09 julho, 2008

 

Humberto


Delgado




http://pt.wikipedia.org/wiki/Humberto_Delgado


http://www.vidaslusofonas.pt/humberto_delgado.htm

http://www.humbertodelgado.pt/WebFHD/index.jsp

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A FALSA DERROTA DE DELGADO

FERNANDO MADAÍL

Presidenciais de 1958. Amanhã passa meio século sobre as eleições em que o povo acreditou que se poderia derrubar o salazarismo. As multidões que aclamavam o 'General sem Medo' acabariam por representar menos de 25% dos votos. Houve fraude?

Boletins anulados em Mira por terem menos um milímetro e meio

As multidões que encheram as ruas a gritar por Humberto Delgado não votaram? As fotografias das cidades cheias de gente a saudar o "General sem Medo", como lhe chamou o socialista António Macedo, eram ilusórias? O povo ignorante enganava-se na lista por falta de hábitos eleitorais? Como se explica que o candidato da oposição obtivesse 23,6% dos votos contra os 75,8% do apagado Américo Tomás, que Salazar escolhera para suceder a Craveiro Lopes?

"Tão grande desproporção não pode apenas ser atribuída à burla ocorrida no momento da contagem dos votos, que foi grande, mas apenas parte de todo um enorme sistema manipulatório, discricionário e profundamente fraudulento organizado logo desde as operações de recenseamento eleitoral", escreve João Madeira no vol. 15 de Os Anos de Salazar.

"Tal sistema", prossegue o historiador, "assentava no impedimento a que se recenseassem aqueles que não gozassem da confiança do regime, nos obstáculos levantados ao conhecimento dos cadernos eleitorais por parte da oposição, na obrigatoriedade de serem as listas e os candidatos a imprimirem e a distribuírem pelos eleitores os respectivos boletins de voto, nas intimidações e pressões de toda a ordem sobre os que se conseguiam recensear ou na proibição de a oposição fiscalizar o acto eleitoral."

Nem mesmo António Sérgio, o responsável pela escolha do jovem general com um passado de indefectível da ditadura - como se encarregam de lembrar os seus adversários de 1958 -, mas que vivera na democrática América, em detrimento de outras possibilidades (como Jaime Cortesão ou Mário de Azevedo Gomes), terá algum dia pensado que seria possível aquele "furacão" de "sorriso rasgado", que encantava quem o tinha ouvido dizer que seria o fim de Salazar ("obviamente, demito-o") ou quase a traçar o seu próprio destino ("estou pronto a morrer pela liberdade", disse no comício eleitoral de Chaves, sete anos antes de ser abatido pela PIDE, a polícia política do regime).

No seu livro El Otro Caso Humberto Delgado - Archivos Policiales y de Información, Juan Carlos Jiménez Redondo salienta a novidade, tanto da personagem como da campanha. "Humberto Delgado é, também, um líder político 'actual', que maneja de forma intuitiva as técni- cas mais avançadas do marketing político das democracias de massas, o que provoca um impacto sem precedentes num país acostumado a escutar do Governo e da oposição intervenções muito argumentadas e intelectualmente muito bem construídas, mas profundamente entediantes para o grande público. Delgado intui de forma nítida a necessidade de simplificar e clarificar a mensagem política para a tornar acessível a todos os portugueses. O êxito instantâneo das suas aparições públicas demonstra a sua enorme capacidade de comunicação, a sua inata aptidão para satisfazer as dúvidas de um público ávido de um novo discurso político que pudesse compreender e compartilhar."

Mas, afinal, como foi a fraude eleitoral? Alguns exemplos foram relatados no Avante!, que o PCP, após tentar avançar com Cunha Leal e de ter patrocinado Arlindo Vicente, teve de ceder ao movimento popular, com o seu candidato a desistir a favor daquele que, antes, era denominado "general coca-cola". E, depois, os propagandistas do regime, em artigos e panfletos de gigantesca tiragem, proclamavam que, "por detrás do Kerensky [o líder social-democrata russo de 1917] Humberto Delgado, é evidente que já se move, na sombra, maquiavélico e sinistro, não sabemos que Lenine".

"No dia das eleições", lê-se no clandestino Avante! da primeira quinzena de Junho, "presos muitos dos dirigentes oposicionistas, dificultada pela força a cópia dos cadernos [eleitorais] e a distribuição dos boletins de voto, amordaçada a propaganda, as autoridades salazaristas fizeram imensos cortes nos cadernos eleitorais, expulsaram das secções de voto pessoas que se propunham fiscalizar o acto eleitoral, fabricaram votos por meio de certificados de eleitor distribuídos amplamente por elementos da União Nacional [o partido único fascista] que votaram em varias secções, organizaram a votação maciça de unidades das forças amadas, comandadas pelos seus superiores."

Em Julho, o jornal comunista, entre as burlas que denuncia, revela que, "em Mira, quando ao fazer-se a contagem se verificou que a vitória havia pertencido ao gen. H. Delgado, o presidente da mesa rapou de uma régua e anulou 119 votos do candidato da oposição porque tinham milímetro e meio a menos que o normal".

DN, 7-6-2008
 
O sobrevivente do grupo que lançou o general contra Salazar

FRANCISCO MANGAS

Presidenciais 1958. Movimento nasceu no Porto

Manuel Coelho dos Santos diz que Delgado teve dúvida no primeiro encontro

"No meu concelho de Gaia ganhou Santana Lopes. Não está mal para um concelho que há 50 anos deu a vitória a Humberto Delgado. É assim que regredimos!" O advogado Manuel Coelho dos Santos, velho republicano, mantém o espírito crítico, o sentido cívico da vida. Não se resigna. Aos 81 anos, criou um blogue e lê a realidade. Escreve para a Ana, a neta mais nova, que, ao contrário dos outros netos, parece interessar-se pela política.

Ana tem 16 anos. Leu na página electrónica (manuelcoelhodossantos.blogspot.com) a desencantada nota do avô sobre as directas do PSD. Mas o que a prendeu foi o nome de Delgado. Faz então um pedido. "E um artigo sobre Humberto Delgado? Queria pedir-lhe para me falar sobre ele (..) Se puder, é mesmo urgente e não confio em mais ninguém para o fazer." Manuel Coelho dos Santos é o sobrevivente do grupo de dez oposicionistas portuenses que, em 1958, desafiou o general a candidatar-se à Presidência da República.

No primeiro encontro, em Lisboa, o jovem advogado esteve ausente. Para a capital, na missão de convencer Delgado a afrontar o ditador Sala- zar, partiram o advogado Artur Santos Silva e o arquitecto Artur Andrade. Quem fala com o militar, no entanto, é o arquitecto Andrade", recorda.

Quando o avô lhe escrever a história no blogue ("a escrita é uma forma de estar vivo, quando a gente dá conta está fora de tudo"), Ana fica a saber que o homem, hoje conhecido como o "General sem Medo", não recusou o convite dos republicanos do Porto. Mas também, por razões compreensíveis, não o aceitou de imediato.

Houve um almoço, dias depois, numa casa da Foz. "Aí definimos o programa da candidatura, que abria caminho à democracia". Delgado ouviu e concordou. Só uma observação fez arrefecer o entusiasmo dos comensais. "Éramos poucos para lançar uma candidatura presidencial", disse o general. Observação pertinente; contudo, os dados estavam lançados. "Combinámos uma segunda vinda do general, e dessa vez tínhamos ao nosso lado a oposição geral do Porto."

A candidatura avança com a segunda viagem do militar ao Norte. "O movimento é do Porto, nasceu no Porto: depois de entrar em marcha, veio tudo", assegura. Antes, numa reunião em Aveiro, com oposicionistas de vários pontos do País, "ninguém esteve de acordo com a candidatura de Delgado". Ficou o Porto sozinho. "Iniciámos a campanha com a oposição do Partido Comunista e as reservas do Directório Democrata Social de Lisboa."

Uma campanha de homens livres ou de homens que queriam ser livres, num país cinzento a entrar festivo no trigésimo ano de ditadura. Numa carta de 13 de Maio de 1958, dirigida a Almeida Santos, então a advogar em Moçambique, Coelho dos Santos define com clareza a essência do movimento em torno do general - que, "obviamente", demitirá Salazar se sair vencedor das atribuladas eleições.

A missiva não chegou a Moçambique, porque a PIDE lhe mudou o destino. Dizia na carta, que Iva Delgado recuperou dos arquivos da polícia política, ao amigo, companheiro de curso e da tropa, Almeida Santos: "O nosso lema é este: cada indivíduo deve ser uma comissão." Em movimentos desta natureza, acrescenta, "é impossível uma hierarquia rígida".

Os oposicionistas do Porto, refere ainda a Almeida Santos, conseguem assim a "adesão de alguns elementos moderados e até monárquicos", como "Rolão Preto, Almeida Braga, prof. Vieira de Almeida".

De repente, os portugueses despertam. O general inicia a campanha no Porto e é recebido, dizem os jornais livres do lápis azul da censura, por mais de "200 mil pessoas". Perante tamanha manifestação, Delgado - que a PIDE , anos depois, iria abater à paulada, numa cilada em Badajoz - imita o antiabsolutista D. Pedro e declara: "Meu coração ficará no Porto."

De escassos os meios dispunha a candidatura. "Não havia empreiteiros, nem grupos económicos" a financiar a campanha. Meio século depois, Coelho dos Santos lembra uma imagem que o marcou. "Na sede da candidatura, na Praça de Carlos Alberto, gente modesta fazia bicha a deixar alguns tostões" para a campanha.

"Não fizemos nada de heróico, não afixámos placares, nem arranjámos jotas, nem assegurámos camionetas paras trazer os apoiantes. Tínhamos pouco dinheiro, dávamos a notícias e multidões saíam à rua esperar o candidato." Era um momento histórico, diz, "o País, farto da ditadura , veio por aí abaixo apoiar Delgado".

Salazar, esse, não está farto do poder. Obviamente, as eleições são uma farsa. À Ana, para contar o desfecho do acto, o avô citará o New York Times, de 10 de Maio de 1958: "O general Delgado perdeu naturalmente por uma margem de votos a favor do candidato nomeado por Oliveira Salazar, ditador e presidente do Conselho. O nome do vencedor é por acaso o do almirante Américo Tomás, mas isso não tem qualquer importância. Este não terá qualquer poder e o Dr. Salazar bem podia ter escolhido o primeiro polícia de trânsito que lhe aparecesse".

DN, 7-6-2008
 
Olá. Eu sou a neta de Manuel Coelho dos Santos, Ana Coelho dos Santos Bouça. Gostei muito do artigo, embora obviamente eu nao diga aquelas coisas. O meu avô é uma grande inspiração, nao só pelo que representa para o país, mas pelos valores que transmitiu aos filhos e netos. Espero que continuem a lembrar a história do nosso país.

Ps- O meu avô não é velho e a prova disso é que o seu espírito crítco está melhor do que nunca.
 
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