo que o texto final do projecto estará dependente da aprovação das bancadas.

Em declarações à Lusa, o antigo preso político Edmundo Pedro lamentou que o processo não esteja ainda concluído, frisando que "a culpa da ignorância dos jovens é dos mais velhos". "Quando se fala em desconhecimento e ignorância dos jovens face à História, a culpa não é deles, é dos mais velhos, de todos nós e dos governos que não souberam proporcionar o conhecimento da nossa contemporaneidade", frisou.

A ignorância dos jovens em relação à história mais recente foi tema central do discurso do Presidente da República, Cavaco Silva, na sessão solene comemorativa dos 34 anos do 25 de Abril.

O PCP optou por entregar, em Janeiro, um projecto próprio pelo "conhecimento e valorização da luta antifascista em Portugal", mas está disponível para viabilizar um texto único, segundo disse à Lusa o líder da bancada parlamentar, Bernardino Soares.

O projecto de resolução do PCP recomenda ao Governo "particular valorização e apoio ao museu da Resistência instalado na Fortaleza de Peniche", entre outras medidas.

Em Novembro, o movimento Não Apaguem a Memória, hoje associação cívica em fase de instalação, dirigiu uma carta aberta aos grupos parlamentares apelando a que fosse votada, até final de 2007, uma resolução parlamentar que vinculasse o Estado ao "dever de memória".

A petição entregue pelo movimento, cujo relator foi o deputado socialista Marques Júnior, tinha sido discutida em plenário no dia 30 de Março de 2007.

Os mais de seis mil subscritores, entre os quais o antigo preso político do campo do Tarrafal, Edmundo Pedro e o ex-presidente da República Mário Soares apelavam à criação de um espaço público nacional de "preservação e divulgação pedagógica da memória colectiva sobre os crimes do chamado Estado Novo e a resistência à ditadura" e de um elemento memorial no edifício-sede da PIDE/DGS.

Marques Júnior afirmou à Lusa que o projecto de resolução a aprovar "segue as linhas principais do relatório com algumas alterações" propostas pelas diferentes bancadas.

A criação de um "roteiro nacional dos lugares considerados de interesse nacional, no âmbito da resistência e da luta pela liberdade", de roteiros locais com o mesmo sentido, o apoio do Governo à criação de um Museu da Liberdade e Resistência, um programa público de investigação histórica e a promoção dos valores da democracia e liberdade ao nível do ensino são algumas das propostas que constam no relatório.

DN, 3-5-2008
 
A POLÍTICA DOS JOVENS

Manuel Maria Carrilho

Avaliar a qualidade da democracia portuguesa a partir da relação dos jovens com a política é uma forma aliciante de identificar os problemas existentes e de antecipar cenários de futuro.

Na sua intervenção do 25 de Abril, o Presidente da República destacou dois aspectos: a ignorância dos jovens e o seu desinteresse pela política e por aquilo que ela hoje representa: a maioria não sabe o número de Estados membros da União Europeia, nem quem foi o primeiro presidente da República eleito depois do 25 de Abril de 1974, nem que o PS teve maioria absoluta nas últimas eleições legislativas.

São temas que merecem atenção: em primeiro lugar, sobre o que os jovens de hoje de facto sabem e ignoram, no ambiente de uma nova cultura, agora de matriz digital. Cultura que tende a redefinir profundamente os próprios conceitos de saber e de ignorância, ao mesmo tempo que viabiliza novas formas de expressão do individualismo contemporâneo. E, seguidamente, quanto ao modo como, neste quadro, os jovens vivem hoje a política, nas suas relações com os seus valores, as suas instituições e os seus agentes.

Mas estes temas estão longe de ser exclusivos da sociedade portuguesa. Bem pelo contrário - é o que se verifica lendo as conclusões do inquérito Euyoupart sobre o investimento político dos jovens europeus. Ou o recente relatório sobre Os Jovens Face ao Seu Futuro, feito com base num estudo realizado em 17 pelo Kairos Institute e pela Fondation pour l'Innovation Politique.

No essencial, para o que se aponta é para a distância da juventude em relação à "oferta" política; para a vontade de maior participação num quadro de cepticismo em relação à eficácia do voto; para a disposição de apoio a reformas; para a influência dos media nas opções políticas individuais.

O que é importante é situar estes traços no âmbito das grandes transformações que afectam hoje o mundo dos jovens. Basta olhar para o seu modo de vida - 82% dos jovens europeus entre os 16 e os 24 anos passam por dia perto de duas horas na Net e cerca de três a ver televisão. E o tempo que "passam" na Net é sobretudo utilizado a trocar e-mails, a "descarregar" músicas ou filmes, a trocar ficheiros, a participar em fóruns ou a visitar blogues.

Daí que os problemas colocados remetam afinal para um outro - a generalização da cultura digital no mundo contemporâneo e a forma como essa generalização tem fomentado uma crescente subjectivação e tribalização dos cidadãos, uma progressiva virtualização e despolitização das suas actividades. Mas, sobre isso, falaremos noutro dia.

DN, 3-5-2008
 
JOVENS E POLÍTICA

João Miranda
investigador em biotecnologia
jmirandadn@gmail.com

A geração que fez o 25 de Abril politizou todos os aspectos da vida social e económica. Viu em cada decreto-lei, em cada greve e em cada novo direito social uma conquista e um progresso. Os membros desta geração não foram capazes de compreender que a luta política é, na melhor das hipóteses, um jogo de soma nula em que cada direito conquistado por uma parte da sociedade é obtido à custa do sacrifício de outra parte da sociedade ou das gerações futuras.

Grande parte do progresso económico e social atingido ao longo dos últimos 30 anos é artificial. Foi conseguido através da progressiva atribuição, por decreto, de direitos sociais à geração que fez o 25 de Abril. Esta geração beneficiou, como nenhuma outra antes ou depois, de empregos vitalícios, salários acima das respectivas qualificações e pensões de reforma muito acima das respectivas contribuições. Os membros desta geração de privilegiados chegaram sem mérito nem trabalho a posições que nunca teriam alcançado se a vida pública não tivesse sido politizada pela revolução. Os chamados "direitos adquiridos" da geração do 25 de Abril estão a ser pagos pelas novas gerações. Os jovens não têm emprego vitalício nem reforma garantida, mas são forçados a trabalhar para sustentar os privilégios das gerações mais velhas.

A intervenção do Presidente da República nas comemorações do 25 de Abril criou a ideia de que os jovens não se interessam pela política partidária. Este alegado desinteresse incomodou a geração de políticos que fez o 25 de Abril. A cultura revolucionária destes políticos impede-os de perceber que a excessiva politização da vida pública não é um valor a promover mas um vício a evitar. As sociedades politizadas premeiam a habilidade política e as demonstrações de força na rua. As sociedades despolitizadas premeiam o mérito individual, o trabalho e a iniciativa empresarial. O eventual desinteresse dos jovens pela política partidária é um bom sinal. É um sinal de que a sociedade falhada construída pela geração do 25 de Abril pode ter os dias contados.

DN, 3-5-2008
 
Cavaco ouve as ideias dos jovens para maior participação política

Depois de no 25 de Abril ter deixado sérios alertas, Cavaco chama jovens

As juventudes partidárias, à excepção da JCP, prepararam para o encontro de hoje com o Presidente da República, sugestões para reaproximar os jovens da política.

Duas semanas depois do alerta, no discurso do 25 de Abril no Parlamento, do afastamento dos jovens da política, Cavaco Silva convidou para uma reunião líderes das organizações partidárias, académicas, de voluntariado, sindicais e empresariais e também do associativismo juvenil.

O objectivo é saber a sua opinião sobre a "realidade do afastamento dos jovens em relação à vida política" e, por outro, sobre "aquilo que pode ser feito para inverter a situação".

Hoje, à excepção da JCP, a organização de juventude do PCP, que criticou o discurso de Cavaco Silva no 25 de Abril, as restantes "jotas" vão para a reunião com algumas propostas centradas no ensino e na habitação jovem, por exemplo.

O secretário-geral da JS e deputado Pedro Nuno Santos disse que "é preciso desdramatizar o discurso" quanto à falta de participação dos jovens na política e mostrar que há uma "geração dinâmica e empreendedora" em Portugal.

Já o líder da JSD, Pedro Rodrigues, disse que uma das suas ideias se relacionam com dois projectos sobre habitação jovem, a apresentar no Parlamento, mas diz querer apresentá-los "em primeira mão ao Presidente da República".

O líder da Juventude Popular (JP), Pedro Moutinho, afirma que "concerteza" apresentará propostas mas reserva-as até à reunião.

"É fundamental que os jovens se reaproximem da política. A meu ver, esta tendência está relacionada com a falta de credibilidade de quem está na política e nos partidos. A sociedade olha para quem está na política como quem diz A e faz B", afirmou.

Contactada pela Lusa, a JCP afirma que não apresentará medidas concretas, mas vai participar no encontro para "ouvir e discutir ideias".

Dirigentes do Bloco de Esquerda não foram convidados por este partido, formalmente, não ter uma organização de juventude partidária, segundo explicou fonte da Presidência. Fonte do BE explicou à Lusa que os bloquistas não têm uma "jota", como os restantes partidos, mas sim uma estrutura de jovens, integrada no Bloco.

Já ontem, o BE insurgiu-se contra a decisão do Presidente de excluir representantes da juventude bloquistas dos encontros de hoje que se destinam a combater o afastamento dos jovens da política.

O desconhecimento relevado por jovens portugueses em relação à actividade política, que ficou patente num recente estudo de opinião da Universidade Católica, foi o principal tema do discurso do Presidente da República no Parlamento, durante a sessão solene do 25 de Abril.

DN, 12-5-2008
 
OS JOVENS AFASTADOS DA POLÍTICA

Marta Vieira
Apoiante de Mário Patinha Antão

Só quem não fala com eles, diariamente, é que pode pensar que grandes discursos sobre a crise financeira ou a retoma económica fazem eco nos seus espíritos. Na verdade, para a maior parte dos potenciais eleitores, entre os 18 e os 30 anos (com excepção de um ou outro carreirista), os políticos já deram todas as provas de incompetência e de falta de seriedade, provas essas que se acumulam de cada vez que vêem um primeiro-ministro, com um ar festivo e vaidoso, a desrespeitar promessas sobre o emprego, a consolidação orçamental, a retoma do investimento, a segurança dos cidadãos, a inflação, a estabilidade laboral, a educação, as novas oportunidades, etc., etc., etc., tudo aquilo, enfim, que serviu para enganar, mais uma vez, os portugueses. Não espanta que, cada vez mais, os jovens se abstenham. Já não é apenas indiferença. Esta abstenção é um voto de protesto! O PSD continua a constituir a única força política credível, com representação transversal na sociedade portuguesa, baseada no que ainda resta dos tradicionais valores nacionais: o trabalho, a honra, a solidariedade. Mas que PSD podemos apresentar para enfrentar este Estado totalitariamente tomado de assalto pelo Partido Socialista? Fará sentido, para os jovens, apostar em quem nada pode trazer de novo ao marasmo em que vivemos? Pensamos que não. Pensamos que a credibilidade e a confiança são ajudadas pela maturidade, mas que esta não se basta com o ter alguma idade. O Professor Patinha Antão tem maturidade porque tem sabedoria e bom senso para indicar o caminho quando Portugal assim o exigir. Por isso, os jovens estão com ele e o seguirão.

Mandatária para a Juventude

DN, 25-5-2008
 
UMA RAÇA DE POLÍTICOS

João Marcelino
Director

1. A "raça" política portuguesa voltou a manifestar-se a propósito de uma palavra na boca do Presidente da República. O que aconteceu? Pois uma coisa gravíssima! Cavaco Silva atreveu-se a utilizar um termo maldito, que pelos vistos estaria registado em nome de um antigo ditador provinciano; aludiu a um conceito fascista, inquietou o zelo da extrema-esquerda que no final do século passado se converteu discretamente aos ardores da Democracia e lançou a sombra do medo sobre o Dia de Portugal, que eu só não digo da Pátria porque não pretendo convocar o zelo destes novos preciosos inquisidores.

A coisa, obviamente, indignou Louçã; mais tarde também agitou a secção de comunicados do PCP; e pelo meio arregimentou algum do jornalismo que há muitos anos se mantém vigilante, a bem da Nação - perdão, do Povo.

E o que queriam eles? Pois nada de especial: apenas que o Presidente admitisse o dano à nossa tranquilidade colectiva e depusesse sobre as suas reais intenções. O País não mais dormiria descansado enquanto Cavaco não ajoelhasse perante a Democracia em risco. Desde o cigarro de Sócrates que não se via um escândalo assim!

Pois sabem o que os portugueses, esses ingratos, fizeram? Ou riram, ou ficaram indiferentes, ou nem sequer souberam da polémica. Andavam, e andam, a divertir-se com o "Portugal, olé", ou a preocuparem-se com o bloqueio dos camionistas, enquanto deitam contas à vida e tentam sobreviver à crise instalada. O próprio Chefe do Estado, arrogante, nem resposta deu.

Eu só pergunto: acham isto normal? Então os portugueses não se preocupam com esta ameaça latente que paira a partir dos céus de Belém? Só a extrema-esquerda vigia? Francamente, tenho de admitir que não merecemos esta "raça" de políticos.

2. Claro que Sócrates mudou. A autoconfiança, num País tão dependente dos outros, só faz sentido quando a conjuntura económica internacional corre bem. Já houve tempo para isso, de facto. Agora não vivemos o tempo propício ao posso e mando ou ao voluntarismo. E o primeiro-ministro, político experimentado, mudou de estratégia. Está mais aberto ao diálogo, mais receptivo à negociação. Provou-o na gestão da crise dos camionistas com uma paciência que no passado provavelmente não teria, que a ponte de Cavaco lhe ensinou e que a nova oposição do PSD igualmente não aprecia.

Claro que um governo deve analisar os problemas dos seus cidadãos, governar para as pessoas, ajudá-las nas dificuldades, arranjar soluções para os problemas novos; e que o direito ao protesto não só é legítimo como é a única forma de corrigir os desvios do poder, que sempre tende para o autismo e a prepotência.

A questão, neste caso, é que o protesto dos camionistas se situou muitas vezes para além do admissível, colocando em causa o Estado, cuja vulnerabilidade foi reconhecida pelo primeiro-ministro no Parlamento. Aí não houve novidade: Bloco e PCP refugiaram-se na demagogia e o PSD e o PP optaram pela cobardia. Todos parecem acreditar que os votos caem da oposição sistemática, da crítica pela crítica. E pode não ser, de facto, assim.

Não entendo! Se, no presente, Portugal continua a disputar o Europeu de futebol, a jogar bem, com evidente união entre o treinador e os jogadores; e se, no futuro, Ronaldo, e Quaresma, e Moutinho, e Nani, e Carvalho, vão continuar a ser portugueses; e se Deco e Pepe também já não podem actuar por outra selecção; por que razão é que a partida de Scolari deveria preocupar quem gosta do futebol português? Esta outra polémica, artificial, não é só pouco inteligente; também não tem razão de ser.

DN, 14-6-2008
 
Há uma forma feminina de fazer política?

ISABEL LUCAS

Maioria considera que as mulheres são diferentes dos homens na vida política.
"Eu não quero pensar em política 24 horas por dia. Se é isso que distingue homens e mulheres, então o argumento cai por terra." As palavras são de Miguel Frasquilho, ex-secretário de Estado de Manuela Ferreira Leite, quando esta ocupava o cargo de ministra das Finanças de Durão Barroso. Para Miguel Frasquilho não existem diferenças entre ser homem ou mulher na política. Não as notou, nem quando tinha uma mulher como superior hierárquica.

Maria José Nogueira Pinto, ex-deputada, ex-secretária de Estado da Cultura tem uma opinião diferente. Diz que existe uma maneira feminina de estar na política. "Quando fazem política sem estar condicionadas pelo figurino masculino fazem-no de forma diferente." E o que as distingue, então? Elas cuidam do detalhe; gostam mais do real e do concreto; têm maior proximidade com o quotidiano por causa do papel que desempenham na família e são muito ciosas em relação ao "bom aproveitamento do tempo." Em síntese, elas "levam para a política um sentido agudo do real."

Ana Drago, deputada do Bloco de Esquerda, vê a política como um reflexo do que se passa em outras áreas onde as mulheres ainda têm de mostrar valências e isso reflecte-se no modo como fazem intervenções. "Há uma forma diferente de fazer discurso político. As mulheres tendem a sustentar melhor o seu confronto político." Diferenças também nas áreas que lhes são atribuídas: a Saúde, a Educação, a Cultura. Jamais a Defesa ou a Economia. Mais radical é Joana Amaral Dias. A ex-deputada não vê em que possam ser diferentes homens e mulheres no exercício do poder. A diferença está no acesso a esse poder, e esse continua a ser mais difícil para as mulheres. Por isso "faz sentido falar em quotas". Para ela, homens e mulheres, quando estão, devem estar a tempo inteiro".

Nada disso, defende Henrique de Freitas. Para o deputado do PSD, dividir o tempo entre a política e a família é fundamental. Quanto a diferenças, "as mulheres aliam melhor a firmeza à compreensão".

DN, 20-6-2008
 
OS LIMITES DA NATUREZA HUMANA

Pedro Lomba
jurista
pedro.lomba@eui.eu

Quando estava a fazer o estágio de advocacia assisti uma vez em tribunal a um diálogo memorável entre uma juíza e um jovem delinquente que vinha acusado de um furto e pelo qual tinha sido condenado com pena suspensa. Aquele diálogo foi um teste perfeito para o que eu pensava da natureza humana e para o que hoje penso sobre os limites da acção política.

Com particular compaixão, a juíza questionou o rapaz se ele achava "bem" o que tinha feito. Ele respondeu que "sim", que "achava bem". A juíza perguntou-lhe depois se ele tencionava "repetir" a experiência ou "corrigir-se". O rapaz disse que não ia corrigir nada. A seguir, após um palavroso discurso sobre o "bem" e o "mal" a juíza fez uma última pergunta: "O senhor entende alguma coisa do que acabei de dizer?" A resposta do rapaz: "Não!"

Durante os últimos 200 anos, muitos dos desacordos políticos têm sido sobre como interpretar o tipo de discurso autodestrutivo e anti-social deste rapaz. A posição dominante, para a qual contribuiu o mito do "bom selvagem" de Jean-Jacques Rousseau, acabou por ser a crença na bondade da natureza humana. Esta crença diz-nos que os seres humanos nascem puros e impolutos e é a sociedade que os degenera.

A bondade da natureza humana, aliada à intrínseca corrupção da sociedade, produziu os movimentos revolucionários e progressistas que todos conhecemos. A ideia básica é a de que se agirmos com as medidas "certas" de melhoramento social conseguiremos alterar a forma como as pessoas actuam. O positivismo educativo e o romantismo do século XIX vêm daqui. Os heróis da literatura romântica eram espíritos nobres traídos pela brutalidade das instituições sociais. Como na novela "Michael Kolhaas" do romântico alemão Kleist acerca de um comerciante de cavalos que se transforma num assassino para reagir a uma sociedade que afrontou os seus direitos, esta cultura enfatizava a rebelião "justa" e o regresso universal ao "estado de natureza".

E, no entanto, a nossa época tem demonstrado que Darwin tinha mais razão do que Comte ou Rousseau. As pessoas não se tornam necessariamente melhores ou piores por causa do factor X ou Y. A nossa estrutura biológica e psicossocial já faz de nós seres agressivos e competitivos. E a velha asserção que ciclicamente reaparece de que se actuarmos directamente sobre a pobreza os comportamentos anti-sociais desaparecem pode ser tão verdadeira como falsa.

Há aqui uma importante moral política a reter. Devemos pensar na política não como a aplicação mecânica de planos sobre a natureza humana mas como um processo de criação e transmissão de normas sociais. Não estaremos todos de acordo sobre o conteúdo dessas normas, mas este é o melhor caminho para uma sociedade mais segura e coesa.

DN, 17-7-2008
 
O LADO OCULTO DOS POLÍTICOS

Pedro Lomba
jurista
pedro.lomba@eui.eu

Em 1919, Sigmund Freud ficou profundamente interessado no estado psicológico do presidente americano Woodrow Wilson. Freud tinha "acompanhado" Wilson na Conferência de Paris que encerrou a 1.ª Guerra Mundial e onde foram reconhecidos os 14 pontos de "justiça absoluta" que Wilson apresentou como a base da paz europeia.

Algum tempo depois, Freud conheceu um dos colaboradores de Wilson nas negociações, o diplomata William Bullitt, que se demitira por discordar dos termos do Tratado de Versalhes. Bullitt disse a Freud que pensava escrever um livro sobre as negociações do Tratado. Prontamente, Freud propôs ser ele a escrever o capítulo sobre Wilson. O livro acabou por sair em 1939, com o título: Thomas Woodrow Wilson: Um Estudo Psicológico.

Freud nunca tratou nem recebeu políticos no consultório, mas acreditava que a acção de um líder político dependia de uma certa estrutura psicológica. "O meu pai", recordou mais tarde a filha Anna Freud, "podia analisar um líder político, o que ele disse ou fez, e abanando a cabeça ou olhando fixamente acabava por dizer: "Os governantes, assim como os governados, têm forças psicológicas que movem as suas vidas, forças com que depois definem a História"

No caso de Wilson, segundo Freud, essa força psicológica era a religião. Freud relembra na introdução do livro uma frase de Wilson imediatamente depois de ser eleito: "Foi Deus que ordenou que eu fosse o próximo presidente dos Estados Unidos." Para Freud, o apego religioso de Wilson que, entre outras coisas, trouxe para a política internacional um moralismo novo, fazia dele um líder político reverente com as "intenções" mas indiferente aos "factos".

Não é possível afirmar com segurança que Wilson fosse mesmo "neurótico" como pensava Freud. Mas é por causa da transparência da estrutura psicológica de Wilson que conseguimos perceber o tipo de líder político que ele era: distante da realidade, cegamente idealista e expectante numa vitória final que pretendia divina.

Quando olhamos para os líderes políticos de hoje, é difícil imaginar que houve um tempo em que a estrutura psicológica dos líderes políticos era susceptível de interpretações complexas. Hoje, os nossos líderes políticos procuram esconder sempre mais daquilo que revelam. O essencial consiste em demonstrar imprecisamente um carácter e ter reacções ocasionais de força. A primeira virtude da liderança passa pela preservação de um lado oculto e pela construção dissimulada de uma personalidade. Basta pensar em José Sócrates, que sempre se aplicou em esconder a superficialidade intelectual.

Talvez pudéssemos no futuro passar a escolher os políticos de outra forma: não comparando o que cada um revela, mas ponderando os seus lados ocultos.

DN, 24-7-2008
 
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